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O preço nos leilões: voltando no tempo


Edição de Dez 2010 / Jan 2011 - 15 dez 2010 - 11:10 - Última atualização em: 19 jan 2012 - 11:26
O leilão 19 fez o que parecia impossível: equiparou os preços do biodiesel aos do diesel fóssil, o que estimulou o debate sobre o aumento da mistura. Então veio o 20º leilão e a questão da formação do preço voltou à tona

Fábio Rodrigues, de São Paulo


O 19° Leilão de Biodiesel da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mal havia começado e a equipe do portal BiodieselBR responsável pela cobertura em tempo real do evento já precisava apelar para exclamações duplas (!!) para descrever o que estava acontecendo. A frase exata – “já temos preços a R$ 1,9998!!” – escancarava que ninguém contava ver uma oferta com deságio de 13,8% logo de cara. Aquele foi o primeiro sinal de que os preços daquele certame em particular rolariam ladeira abaixo. Só restava saber em que medida, afinal as usinas possuem total controle sobre as ofertas que oferecem. Quando o leiloeiro finalmente bateu o martelo em 3 de setembro, o preço médio havia ficado em mirrados R$ 1,74 por litro.

O resultado inesperado foi que, de uma hora para outra, o preço do biodiesel colou no do diesel mineral. Mais do que isso. Comparando os dados do Sistema de Levantamento de Preços da ANP com os resultados do leilão, podemos afirmar que, se essa fosse uma opção, sairia mais barato encher o tanque com B100 em boa parte do país. Nos Estados do Norte e no Centro-Oeste, por exemplo, enquanto as distribuidoras cobram R$ 1,85 e R$ 1,87 pelo litro do B5, os produtores de biodiesel estão vendendo seu produto a R$ 1,75 e R$ 1,73 (respectivamente). Nas outras três regiões a diferença está na casa dos centavos.


Preço final

A queda dessa barreira histórica foi temporária, pois no leilão seguinte, realizado no final do mês passado, os preços voltaram a subir. De qualquer maneira, é preciso ter em mente que a formação dos preços do biodiesel não se encerra quando o leiloeiro diz “vendido”. Só para começar, dependendo do apetite tributário dos Estados, o preço do leilão deve ser acrescido de 12% de ICMS. Isso faz o litro do biocombustível subir para R$ 1,98. Esse valor do imposto sai do bolso da Petrobras, não das usinas.

A fatura sobe de novo quando se computa o custo do transporte, que fica na conta das distribuidoras. Como os leitores ficaram sabendo na reportagem “Os passeios do biodiesel”, publicada na edição passada de BiodieselBR, as condições de logística do setor não são nenhum primor. Segundo levantamento do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom), o biodiesel roda, em média, 1.403 km entre as usinas e as bases dos distribuidores e, como os volumes dos leilões são negociados pela modalidade FOB (free on board) – na qual o comprador se responsabiliza por todas as despesas depois da retirada do produto na usina –, esse custo tende a ficar escondido dos olhos do público.

Para complicar um pouco mais, a localização das usinas nem sempre é das melhores, conforme explica o gerente de logística da GP Combustíveis, Walber Tuler. “Embora as usinas mais novas sejam mais bem localizadas, as mais antigas ficam em lugares que dificultam o frete casado, no qual eu levo um bitrem [caminhão que carrega até 45 mil litros] cheio de B5 para um cliente das proximidades e volto com ele carregado de B100”, diz.

Também não se deve minimizar a fatia que a Petrobras abocanha nos releilões. Paulo Henrique Damasceno, responsável pelo scheduling de biodiesel e etanol da Cosan Combustíveis e Lubrificantes, alerta que a diferença entre os preços do leilão e do releilão podem carcomer qualquer vantagem a favor do biodiesel. “A diferença chega a R$ 0,30 ou R$ 0,40 por litro. Isso é muito dinheiro”, aponta.

Além disso, Damasceno pontua que há uma parte do mercado que está fora do radar e que tem estrutura de preços própria. Segundo ele, os releilões não têm sido suficientes para atender a mistura obrigatória, o que tem levado os distribuidores a comprarem volumes adicionais para formação de estoques operacionais diretamente dos produtores para evitar o desabastecimento. “Todas as distribuidoras têm comprado direto dos produtores para atender a demanda”, garante.

Embora as compras diretas sejam uma ferramenta para que o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) funcione sem sobressaltos, esse canal tem restrições que não permitem seu uso simplesmente para fazer negócios. “Não é algo que a gente faça porque quer. Precisamos documentar que a Petrobras não tem como atender nossa necessidade e só aí podemos comprar”, explica. Mesmo assim, as compras diretas se tornaram importantes o bastante para que os produtores começassem a assediar o e-mail de Damasceno com ofertas que, segundo ele, são financeiramente mais compensadoras do que os negócios feitos nos releilões.

“Para a gente é vantagem comprar fora dos leilões. Primeiro, porque as usinas entregam pela modalidade CIF [na qual o fornecedor se encarrega do frete da mercadoria até o ponto de entrega], o que nos poupa de ficar correndo atrás de frete; depois, porque pagamos preços melhores”, diz o representante da Cosan. Por preços melhores, entenda-se que no mercado direto a Cosan paga R$ 2,020 por um metro cúbico de B100 entregue diretamente na porta de sua base em Betim (MG), enquanto no releilão o preço do mesmo volume chega a R$ 2,318, com o agravante de terem que ir buscá-lo. Essa diferença poderá ser ainda maior no começo de 2011, quando será entregue o biodiesel negociado com baixo deságio vendido no 20º leilão.