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Regulação

Exclusivo: Os detalhes do decreto de governança do RenovaBio

A BiodieselBR teve acesso com exclusividade ao decreto assinado ontem (14) pelo presidente Michel Temer. O documento marca o início do processo de regulamentação da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio)


BiodieselBR.com - 15 mar 2018 - 10:35 - Última atualização em: 15 mar 2018 - 15:14

A Lei 13.576, de 26 de dezembro de 2017 – que estabelece a nova Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) –, promete incentivar a produção nacional de combustíveis renováveis, como etanol e biodiesel. Para isso, um dos aspectos mais importantes é o estabelecimento das responsabilidades dos órgãos do governo criando um modelo de governança para o programa. Além, claro, da definição das metas anuais de redução das emissões de gases causadores de efeito estufa. Estes são os principais pontos do decreto assinado pelo presidente Michel Temer, que dá início oficial ao processo de regulamentação do programa.

De acordo com o texto, as metas anuais deverão ser definidas até 15 de junho de 2018 – ou seja, dentro de três meses. Por sua vez, as metas individuais deverão ser publicadas até 1º de julho de 2019, passando a vigorar em 24 de dezembro de 2019.
Segundo o decreto, as metas serão divulgadas em unidades de créditos de descarbonização (CBios). Desse modo, essa passará a ser a medida oficial da redução desejada para as emissões de CO2 na matriz energética de transportes. Cada CBio equivalerá a uma tonelada de carbono que deixou de ser lançada na atmosfera.

Em relação a governança, o decreto estabelece a criação do Comitê RenovaBio. Ele será liderado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e contará também com representantes dos ministérios de Meio Ambiente; Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Indústria, Comércio Exterior e Serviços; Fazenda; Planejamento, Desenvolvimento e Gestão; e Casa Civil.

Metas anuais
O decreto ainda determinou que dois comitês devem enviar recomendações de limites máximos anuais para o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), presidido pelo Ministro de Estado de Minas e Energia.

Um deles é o Comitê Interministerial de Mudanças do Clima (CIM), que deve levar em conta os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil – mais especificamente, na COP-21 –, levando em conta a participação dos biocombustíveis no conjunto de esforços a ser realizado por diversos setores da economia. O CIM é composto por 16 ministérios, sob coordenação da Casa Civil.

O outro órgão que também deverá enviar uma recomendação é justamente o recém-criado Comitê RenovaBio. Nesse caso, além de observar os compromissos internacionais do país de responsabilidade do CIM, o comitê também precisará considerar a oferta de biocombustíveis por parte dos produtores e importadores que façam parte do programa, o consumo nacional de combustíveis, a valorização dos recursos energéticos nacionais, os interesses dos consumidores – em relação a preço, qualidade e oferta – e o impacto dos preços dos combustíveis na inflação.

Em complementação, o decreto determina que o comitê deve elaborar análises e estudos, seja diretamente ou por convênio, para a determinação de cenários e projeções que apoiarão a definição das metas. A princípio, no entanto, todos os aspectos a serem analisados já fazem parte da modelagem econômica desenhada pelo MME para o cálculo e acompanhamento das metas.

Na prática, estes dois comitês vão sugerir metas diferentes, o primeiro focado no desejável de acordo com o compromisso da COP-21. O segundo, preocupado com o impacto dessas metas anuais para a economia e a população. Dependendo de como a demanda e oferta de bioenergia avançar, as metas do CIM podem ficar insignificantes. O Brasil se comprometeu a ter 18% de bioenergia (etanol, biodiesel e bioeletricidade), percentual que o Brasil já cumpre, o crescimento assim, dependeria do crescimento orgânico da demanda.

Metas individuais
Por sua vez, a responsabilidade pelo desdobramento das metas anuais em metas individuais – que serão aplicadas às distribuidoras de combustíveis – foi confirmada como sendo da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Isso já era previsto pelo fluxograma do RenovaBio, elaborados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

Além disso, o decreto do RenovaBio também estabelece que a ANP deverá fazer a publicação anual do percentual de atendimento das metas individuais. Desse modo, as distribuidoras que não comprarem a quantidade mínima de CBios necessária deverão ser listadas, assim como a multa aplicada a cada uma delas.

Apesar disso, cabe ao CNPE autorizar a redução das metas individuais. A princípio, segundo o decreto, isso será permitido apenas para as distribuidoras que comprovarem a aquisição de combustíveis por meio de contratos de longo prazo. O documento também coloca o limite máximo de 20% para essa redução.

