Risco de faltar diesel no Brasil é baixo, dizem especialistas
As sanções impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a duas petroleiras russas tendem a aumentar as dificuldades e os custos de importação de diesel no Brasil, mas o risco de desabastecimento é pequeno, avaliam agentes e especialistas ouvidos pelo Valor.
O Brasil importa entre 25% e 30% do diesel russo para suprir a demanda interna, mas as compras têm sido menores nos últimos meses. As produtoras russas de petróleo que foram alvo das sanções, Rosneft e Lukoil, têm produção superior a 5 milhões de barris por dia. O presidente russo, Vladimir Putin, disse que não cederá à pressão dos EUA ou de qualquer outro país.
O diesel russo é vendido no Brasil desde 2023. O produto tem sido comercializado no mercado internacional a preços abaixo das cotações oficiais por causa de outras sanções que foram impostas pela União Europeia, e mesmo pelos EUA, ao produto desde o início da guerra entre Rússia e Ucrânia, em 2022. Para atrair clientes, os russos passaram a oferecer descontos.
Depois de intervir no conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, Trump pode estar sinalizando descontentamento com os rumos da guerra entre Rússia e Ucrânia, na avaliação do consultor Marcelo de Assis, sócio da MA2 Energy. Porém, avalia o especialista, o reflexo dessas sanções no Brasil tende a ser pequeno.
Assis ressaltou que existem riscos de que surjam mais intermediários entre Rússia e compradores brasileiros, para escapar das sanções. Isso porque, como o derivado não tem número de série, é fácil misturar o diesel russo com o de outros produtores e prosseguir com a comercialização. O consultor não vê espaço para desabastecimento no Brasil, no momento, e avalia que há risco de sanções bancárias pelos EUA.
E ainda existem meios de colocar esse produto no mercado contornando as sanções, afirma Assis. “A Rússia continua a mobilizar a chamada ‘frota fantasma’ de petroleiros para fazer o transporte de petróleo e derivados. É mais difícil, encarece as operações, devido aos transbordos, com mais intermediários, mas é um comércio que não vai parar por causa dessas sanções.”
Rivaldo Moreira Neto, diretor sênior da A&M Infra, disse que a Rússia é um agente muito relevante no mercado brasileiro, já que é responsável por mais da metade do diesel importado pelo país. Frente a isso, a renovação das tensões entre Rússia e EUA, aumenta as incertezas no Brasil e pode se transformar em mais uma peça no tabuleiro de negociações entre Brasil e Estados Unidos.
“O Brasil importa em torno de 20% do diesel [que consome]. Desse total, a Rússia corresponde a 65% das importações, então certamente qualquer sanção ou situação que envolva exportações de óleo derivados da Rússia pode impactar o Brasil. Isso gera uma incerteza a mais em um momento de risco, e de certa forma de sensibilidade, na relação entre Brasil e Estados Unidos”, disse Moreira.
Dados da Argus Media, com base em informações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), indicam que a Rússia respondeu por 55% do volume de diesel importado pelo Brasil no acumulado do ano até setembro, enquanto Estados Unidos foram a origem de 29% do derivado que entrou no país. Da Índia e do Golfo Pérsico partiram 14% do diesel importado. O restante veio de outras localidades.
De acordo com Marcos Mortari, especialista em combustíveis da Argus, o Brasil deve acumular uma importação de 1,58 milhão de metros cúbicos de diesel em outubro, segundo ferramentas de monitoramento de comércio exterior. Deste total, cerca de 35,6% têm origem nos EUA, 35,5% na Índia, 18,4% na Rússia e 4,4% nos Emirados Árabes.
Para novembro, disse o especialista, hoje são estimados cerca de 656.000 metros cúbicos de diesel importado. Os EUA respondem por 40,3% dos embarques esperados, Rússia por 33,6%, Índia por 19,1% e Emirados Árabes, 7%.
“Esses números mudam com certa frequência”, ponderou Mortari. Fontes do mercado apontam que, desde agosto, a Rússia foi ultrapassada pelos EUA como principal supridor.
Com a nova imposição das sanções de Trump sobre as petroleiras russas, a cotação do petróleo disparou ontem no mercado internacional e acendeu um alerta no Brasil, devido à parcela importada. No início do pregão da quinta-feira (23), o mercado abriu com um salto de 5%. Os contratos futuros do barril do tipo Brent com vencimento em dezembro fecharam cotados a US$ 65,99, o que correspondeu a avanço de 5,43%.
Fábio Couto e Robson Rodrigues – Valor Econômico