Porque é melhor para as distribuidoras parar de recomprar biodiesel

A ANP publicou hoje (26) um aviso lembrando que haverá um leilão complementar e que as distribuidoras não terão que comprovar estoques de biodiesel em agosto e outubro – e, muito provavelmente, em novembro e dezembro também. O texto diz isso, mas o mais importante é o que ele não diz.

Hoje está acontecendo o 5º dia de compras de biodiesel da Etapa 3 do Leilão 75. Desses cinco dias, quatro aconteceram sem que houvesse mais uma única gota de biodiesel a ser comprado.

Havia a expectativa de que ANP emitisse uma posição sobre o encerramento da Etapa 3. O mutismo da agência parece indicar que ela está sem opções. O sistema do Petronect – ou um parecer de sua procuradoria – não permitem que a Etapa 3 acabe. Com o período de entrega do leilão chegando, a decisão de quando a Etapa 3 vai acabar está na mão das distribuidoras. São elas que precisam optar por parar de recomprar biodiesel agora para comprar o que ainda resta na Etapa 5 e o que ainda poderá ser ofertado no leilão complementar.

Para tentar ajudar as distribuidoras na decisão de adiar a compra de biodiesel para outro momento, vou colocar nesse texto alguns fatos e análises do cenário que mostram que não é preciso comprar tanto biodiesel agora:

Etapa 5

As distribuidoras têm a chance de comprar mais 22,6 mil m³ na Etapa 5 do leilão. Tendo em vista o volume que está sendo recomprado, esse volume seja insuficiente para atender a demanda que ainda está em aberto.

Contudo, essa não será a última oportunidade para as distribuidoras comprarem biodiesel. Ainda será realizado um leilão complementar com entrega até outubro.

Leilão complementar

É fato que a ANP vai fazer um leilão complementar e que o preço máximo deve ser igual ao do leilão regular que motivou o complementar. Não há porque temer que o preço no complementar seja maior que o visto até agora.

A grande variável no leilão complementar é a quantidade de biodiesel que será ofertado. O histórico dos leilões complementares deste ano mostrou que as usinas não têm ofertado muito biodiesel, dessa vez, no entanto, a situação pode ser um pouco diferente.

Primeiro porque o volume de biodiesel que vai ser necessário para preencher a demanda após a conclusão do L75 não será tão grande. Depois de vendidos todos os 1.189 mil m³ de biodiesel ofertado no L75, as distribuidoras poderão fazer mistura para uma demanda de 11,89 bilhões de litros de diesel B. Se considerar que só 95% desse volume precisa ser entregue, temos 1.129 mil m³, o que já bastaria para atender uma demanda de 11,29 bilhões de litros de diesel B. Essa quantia de diesel B é 9,6% maior que os 10,3 bilhões de litros consumidos no mesmo período de 2019.

Já é difícil acreditar que o mercado de diesel vai crescer 9,6% no 5º bimestre deste ano, mas, pelo que as distribuidoras estão comprando na Etapa 3 do leilão, elas estão acreditando em uma demanda ainda maior. Mas, mesmo que o crescimento da demanda de diesel chegue a absurdos 15%, isso demandaria 1.185 mil m³ de biodiesel. É um volume que ainda caberia dentro do que foi ofertado no L75 a não ser que – mais uma vez – a entrega se limite a95%.

Então, se considerarmos que no L75 regular seja retirados 1.129 mil m³ (95% dos 1.189 mil m³ ofertados), faltariam 55 milhões de litros para completar a demanda de biodiesel que garantiria um crescimento de 15% no mercado de diesel o 5º bimestre. Então a oferta mínima no leilão complementar deverá ser de 55 mil m³ – pouco menos de 58 mil m³ considerando os 5% da margem de entregas.

Tendo em vista tudo que está acontecendo, é muito improvável que a oferta do L75C fique abaixo de 75 mil m³. As usinas, por mais que estejam gostando do preço mais alto, sabem que faltar biodiesel é um problema grande no médio e longo prazo. Uma oferta entre 75 mil m³ e 100 mil m³ não será muito difícil de acontecer. As associações mostraram que na crise de entregas do L73, que conseguem levantar entre seus associados um volume extra de biodiesel. E isso será feito para o próximo leilão complementar.

Além disso, a ANP criou nos últimos leilões complementares uma interpretação ampla sobre a capacidade de oferta de biodiesel. Assim, mesmo as usinas que venderam 100% de sua capacidade no leilão regular ainda podem oferecer biodiesel no leilão complementar.

Demanda de diesel

Outro ponto a ser considerado é que as distribuidoras podem estar errando na projeção de consumo de diesel. Um crescimento de 10% de um ano para outro é raríssimo no Brasil. Um crescimento de 15% seria totalmente inédito.

Um ponto importante levantando por um exportador de soja e milho do Brasil em uma conversa que tive essa semana, é que, por causa da pandemia as estradas tinham muito menos tráfego de carros. Isso fez, e está fazendo, com que a safra seja escoada mais rapidamente. Exemplificando, um caminhão que faria 6 viagens do Mato Grosso à Paranaguá em um mês, pode fazer 7 ou 8. Assim, antes a safra que era escoada até o final de outubro está chegando bem mais rápido aos portos.

Isso pode significar que o aumento que estamos vendo no consumo de diesel nesse momento seja reduzido em outubro, pois não haverá mais o trânsito de caminhões exportando a safra.

Está na mão das distribuidoras

Esse texto todo é para chamar a atenção das distribuidoras. Os pontos colocados aqui têm como o objetivo fazer aqueles que estão decididos a continuar recomprando biodiesel repensarem a estratégia. Como a ANP não vai punir quem comprar menos biodiesel que o necessário para fazer a mistura de B10, a decisão de continuar comprando biodiesel é muito mais arriscada financeiramente do que parar de comprar.

Mesmo que estejam pensando em estoque para o 6º bimestre, é preciso levar em consideração que dificilmente a mistura será maior que B10 até dezembro. Isso pode fazer com que o preço =no L76 não seja tão alto como se especula.

Como resta só as distribuidoras tomarem uma ação para que a Etapa 3 acabe, vai aqui um apelo: pelo bem dos consumidores e seu próprio parem de recomprar biodiesel!

Miguel Angelo Vedana – BiodieselBR.com