Papel da ANP
Antes de começar a acompanhar o andamento do programa, contudo, a agência terá um longo caminho a percorrer. Até o RenovaBio entrar efetivamente em vigor, caberá à ANP estabelecer critérios, procedimentos e responsabilidades tanto para a regulação do programa quanto para a fiscalização da certificação dos biocombustíveis. Inclusive, a adição de novos biocombustíveis ao programa também precisará passar pelo crivo da agência.

Isso significa que a ANP ficará encarregada da concessão, da renovação, da suspensão e do cancelamento do Certificado de Produção Eficiente de Biocombustíveis, que será concedido às usinas participantes do RenovaBio – além da emissão da nota de eficiência energético-ambiental, a ser calculada pela RenovaCalc.

Para isso, a ANP também deverá credenciar as firmas inspetoras – companhias a serem contratadas pelas usinas e que irão realizar a certificação e emitir a nota. Essas empresas também estarão sujeitas à suspensão ou ao cancelamento de suas credenciais por parte da ANP.

Multas para as distribuidoras
Conforme já havia sido adiantado, as multas das distribuidoras que não cumprirem suas metas individuais podem chegar até a R$ 50 milhões.

Segundo o decreto presidencial, o valor será equivalente ao preço dos CBios não adquiridos, considerando como valor a maior média mensal dos créditos vista no último ano. Entretanto, haverá o piso de 100 mil reais e o teto já mencionado de R$ 50 milhões. Outra regra estipulada em relação à multa é de que, respeitando-se o piso, ela não poderá ultrapassar 5% do faturamento anual da distribuidora visto nos dois anos anteriores.

Dessa maneira, uma distribuidora com uma receita de R$ 24 milhões terá como multa máxima o valor de R$ 1,2 milhão. Já uma distribuidora minúscula, com receita de R$ 1,8 milhão, não poderá receber uma multa de R$ 90 mil – equivalente a 5% da receita –, pois o valor mínimo estabelecido é de R$ 100 mil. Além disso, todas as distribuidoras que tenham registrado receita anual igual ou superior a R$ 1 bilhão poderão ser multadas em até R$ 50 milhões, independentemente da receita excedente ou mesmo se valor dos CBios devidos ultrapasse esse teto.

Dessa maneira, para as maiores distribuidoras o limite de R$ 50 milhões será pouco. Desconsiderando o enorme prejuízo de imagem, economicamente pode ser interessante para uma distribuidora não comprar CBio algum e apenas pagar a multa no seu valor máximo.

Mercado de CBios
Outro ponto levantado pelo decreto é a criação do mercado de comercialização dos CBios. Cada crédito é equivalente a uma tonelada de CO2-equivalente que deixa de ser emitida quando o biocombustível é comparado a seu substituto fóssil. A quantidade de CBios que cada usina poderá emitir será calculada multiplicando a produção pela nota de eficiência ambiental-energética.

O Comitê RenovaBio será o responsável por acompanhar a capacidade de produção das usinas que participam do programa e que, portanto, poderão emitir CBios.

A partir disso, o mesmo comitê ainda deverá monitorar a oferta, a demanda e os preços dos CBios. Entretanto, não foi estabelecida nenhuma ferramenta de regulação desse mercado, que é dependente das metas a serem estabelecidas e ainda poderá estar sujeito a regras que serão determinadas posteriormente.

Acompanhamento das metas
O Comitê RenovaBio também recebeu outras responsabilidades via decreto. Uma delas é o monitoramento da produção, do abastecimento e do mercado de biocombustíveis, visando especialmente manter a regularidade no abastecimento.

Ademais, ele também deve submeter as metas a consulta pública e propor medidas – preventivas ou corretivas – para sua execução. Dessa forma, o decreto dá ao comitê a missão de garantir o cumprimento das metas sem que ocorram riscos à comercialização e ao abastecimento de biocombustíveis.

Esse acompanhamento também permitirá que o Comitê RenovaBio cumpra outra de suas responsabilidades: a divulgação da evolução do chamado “índice de intensidade de carbono da matriz brasileira de combustíveis”. É a partir desses valores que será estabelecido se as metas gerais estão sendo cumpridas – em outras palavras, se o RenovaBio está atingindo os resultados ambientais prometidos.

O decreto será publicado amanhã do Diário Oficial da União.

Renata Bossle – BiodieselBR.com

Tags: Renovabio