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Bônus para a agricultura familiar: equilibrio delicado


Edição de Dez 2010 / Jan 2011 - 15 dez 2010 - 10:53 - Última atualização em: 19 jan 2012 - 11:16
Equilíbrio delicado
O coordenador do programa de biodiesel pelo MDA, Arnoldo de Campos, acha perfeitamente natural que os empresários reclamem. “Empresário que não reclama não é empresário. E se não fosse o bônus seria outra coisa”, minimiza. Ainda segundo ele, o fato da normativa colocar as entidades representativas dos agricultores numa posição central não foi nenhum acidente. Foi uma forma que o MDA encontrou de nivelar um jogo que perigava pender demais para um dos lados. “Se não fosse pelo endosso, as federações não seriam consultadas e aí a negociação seria feita em bases individuais em que os empresários fariam sentir seu poder econômico. É o que acontece na maioria das cadeias produtivas agrícolas”, comenta o representante do ministério.

Com a bola quicando no seu lado do campo, as federações e confederações de trabalhadores rurais não demoraram para se articular com o objetivo de conseguir mais vantagens para o seu lado. De acordo com o secretário de política agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Antoninho Rovaris, as federações de agricultores passaram a se reunir em Brasília para acertar indicativos dos pontos mais importantes dos contratos de biodiesel – incluindo preços, assistência técnica e pagamento de bônus –, sobre os quais cada federação e sindicato poderá fazer suas próprias negociações em âmbito estadual.

Atualmente, a orientação da Contag é que seja cobrado um bônus de R$ 1,20 nos Estados do Centro-Oeste, enquanto no Sul se paga apenas R$ 1. Rovaris, contudo, adianta que os valores do Sul estão em negociação e que existe uma tendência de alta.

O clima ficou bem parecido com o das grandes negociações sindicais. “É uma espécie de negociação coletiva como a que acontece entre os sindicados de qualquer categoria mais bem organizada e seus patrões, só que aqui é entre vendedores e compradores. Essa é uma cultura de negociação que existe em outras categorias, mas que ainda precisa ser desenvolvida no mercado agrícola”, compara Campos. Se considerarmos que o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) foi formatado com um olho posto na geração de renda para a agricultura familiar, não dá para dizer que seja inesperado o MDA ter colocado uma vantagem do lado dos agricultores.

Outro fator que contribui para explicar a universalidade do sistema de bônus é a dependência do setor em relação ao óleo de soja. Segundo dados levantados em um estudo divulgado em outubro passado pela FGV Projetos, 78% do biodiesel brasileiro é feito a partir de óleo de soja. “Soja é dinheiro no bolso. É um produto que não tem problema de armazenamento e que você consegue vender quando quiser”, sintetiza Nestor Bonfanti, primeiro-tesoureiro da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag/RS). Para ele, o pagamento do bônus é um estímulo para que os agricultores aceitem comprometer suas lavouras de antemão. “Se o agricultor não tivesse nenhum benefício ele não fecharia um contrato antecipado; senão ele vai comercializar quando e como ele preferir”, diz. O valor, embora modesto, continua Bonfanti, faz bastante diferença para a renda de uma família de pequenos agricultores.

É mais ou menos essa a justificativa que a Contag apresenta para a prática. “O bônus é negociado para criar a fidelização do agricultor familiar para com determinada indústria de biodiesel”, explica Rovaris. Sem o bônus, os agricultores poderiam se sentir tentados a desfazer um contrato de compra e venda negociado com meses de antecedência em troca de uns caraminguás a mais oferecidos de última hora por alguma outra empresa.

Um bom exemplo de como é possível chegar a um bom balanço entre negócios e social parece estar vindo da relação entre a Biopar e o Sistema de Cooperativas da Agricultura Familiar Integrada (Coopafi), organização que reúne cerca de 4 mil famílias do sudoeste do Paraná. Foram precisos três anos de conversas para construir uma relação de confiança até que o contrato fosse efetivamente assinado para a safra 2009/2010. Segundo conta o diretor-presidente da cooperativa, José Carlos Farias, a meta desse primeiro contrato era de 400 mil sacas de soja, das quais foram efetivadas 360 mil, pagando um bônus de R$ 1 por saca.

Considerando que o contrato está prestes a ser ampliado para 670 mil sacas na safra 2010/2011, o negócio deve ter sido considerado benéfico para ambas as partes. “O bônus tem sido uma referência muito forte para as famílias que entregaram soja no ano passado e tem mesmo feito diferença na vida deles”, comemora Farias, acrescentando que, embora “esse [o bônus] seja um benefício muito prático e fácil de entender para os agricultores”, é a assistência técnica que os produtores rurais estão recebendo das usinas que, no fim das contas, vai puxar para cima a qualidade de vida deles. “Há uma junção dessas duas coisas, uma somatória”, resume.