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A hora é de pragmatismo, conclama Erasmo Battistella


Amanhã - 14 ago 2019 - 11:32

Nenhum empreendedor brasileiro soube tirar tanto proveito da política brasileira de produção de biodiesel, inaugurada em 2004, quanto Erasmo Carlos Battistella. Apostou pesado na decisão do governo de passar a adicionar biodiesel ao diesel comum a partir de 2008. A aposta deu resultado e ele se tornou, hoje, o maior produtor brasileiro de biodiesel. Agora, ruma ao Paraguai para instalar uma planta de biocombustíveis avançados. Na entrevista originalmente publicada pelo portal Amanhã e resumida por BiodieselBR.com, Battistella conta como vê o Brasil em uma fase de mudança de ciclo econômico.

Como os investidores externos estão olhando para o mercado brasileiro de energias renováveis?

O Brasil é muito respeitado na parte de energias renováveis: etanol, biodiesel, energia eólica, hídrica, agora começando a ganhar espaço com a energia solar. Ou seja, nosso trunfo não é uma fonte de energia somente e não envolve só combustíveis líquidos, mas também energia elétrica. Isso é muito importante para se criar essa massa de investimentos em energias renováveis, que se consolida como uma área estratégica para o Brasil. Mas há algumas definições que ainda precisam ocorrer e que impactarão bastante o setor. O Brasil terá uma política clara de como vai tratar os combustíveis? Então, o mercado lá fora espera que o Brasil adote para sempre uma política de mercado nos preços de energia e combustíveis. Se isso acontecer, vai aumentar ainda mais a atratividade de investimento nas energias renováveis. Esse movimento, esse novo olhar do governo para o setor de energia e para a questão da precificação, estão sendo observados e são fundamentais para que nosso setor se torne atrativo para receber mais investimentos.

O ainda estão em desacordo com o que o mercado espera na cadeia de energias renováveis? Que ajustes são necessários?

Acredito que os ajustes são estes que o próprio governo está colocando. Por exemplo, no segmento de combustíveis, reorganização tributária e precificação de acordo com o mercado, além de uma abertura para a participação de outros agentes na cadeia produtiva, de modo a realmente abrir o mercado para que a gente tenha livre concorrência e não haja mais monopólios em energia. Se isso acontecer, nós teremos mais capital do exterior investindo em energia. É uma visão clara que vem de fundos, de bancos de investimentos e de empresários que querem investir no Brasil. Quanto mais o mercado é a regra, melhor para nós, porque estaremos aumentando a atratividade de investimento. Quando falo de atratividade de investimento, não falo só do externo, mas também do capital interno. Muito empresário no Brasil tem projetos para fazer investimentos e estão aguardando para ver como fica essa política. E certamente vão tirar projetos da gaveta para aumentar o nível de investimento. Portanto, não é só dinheiro do exterior, não. Tem muito dinheiro dentro do Brasil esperando as regras ficarem claras.

A expectativa de todos esses investidores é de que estruturas monopolistas, inclusive no petróleo, sejam claramente abertas à concorrência?

Sim. E isso é em todas as áreas do segmento de energia, seja em combustíveis, energia elétrica... O monopólio sempre afasta investimento, inibe competitividade. Para os consumidores, a concorrência é saudável desde que as regras estejam claras e que as agências reguladoras funcionem de forma independente. Quanto mais técnicas forem as agências reguladoras, melhor. O nome já diz: é uma agência que regula. E quem regula são os técnicos. Eles é quem têm de tomar conta das áreas. Isso serve para todos os segmentos, não só para a área de energia.

Com as mobilizações pelo mundo cobrando providências contra as mudanças climáticas, qual deve ser a postura do Brasil diante das metas de redução de emissões estipuladas no Acordo de Paris?

