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Biocombustíveis: os desafios da expansão


Valor Econômico - 30 mai 2025 - 09:10

O novo mandato conferido ao biodiesel pela legislação aprovada no fim de 2024 prevê a adoção do B20 (20% de biodiesel e 80% de diesel derivado do petróleo) até 2030 e abre perspectiva para adoção do B25 nos anos seguintes, o que, na opinião de André Nassar, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), deverá exigir a construção de 47 novas esmagadoras de soja e 33 usinas de biodiesel, num investimento estimado em R$ 53 bilhões a valores atuais.

Pelos cálculos de Leonardo Rossetti, analista de inteligência de mercado de biodiesel da StoneX, consideradas as obras já concluídas, mas ainda em processo de autorização pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), como também os projetos de ampliação de unidades já existentes e a instalação de novas plantas, o setor de biodiesel poderá adicionar mais 4,4 bilhões de litros à capacidade atual de 14,8 bilhões de litros por ano até dezembro de 2026 – um crescimento 30%. O congelamento da mistura do biodiesel em 14% para este ano, no entanto, levou a uma revisão das projeções, de 10,2 bilhões para 9,6 bilhões de litros. O avanço em relação ao ano passado, anteriormente estimado em quase 12,6%, foi revisado para 6,2%.

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Entre os desafios que a indústria precisa enfrentar para avançar com segurança estão as fraudes no setor e a diferença de preços entre biodiesel e diesel, observa Nassar – o litro do biodiesel, conforme a ANP, chegou a subir 47,4% entre março e novembro do ano passado, mas caiu 12,2% na comparação entre a terceira semana de novembro e igual período de março deste ano. O crime organizado vem aumentando – além da atuação na área de distribuição, as fraudes acontecem agora também na produção de biocombustíveis, explicam Emerson Kapaz e Carlo Faccio, respectivamente presidente e diretor do Instituto Combustível Legal (ICL). Segundo eles, além de insegurança, as fraudes geram desvios de quase R$ 61,5 bilhões ao ano, considerando todo o setor de combustíveis.

No caso do biodiesel, diz Faccio, as fraudes ganharam evidência a partir de outubro do ano passado, quando a diferença entre os preços do diesel e do biodiesel chegou perto de R$ 3,00 por litro na distribuição, o que estimulou a concorrência ilegal. Cada litro fraudado, explica, gera impactos sobre sete litros no mercado formal, numa relação exponencial.

Com participação do ICL e representantes de associações de produtores, distribuidores, importadores e revendas, além de frentes parlamentares de defesa dos biocombustíveis, a coalizão organizada para combater o mercado irregular vem atuando em várias frentes, de acordo com Kapaz, com o objetivo de reforçar a fiscalização da ANP, incluindo a possibilidade de doação à agência de espectrofotômetros modelo FTIR para identificar a campo o percentual de biodiesel adicionado ao diesel, aprovar a legislação que pune com maior rigor devedores contumazes e trabalhar para a adoção da cobrança monofásica do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no setor de combustíveis.

Apesar dos desafios, as empresas do setor apostam nos biocombustíveis. Criada a partir da compra pela bp de uma participação de 50% na Bunge na antiga BP Bunge Bioenergia, em junho do ano passado, a bp bioenergy já nasceu com capacidade para 32 milhões de toneladas de cana por safra e potencial para o equivalente a 51 mil barris diários de etanol em suas 11 unidades instaladas em cinco Estados, informa Andres Guevara de La Veja, CEO da nova empresa.

Globalmente, a bp revisou sua estratégia, colocando “o Brasil e a bioenergia numa posição-chave”. Além do etanol, a bp bioenergy tem como objetivo avançar no setor de biogás e em direção a novos mercados e tecnologias, a exemplo da produção de combustível sustentável de aviação (SAF). A empresa tem focado seus investimentos no país no aumento da produtividade, combinando agricultura regenerativa com adoção de insumos biológicos e reaproveitamento de coprodutos do processo industrial, e ainda na digitalização de processos e de operações.

O Grupo Potencial investe em torno de R$ 3 bilhões para dobrar sua capacidade de produção de biodiesel para 1,8 bilhão de litros até o fim de 2026, conta o vice-presidente da empresa, Carlos Eduardo Hammerschmidt. O projeto, já com 40% das obras concluídas, contempla uma terceira unidade de biodiesel e a primeira planta de óleo de soja do grupo, com capacidade para 3,5 mil toneladas por dia, além da expansão da produção de glicerina refinada de 45 mil para 100 mil toneladas por ano e a instalação de um sistema de dutos que deverá incrementar a logística do complexo.

Conforme Hammerschmidt, o primeiro duto irá transportar entre 50 milhões e 100 milhões de litros de biocombustível por mês, desde o complexo industrial instalado no município de Lapa (PR) até o pool de distribuição em Araucária (PR), onde a Petrobras opera a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar). Um segundo duto trará gás do complexo petroquímico para alimentar as caldeiras da Potencial no município de Lapa, numa parceria com a Companhia Paranaense de Gás (Compagas).

No grupo São Martinho, as queimadas ocorridas no interior paulista no ano passado reduziram em quase 5,5% o volume de cana destinado à moagem, para algo em torno de 21,8 milhões de toneladas, segundo Felipe Vicchiato, diretor financeiro e de relações com investidores. “Isso influenciou diretamente a destinação da matéria-prima e resultou em aumento de 6,5% na produção de etanol de cana, superando ligeiramente a marca de 1 bilhão de litros.” No total, incluindo o biocombustível obtido a partir de milho, o grupo produziu quase 1,2 bilhão de litros, num avanço de 8,9%.

Em agosto próximo, adianta Vicchiato, a São Martinho espera colocar em funcionamento sua primeira planta de biometano, que está em fase final de implantação, anexa à unidade de Santa Cruz, em Américo Brasiliense (SP), com capacidade para 15,6 milhões de metros cúbicos normais (Nm³), num investimento de R$ 250 milhões.

Na indústria do etanol, segundo Luciano Rodrigues, diretor de inteligência setorial da União da Indústria de Cana de Açúcar e Bioenergia (Unica), trabalhava-se com a perspectiva de acrescentar 14,7 milhões de litros por dia à sua capacidade atual – um avanço de 10% em grandes números, alavancado especialmente pelo etanol de milho. Neste ano, acrescenta Rafael Borges, analista de inteligência de mercado de etanol da StoneX, a oferta total do carburante no Centro-Sul do país tende a recuar para 34,5 bilhões de litros – foram 35 bilhões de litros em 2024, com queda de 7,7% no etanol de cana, parcialmente amenizada pela alta de 18,1% no etanol de milho. A perspectiva agora é de elevação da mistura dos atuais 27% para 30% a partir de junho, segundo Borges, gerando mais demanda pelo anidro.

Lauro Veiga Filho – Valor Econômico