Europeus apostam em biocombustível e energia renovável
A agricultura européia tem uma nova ambição: estimular a oferta de culturas voltadas à produção de biocombustíveis e matérias-primas renováveis. É o "ouro verde", segundo afirma o presidente da Comissão Agrícola do Parlamento Europeu, o deputado francês Joseph Daul.
Na prática, a estratégia significa produzir trigo, açúcar, sorgo, milho, batata e outros cultivos voltados a etanol e biodiesel, além de papel, polímeros biodegradáveis, adesivos, colas, agroquímicos, detergentes e tintas. Atualmente, a União Européia destina 3,6 milhões de toneladas de sua produção anual de cereais para matérias-primas renováveis, e prevê aumentar o volume para 5,5 milhões nos próximos anos.
Mas o deputado inglês Neil Parish, do partido conservador, que preparou um relatório no Parlamento Europeu sobre a questão, defende subsídios para os agricultores ocuparem uma área três vezes maior até 2011 "para atender as expectativas ambientais e energéticas" do velho continente.
"É um mercado novo importante para o agricultor europeu, com impacto na renda", afirma Parish. Na mesma linha, a federação francesa de produtores agrícolas (FNSEA) concentrou seu 60º congresso nessa questão. "A produção de alimentos é nossa primeira vocação, mas devemos estar alertas para novos mercados a conquistar", destacou Jean-Michel Lemétayer, presidente dos agricultores franceses.
Políticos e líderes agrícolas constatam que a pressão vai aumentar sobre a agricultura européia. Seus agricultores não conseguem concorrer com produtores do Brasil e de outros grandes exportadores agrícolas, que dispõem de menores custos de produção. Assim, mais gente tende a sair do setor e mais terras deverão ficar gradualmente mais disponíveis para fins não alimentares.
A reforma da Política Agrícola Comum (PAC) da União Européia de 2003 criou condições para ampliar o desenvolvimento do chamado "ouro verde". Até então, os produtores, se quisessem subsídios, ficavam proibidos de produzir alimentos em terra retirada da produção ("set-aside"), para evitar o excesso de oferta.
Com a reforma da política, agricultores que antes recebiam subsídios somente sob o regime de "set-aside" agora podem cultivar as terras retiradas da produção sem perder a ajuda de Bruxelas. Além disso, uma subvenção especial de ? 45 por hectare passou a ser paga para cultivos destinados à energia, desde que a área não supere 1,5 milhão de hectares no continente.
Os 25 Estados membros da UE também podem cobrir 50% dos custos totais com culturas para produção de biomassa nas terras retiradas da produção.
O deputado Parish calcula que a superfície do território da UE destinada a culturas não alimentares, submetida ao "set-aside", atingirá 9,4 milhões de hectares em 2011. Só que para alcançar as metas estabelecidas pela própria UE para energias renováveis e biocombustiveis, o Parlamento Europeu estima que será necessário destinar 13,1 milhões de hectares a essas culturas - um excedente de 3,5 milhões de hectares.
As metas fixadas por Bruxelas prevêem que as fontes renováveis representem 12% do consumo de energia da UE em 2010. Isso incluindo a mistura de 5,75% de biocombustíveis no diesel voltado ao setor de transporte.
Uma das maiores possibilidades oferecidas pela estratégia deflagrada é a produção de combustíveis a partir de batata, cereais, beterraba e canola. A produção de beterraba voltada a bioetanol também seguirá fora de cotas (limites à produção).
Comparado com o petróleo e o diesel, o bioetanol e o biodiesel produzidos na Europa são mais caros, mesmo a preços atuais. A Comissão Européia fez um estudo no qual estima que o bioetanol produzido nas condições atuais no velho continente só se tornaria competitivo com os preços do barril de petróleo a US$ 110 e do biodiesel a US$ 70.
Para reduzir os custos de produção, a saída será conceder bilhões de dólares em subsídios. A Comissão Européia indica que vale a pena, apoiando-se no exemplo do Brasil, maior país produtor e consumidor de etanol do mundo.
Para Bruxelas, os subsídios aos produtores e consumidores brasileiros liberados por meio do Proalcool trouxeram "amplos benefícios". Calcula que os investimentos agrícolas e industriais no Brasil para produção e transporte de etanol foram de US$ 5 bilhões no período entre 1975 e 1989, enquanto a poupança com importações teria chegado a US$ 52 bilhões entre 1975 e 2002.
"Por mais etanol que consigamos produzir, a demanda será maior e precisamos do produto brasileiro", afirma o deputado Joseph Daul. "O Brasil também pode se beneficiar da expansão do 'ouro verde' na Europa".