O Brasil vem bem no cumprimento do Acordo de Paris. Para ser justo, não é uma questão de agora. Se voltarmos aos governos anteriores, todos se preocuparam em aderir e se manter em linha com o acordo internacional do clima. Tivemos a construção de políticas públicas de médio e longo prazos que são fundamentais. Vimos o nascimento do programa de biodiesel, o crescimento do programa de etanol, o início e o crescimento da energia eólica e, agora, também da energia solar. No último governo, foi criado um programa chamado RenovaBio, que é um grande guarda-chuva para políticas públicas que vão fomentar biocombustível e outras formas de energia. Tudo isso faz com que o Brasil possa atingir seus compromissos. O RenovaBio deixa claro que o Brasil precisa diminuir as emissões em 10,1% até 2030 e manter as emissões controladas mesmo com crescimento econômico. Sem fazer uso de biocombustíveis e energias renováveis, o Brasil não teria como atingir essa meta. Mas vejo que o país está muito em linha com o acordo, está nota 10. Se o Brasil cumprir o que está na lei, vamos chegar em 2030 com um grande reconhecimento a nível global e recebendo grandes investimentos. Basta cumprir o que está na lei.

Entre a necessidade de acelerar o crescimento e reduzir as emissões de CO2, confrontam-se dois polos de pensamento. Como você vê este debate entre ambientalistas e desenvolvimentistas?

Eu não vejo esse debate como o tema mais importante nesse momento no Brasil. O setor produtivo amadureceu. No começo do governo atual, havia uma discussão sobre unir o Ministério da Agricultura e o Ministério do Meio Ambiente e muitas áreas do setor produtivo, do agronegócio, posicionaram-se contra porque entendem que precisamos crescer e preservar o meio ambiente. Então, essa é a posição clara de muitas áreas de produção. Na última década, nenhum empresário com quem eu tenha conversado quer fazer o seu negócio de qualquer forma sem respeitar o meio ambiente, muito pelo contrário. A grande maioria das empresas, dos empresários e dos produtores rurais, quer preservar o meio ambiente e ganhar dinheiro com a preservação ambiental. Se estamos preservando mais o meio ambiente no Brasil, em algum lugar do mundo quem não está preservando tem de pagar isso para a gente. O setor produtivo do Brasil está preocupado em produzir de forma ambientalmente correta. Muitas vezes as informações é que são distorcidas. Tem gente que não produz um pé de soja, que não gera um emprego e quer sair falando asneira, dizendo que o Brasil não cuida do meio ambiente. Quem está no dia a dia gerando emprego está comprometido em preservação ambiental. Não queremos fazer a coisa de qualquer forma. Nos próximos 10, 15 e 20 anos, o Brasil tem de ter um consumo mais consciente e sustentável. O Brasil é um dos países que mais tem oportunidade de ganhar dinheiro com isso. É preciso colocar no centro da discussão como é que nós agregaremos valor à preservação ambiental, à produção correta sob o ponto de vista ambiental. Como geramos valor para o Brasil preservando florestas e usando a quantidade de biocombustível que usamos. Acho que a gente tem que deixar um pouco de lado a ideologia nesse momento e realmente focar para que o Brasil esteja na vanguarda dessa mudança que está ocorrendo no mundo.

A sua holding está fazendo um investimento significativo, de US$ 800 milhões, no Paraguai. Está se desenhando um processo de investimentos industriais brasileiros no Paraguai? É uma tendência?

