Excluídos da Reforma Tributária, óleos vegetais tentam azeitar isenções
As últimas semanas têm sido agitadas para representantes de indústrias de óleos vegetais. Na promessa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, em aprovar o texto da reforma tributária até dezembro, eles têm lutado para incluir algumas alterações no texto final que será enviado à sanção presidencial.
Do texto original às alterações feitas na Câmara dos Deputados, a redação limitou, dentro da cesta básica, uma alíquota zero para os óleos de soja, milho e babaçu, contrariando o texto original enviado pelo Executivo, que abrangia todos os óleos vegetais comestíveis.
A exclusão, segundo representantes da indústria, cria distorções de mercado e prejudica tanto os produtores quanto os consumidores.
Hilton Lima, presidente do Sindicato da Indústria da Extração de Óleos Vegetais e Animais e Produtos de Cacau e Balas da Bahia (Sincaol), acredita que a decisão pode trazer uma vantagem competitiva desproporcional para o óleo de soja, oriundo de um setor que, segundo ele, é historicamente beneficiado.
Lima pede um “tratamento igualitário”, e argumenta que óleos vegetais possuem demandas inelásticas, ou seja, não são baseados no seu preço. Com isso, o consumo é definido pelo consumidor final apenas pelo preço. Adicionando um “benefício” a dois tipos de óleos, o consumidor deixará de comprar outros óleos comestíveis que não o de milho e soja.
"Ao restringir os benefícios fiscais, estamos limitando a liberdade de escolha do consumidor e ignorando a diversidade de óleos produzidos no Brasil, muitos com benefícios nutricionais superiores, como o óleo de algodão, que apresenta melhor desempenho em frituras devido ao seu ponto de saturação mais elevado", afirmou Lima.
Lima acredita que o setor da soja é historicamente beneficiado por políticas tributárias no País. Em entrevista ao AgFeed, ele citou um estudo de 2022 do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) calculou que, a nível federal, a renúncia fiscal estimada para produção da soja no Brasil foi de R$57 bilhões.
Só no Mato Grosso, principal estado produtor da oleaginosa, a isenção do ICMS da soja representou R$ 8 bilhões anuais e a estimativa é que a desoneração nos estados alcance até R$ 25 bilhões, segundo Lima.
“O Projeto de Lei enviado pelo Executivo trazia o termo ‘óleos vegetais comestíveis’, o que abrangia todos os óleos e permitia ao consumidor ter liberdade de escolha no produto de acordo com a sua preferência e cultura regional”, acrescentou.
Um levantamento feito pela Fieb (Federação das Indústrias do Estado da Bahia), mostrou que, no estado, o litro do óleo de soja é vendido por menos da metade do preço de outros óleos vegetais.
Enquanto esse produto custa, em média R$ 6,89, o óleo de girassol custa R$ 21,30, o de canola R$ 19,80, o de milho, R$ 19,90, o de algodão R$ 16,60 e o de palma, ou de dendê, por R$ 41. Na prática, o óleo de soja continuará sendo o mais comprado no mercado, mas o de milho pode ganhar uma vantagem frente aos pares de mesmo valor.
“O óleo de milho é mais caro e o de babaçu não é utilizado no varejo. Acaba atendendo uma pequena parte da agricultura familiar e tem um uso concentrado no setor cosmético, com produções artesanais”, avaliou o presidente do Sincaol.
Outro argumento para retirar esse privilégio da soja é que, hoje, mais da metade do óleo produzido a partir da commodity vira biocombustível. Essa demanda ainda ganha força com o aumento da mistura obrigatória de biodiesel no diesel comum, que foi elevada para 14% (B14) em 2023 e tende a aumentar progressivamente até atingir 15% em 2026.
De acordo com a Abiove, a demanda por óleo de soja deve alcançar cerca de 9,7 milhões de toneladas em 2024, sendo que 6 milhões de toneladas serão direcionadas à produção de biocombustíveis.
Segundo a instituição, o Brasil esmaga 48 milhões de toneladas da oleaginosa por ano, com 20% se tornando óleo. No algodão, são 2,5 milhões de toneladas esmagadas que geram 10% de óleo comestível, numa demanda de 600 mil toneladas por ano.
De acordo com a Oil World, o consumo no Brasil de óleo de palma, milho e oliva somam, respectivamente, 600 mil toneladas, 600 mil toneladas e 100 mil toneladas anuais.
Do lado político, o baixo preço do óleo de soja foi um dos argumentos utilizados para sua inclusão na lista de alíquota zero. A decisão, por si só, já incomodou demais produtores excluídos da lista, e o desenho final, que ainda incluiu o babaçu e o milho, piorou ainda mais a situação.
No babaçu, a inclusão veio do deputado Hildo Rocha, do MDB do Maranhão. Segundo ele, era uma forma de “incentivar a economia maranhense e mitigar impactos ambientais da soja”.
Para além de abrir a discussão que esse óleo não é comumente utilizado para consumo, abriu uma porta para que um “lobby do milho” surgisse. Foi então que o relator do projeto, Reginaldo Lopes, do PT de Minas Gerais, aceitou incluir o óleo do grão na cesta básica.
Ricardo Kawabe, economista da Fieb, acredita que a retirada dos óleos da alíquota zero pode trazer aumentos generalizados nos preços tanto dos óleos quanto no de alimentos que utilizam os ingredientes na fabricação, como margarinas.
“Podemos dar o exemplo do óleo de algodão. Ele é produzido na Bahia, com ampla utilização na indústria alimentícia. Com o aumento do preço, o impacto vai ser sentido em todos os alimentos que utilizam ele como ingrediente. Isso vale para os demais óleos”, explicou Kawabe.
Somado a isso, um cenário onde o óleo de soja ganha ainda mais força pode empurrar os preços para cima, influenciando também o custo do biodiesel, de acordo com o economista.
Se o texto for aprovado como está, Lima, presidente do Sincaol, calcula que enquanto o óleo de soja, milho e babaçu contarão com zero incidência de impostos na cesta, os outros terão uma alíquota de 10,5%.
Senadores de estados produtores têm articulado emendas para reverter a exclusão, incluindo Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Zequinha Marinho (Podemos-PA). A discussão deve acontecer em breve na casa legislativa, já que o recesso parlamentar começa em menos de um mês.
Nesse período, muitas discussões ainda devem rolar. Ao mesmo tempo, Pacheco, que deixará a presidência da casa, deve fazer de tudo para passar a proposta em seu último ato à frente do Senado, melhorando sua imagem pública como um dos responsáveis por passar a reforma.
Essa possível “pressa” do senador pode prejudicar a discussão pleiteada pelos players do óleo. Lima, do Sincaol, afirmou que possuem, no momento, três emendas pleiteando a inclusão de todos os óleos no texto. "Corrigir agora é mais fácil; no futuro, será complicado rever esse erro", afirmou Lima.
“Cada sindicato em cada estado tem feito um trabalho de convencimento e esclarecimento junto aos representantes do Senado. Vemos alguns movimentos no Sul e em outros estados produtores nos apoiando”, acrescentou.
Gustavo Lustosa – AgFeed