Abastecido por diesel russo, Nordeste pode sofrer com ameaça dos EUA
Nos últimos dois anos, quando a União Europeia e os Estados Unidos proibiram a Rússia com sanções que incluíram o veto a comercialização com empresas listadas em bolsa e exclusão do SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication), uma rede global de troca de mensagens financeiras entre instituições financeiras em todo o mundo, muita gente começou a se perguntar como Putim sobreviveria se empresas como a Petrobras - que no passado foi uma importadora regular de óleo diesel russo- agora estava proibida de fechar negócios com as empresas daquele país?
O tempo passou e, de fato, a estatal Petrobras excluiu a importação de diesel russso de modo que no seu balanço de 2024, por exemplo, consta uma queda de 4,8% sobre o ano de 2023 e no primeiro trimestre deste ano outra queda de (24,1%) sobre o mesmo período.
Fornecedor regular
Como o consumo de diesel não parou de crescer no Brasil, a pergunta óbvia foi a de quem estava completando o suprimento do combustível ao Brasil, uma vez que a estatal brasileira não tem capacidade de refino para atender todo o mercado?
Não foi difícil constatar que era a própria Rússia - que mesmo sob restrições - encontrará um caminho para sobreviver às proibições de modo que ano passado já havia se consolidado como o maior fornecedor de diesel para o Brasil. O que indiretamente aliviou o balanço da Petrobras que deixou de atender um terço do mercado nacional reduzindo sua exposição em dólar.
Joe Biden
Na verdade, até o final do Governo Biden, todo mundo sabia que a Rússia passaria a abastecer o Brasil, assim com a China e a Índia com seu diesel vendido com desconto que chegava ao país por complexas operações de triangulação de propriedade sendo destinado especialmente aos mercados do Norte e Nordeste.
Assim as duas regiões passaram a receber além dos oleo russo, apenas o diesel produzido pela Refinaria Abreu e Lima e da Acelem, a antiga Refinaria Landulpho Alves (RLAM), privatizada em 2022 e rebatizada de Refinaria de Mataripe, pelo fundo árabe Mubadala.
Crescimento
O volume não parou de crescer e, no começo desse ano, a Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom) deu números e georreferenciamento ao negócio ao revelar que em 2024, a Rússia se consolidou como a principal fornecedora de óleo diesel para o Brasil e que, dos 14,5 milhões de m³ de óleo diesel importados, 65,5% (9,5 milhões de m³) são de origem russa.
Para fazer isso, a Abicom e a North Star Shipping Services Brazil, usaram dados de LineUp e do tráfego marítimo global. Com isso foi possível identificar os principais portos russos de embarque dos derivados de petróleo para o Brasil.
De onde vem
Soube-se que os embarques estavam sendo feitos pelos portos de Primorsk, Vysotsk, St. Petersburg e Ust-Luga, todos localizados na Região de São Petersburgo. Os navios seguiam pelo Golfo da Finlândia, Mar Báltico, os Estreitos Dinamarqueses, Mar do Norte e Canal da Mancha até chegar ao Oceano Atlântico.
A rota do diesel da Rússia para o Brasil, além de passar por trechos críticos como golfos e estreitos, também margeia a costa de vários países membros da OTAN. Nas estatísticas do governo brasileiro a importação de óleo diesel russo, em 2024, chegou a 9.370,3 milhões de metros cúbicos de um total de 14.319,2 milhões de metros cúbicos importados pelo Brasil.
Sem importar
Como o Brasil não decidiu que não iria parar de importar nem exportar produtos da Rússia, o número oficial incomodava a União Européia e os Estados Unidos. Mas nada foi feito.
Até que o embate do governo do novo presidente americano, Donald Trump começou a incluir essas importações na lista de possíveis contestações relacionadas ao Brasil.
O que pode vir
E alguma restrição, se efetivada, tende a provocar um problema tão grande como as ameaças de taxações de 50% como anunciadas e que devem começar em 1º de agosto.
Quem colocou o dedo na ferida dessa importação vista agora com restrições foi o senador americano Lindsey Graham fez uma ameaça sobre a possibilidade de os Estados Unidos aplicarem tarifa de 100% a países que continuem comprando petróleo da Rússia. O Brasil seria um dos potenciais alvos.
Nova ameaça
“Se vocês continuarem comprando petróleo barato da Rússia para permitir que essa guerra continue, nós vamos colocar um inferno de tarifas, esmagando a sua economia”, disse o republicano da Carolina do Sul em entrevista à Fox News nesta segunda-feira, 21.
Graham finalizou: “China, Índia e Brasil. Esses três países compram 80% do petróleo russo barato. É assim que a máquina de guerra de Putin continua funcionando”, disse. “Se isso continuar, vamos impor 100% de tarifa para esses países. Punindo-os por ajudar a Rússia”, afirmou.
Mais um problema
Pode ser só uma ameaça. Mas para quem está tentando, ao menos, abrir uma negociação sobre os demais produtos para exportação, a última coisa que o governo brasileiro deseja é um senador aproveitando a onda de taxações sobre importações de um item que não estamos vendendo, mas comprando como pode ser facilmente constatável pelas estatísticas oficiais.
Hoje, dois terços da frota movida a diesel no Norte e Nordeste é abastecida com combustível russo. Então, o problema não é o governo americano encontrar alguma forma de travar essa importação, mas como arranjar um fornecedor capaz de entregar tanto combustível e a que preço. Até porque empresas brasileiras só estão comprando diesel russo porque tem desconto sobre a paridade internacional.
Fernando Castilho – Jornal do Commercio