Sempre é bom esclarecer que o investimento no Paraguai não é da BSBios. Não podemos confundir. A BSBios tem dois acionistas: a Petrobras e a minha holding. No Paraguai, o projeto é da minha holding. Sobre o investimento: o Paraguai tem atraído investimentos tanto de brasileiros quanto de empresários mundo afora. Nos últimos anos, tem aumentado o número de brasileiros investindo lá. Por que estão investindo no Paraguai? São questões pragmáticas. Número 1: proximidade geográfica. Quem mora no Rio Grande do Sul ou em São Paulo leva menos de duas horas de voo. Número 2: o Paraguai tem uma economia estável e que vem crescendo sem parar nos últimos 15 anos. Número três: o custo tributário do Paraguai é o mais competitivo do mundo. Número quatro: o custo de energia elétrica corresponde a um terço do custo da energia elétrica no Brasil. Número cinco: o custo de mão de obra é 25% do que custa no Brasil – o salário é igual, mas o custo adicional ao salário é menor. Essa competitividade tem atraído empresários de diversas áreas. Eu fui convidado para fazer um estudo sobre investir no Paraguai. Fizemos o estudo e eu percebi que havia oportunidade. Começamos em fevereiro a segunda fase de um grande projeto no Paraguai para a produção de biocombustíveis, justamente por causa desses cinco diferenciais que eu enumerei. E existe mais um atrativo que é importante: o Paraguai tem produção de matéria-prima e é um campo fértil para o projeto Ômega Green, que vai produzir um biocombustível diferente, os chamados biocombustíveis avançados [ele se refere aqui ao HVO, óleo vegetal hidrotratado, e ao SPK, óleo de querosene parafínico sintético].

O programa de desinvestimento da Petrobras deve levar a companhia a se desfazer de sua participação na BSBios. Como este processo deve evoluir?

Como a Petrobras tem ações em bolsa e uma participação governamental muito importante, ela tem regras de desinvestimento que seguem as normas de instituições públicas de controle. Esse processo começou no ano passado e não foi concluído, porque veio o período eleitoral, mudança de governo, substituição da diretoria da Petrobras... Mas agora, quando toda a governança da Petrobras já está com nova diretoria, a tendência é que esse processo de desinvestimento possa continuar nos próximos meses.

Qual sua posição sobre a venda?

Eu deixei clara a minha posição quanto a esse processo já no ano passado e sigo com a mesma disposição: tenho interesse em recomprar a participação da Petrobras. Eu acredito na BSBios e acredito nesse mercado. Obviamente pode ser sozinho ou com parceiro, e eu tenho a minha estratégia como empresário, mas tudo só vai acontecer quando a Petrobras retomar esse processo. Quem define o tempo, o momento e a forma é a Petrobras. A gente tem de respeitar as políticas internas deles.

Em que estágio se encontra a indústria brasileira do ponto de vista da inovação?

Acredito que o país está perdendo grandes oportunidades no campo da inovação porque não temos investimentos com este foco. Temos, naturalmente, empresas que se destacam como a Embraer e, também, o trabalho que a Petrobras faz na área do pré-sal. Mas, enfim, as oportunidades que temos no Brasil são muitas, e poderíamos estar avançando bem mais. Há muitos estudos desenvolvidos dentro das universidades que não conseguem chegar ao mercado. Não conseguem transpor a barreira das investigações iniciais para fazer parte da pesquisa industrial e ter utilização dentro do processo produtivo. Muitas empresas querem inovar, mas estão com dificuldades muito sérias para pagar as contas em dia e sobreviver... E por outro lado estas empresas não conseguem acessar linha de crédito para inovação, porque não há políticas públicas de incentivo à inovação, ou são insuficientes.

Que prognóstico você faz sobre a guerra comercial recíprocas entre Estados Unidos e China? Acredita que o bom senso vai dissipar as medidas hostis, de parte a parte?

Eu acredito que sim. Em algum momento, China e Estados Unidos vão sentar e ter um acordo comercial construído. Essa guerra comercial não é positiva nem para a China, nem para os Estados Unidos, nem para o mundo. Quando a gente está em briga, não cresce. Ou cresce menos. Acredito que chegaremos a um entendimento daqui a alguns meses. Como são as duas maiores economias do mundo, também são os que mais perdem com a guerra comercial. Um acordo certamente terá impactos sobre todos os países, principalmente nos produtores de commodities, o que é o caso do Brasil. Num confronto, perdem todos.

Eugênio Esber – Amanhã
Com adaptação BiodieselBR.com