O ano da retomada do biodiesel
Depois de dois anos bastante sofridos por conta das decisões do governo Bolsonaro que mantiveram a mistura obrigatória reduzida – o que custou quase 2,4 milhões de m³ em produção perdida apenas em 2022 –; o ano começou com os fabricantes de biodiesel moderadamente otimistas. Especialmente depois de uma campanha na qual o candidato Lula fez diversos acenos para a pauta ambientalista.
A volta à normalidade, contudo, demorou mais do que o setor gostaria.
O fato é que governo Lula 3 não demostrou urgência em reverter o último dos cortes de mistura antes que seu prazo se esgotasse em abril. Foi só em meados de março que o CNPE aprovou o retorno imediato ao B12 e um novo cronograma de ampliações que previa a chegada do B15 em abril de 2026.
Além da aparente falta de ambição por parte do governo. A indústria teve que enfrentar a resistência de setores que queriam manter tudo como estava. A alegação era que o biodiesel estaria por trás de uma série de vícios de qualidade do óleo diesel, isso mesmo com a ANP às vésperas de lançar uma nova especificação e um programa de monitoramento da qualidade específico para o biodiesel.
Essa foi só a primeira de uma série de polêmicas públicas nas quais o setor esteve envolvido ao longo do ano. Não foi só a qualidade do biodiesel que voltou a ser uma questão conflagrada. O RenovaBio também passou a ser questionado depois que 50 distribuidoras falharam em cumprir as metas de descarbonização para 2022. Mesmo depois de terem seu prazo prolongado para setembro deste ano.
Entre as distribuidoras sobram reclamações de que o programa impõe custos elevados e leva a distorções no mercado. O governo parece ter dado, ao menos em parte, razão aos distribuidores e propôs uma redução significativa nas metas de aquisição de CBios para os próximos 10 anos.
Defensores
Ainda assim, o setor viu motivos para manter certo otimismo. Vira e mexe alguma das figuras do primeiro escalão do governo acenava. Do vice-presidente, Geraldo Alckmin, ao presidente Lula em pessoa. O afago mais recente veio de Alexandre Silveira, ministro do MME, que chegou a sinalizar com uma possível adoção do B25.
Apesar da simpatia retórica, contudo, biodiesel acabou preterido pelo governo em várias oportunidades. O biocombustível ficou para depois na reunião do CNPE ocorrida em setembro e não entrou no projeto de lei que cria o Programa Combustível do Futuro.
Essa aparente inoperância do Planalto acabou permitindo que uma medida aprovada no governo passado que abria 20% do mercado brasileiro ao biodiesel importado fosse implementada pela ANP. Isso podia representar um ‘presente’ de US$ 1,5 bilhão para a indústria da Argentina.
Nos acréscimos
O governo federal só foi se mover para resolver a parada no último momento possível. Numa reunião do CNPE convocada para a última semanatil do ano, foi aprovada a antecipação do B14 para março do próximo ano e a suspensão das importações.
Sem querer ficar à mercê da agenda Planalto, a Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio) tem se articulado para emplacar um PL que estabelece um plano decenal para o biodiesel.
Em outro canto da Esplanada dos Ministérios, o governo se movimentou para que uma parte maior dos recursos do Selo Biocombustível Social chegasse aos agricultores do Norte, Nordeste e Semiárido. Uma portaria publicada conjunta do MDA e do MME vai exigir que 20% do dinheiro movimentado pelas usinas para comprar produtos da agricultura familiar vá para essas regiões.
Consolidação
A configuração interna da indústria também mudou bastante em 2023.
Líder do mercado nacional nos últimos anos, a BSBios passou por um processo de rebranding e, desde abril, se chama Be8. Enquanto isso, Granol – que durante muitos anos liderou a produção de biodiesel no Brasil – vendeu todos os seus ativos de biodiesel para a Cargill, que passou a ter o maior parque produtivo do país.
E a retomada de um horizonte de aumentos da mistura – mesmo mais lento do que o setor gostaria – injetou ânimo nas usinas que tiraram investimentos da gaveta. Caso da Potencial, da Be8 e da Fuga.
Também tivemos a entrada de alguns novatos no mercado como a Amaggi e da Lar Cooperativa.
Novos ventos
A mudança nos ventos políticos também fez com que Petrobras desse um verdadeiro cavalo-de-pau. A estatal não só mudou sua política de preços colocando de lado a controversa paridade de importação (PPI) como também desistiu da venda de boa parte de seu parque de refino.
Nessa mesma onda, a petroleira nacional resolveu continuar no mercado de biodiesel. Ela até dobrou a aposta em seus projetos de biorrefino com invewstimenros de US$ 1,5 bilhão previstos até 2028.
E há mais um concorrente mirando esse novo segmento. A Acelen anunciou que vai investir R$ 12 bilhões para instalar uma biorrefinaria na Bahia e fomentar produção de macaúba.
Há bons motivos para a animação nesse segmento. Visto como uma promessa para o futuro, o mercado de combustível sustentável de aviação (SAF) está começando a sair do papel. Em abril, a União Europeia aprovou um mandato que prevê que os países do bloco usem 6% de combustíveis de aviação renováveis até o final da década
Seja com os biocombustíveis novo ou com os biocombustíveis convencionais, o Brasil pode ser uma das estrelas nesse mercado. Tanto que, o governo brasileiro se uniu a outros 8 países para lançar a Aliança Global para os Biocombustíveis.
Mais um sinal promissor para o futuro dos biocombustíveis foi dado pelo texto final da COP28 que manteve a ideia de que o mundo precisa fazer uma ‘transição para longe dos combustíveis fósseis’. Mesmo que com uma redação mais aguada do que nos rascunhos iniciais, ainda assim, é uma proposta inédita na história das COPs e tende a beneficiar medidas de enfrentamento às mudanças climáticas.
A contribuição que o setor de biodiesel pode desempenhar nessa luta pelo futuro do planeta e o bem-estar da humanidade continuará pautando o jornalismo desenvolvido por BiodieselBR.com. No próximo ano seguiremos em nossa missão gerar noticiário, análises e produtos que permitam aos atores da cadeia operarem com mais segurança.
Nos próximos dias o portal BiodieselBR.com entrará em seu recesso de final de ano retomando a cobertura do setor no próximo dia 08 de janeiro. Boas festas e um bom 2024 para todos.
Fábio Rodrigues – BiodieselBR.com