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Política

Governo quer metodologia própria para regular mercado de carbono


Valor Econômico - 22 mai 2023 - 09:01 - Última atualização em: 07 jun 2023 - 11:42

O governo federal quer criar uma metodologia própria para a regulação do mercado de carbono no país. A proposta deverá gerar oportunidades para mecanismos de captura e estocagem do gás carbônico equivalente, além de estabelecer o modelo de mitigação das emissões.

A principal novidade — e que poderia impulsionar projetos que já estão em desenvolvimento no setor de etanol e energia — é a criação desse mercado baseado na captura e sequestro de carbono (CSS, na sigla em inglês para Carbon Capture and Storage), disse ao Valor uma fonte que acompanha as discussões sobre o tema em Brasília.

Um novo arcabouço legal para o assunto está em discussão internamente em um grupo liderado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) com a participação do setor privado interessado e um comitê de cientistas.

Uma proposta de lei deve ser encaminhada ao Congresso Nacional no segundo semestre deste ano. Outras três já tramitam no parlamento. O governo estima que o mercado de carbono regulado deve gerar até R$ 120 bilhões até 2030.

O Valor apurou que a nova política em construção no governo deve incentivar investimentos em tecnologias sustentáveis que possibilitem a captura e o armazenamento seguro do gás de efeito estufa, de forma que não seja nocivo ao meio ambiente.

Estudos técnicos analisados pela equipe que trabalha no assunto dão conta de que o mercado mundial de CCS em 2022 foi de quase US$ 5 bilhões e que o potencial é chegar a US$ 35,7 bilhões em dez anos. Um relatório recente da CCS Brasil, organização que estimula a atividade, diz que o país pode capturar 190 milhões de CO2 por ano e, num cenário conservador, movimentar US$ 14 bilhões anualmente.

O “novo mercado” é uma opção aos modelos já testados e abarca processos diferenciados que podem ajudar no combate ao aquecimento global, diz a fonte. Até agora, os mercados de carbono discutidos no país são de redução de mitigação e não na captura de CO2 equivalente.

A medida em discussão não criaria, de imediato, uma nova obrigação para as empresas nem implica em aumento de custos para a iniciativa privada fazer a transição. Uma das ideias em debate é a criação do mercado de comercialização dos créditos de carbono dentro do mercado financeiro, nos moldes da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), afirmou essa fonte.

Nesse mercado, poderiam fazer parte do mercado regulado as empresas que faturam mais de um R$ 1 bilhão. Elas seriam estimuladas a comprar o crédito de captura, sem obrigatoriedade imediata, mas prazo de dez anos para adequação.

Atualmente, 3.103 empresas se encaixariam nesse perfil. Parte já está engajada com o desenvolvimento sustentável e o aprimoramento de práticas ESG. Com o crescimento da oferta dos créditos de carbono, o governo espera que o escopo da parte demandante aumente.

Na avaliação do governo federal, as maiores empresas de vários setores já têm iniciativas para redução de emissão equivalente. A iniciativa para o mercado de carbono, nesse ponto, funcionaria como um imposto sobre grandes fortunas em que o serviço de transferência de renda é trocado pela sustentabilidade entregue pelas companhias mais poderosas, sem pagamento em dinheiro efetivamente.

Um projeto nessa linha está em fase de testes no Brasil. A FS Bioenergia, maior produtora de etanol de milho do país, está investindo mais de R$ 300 milhões para “limpar” a fumaça branca que sai diariamente das chaminés da planta em Lucas do Rio Verde (MT) a partir da fermentação da levedura do cereal para produção do biocombustível.

O projeto, batizado nesse segmento de BECCS (processos de captura de carbono gerado por fontes renováveis), consiste na captura e transformação do dióxido de carbono emitido durante a produção do etanol de milho por meio da compressão. O objetivo é chegar a um produto químico no estado de fluído supercrítico que será enterrado no subsolo, a quase dois quilômetros de profundidade, abaixo de uma camada de rochas, onde ficará estocado ao invés de ser liberado na atmosfera. A FS informou que o projeto “está em fase de testes de perfuração de solo para iniciar os testes de injeção”.

Consultado, o MDIC não confirma uma priorização do CCS no projeto de regulação. A Pasta disse que a definição da tipologia dos projetos que serão aceitos no mercado regulado, se de captura e estocagem ou de mitigação e redução, será feita na regulamentação infralegal do tema, que só será editada após a aprovação da lei.

Segundo o ministério, a discussão da proposta se encaminha para possibilitar o uso de offsets, ou seja, que os créditos de carbono gerados de forma voluntária sejam usados no mercado regulado, o que demandará regulamentação específica sobre o nível máximo de utilização desse mecanismo.

O ministério respondeu que a proposta para a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) se baseia no modelo “Cap and Trade”, utilizado em vários países e no Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia. “A proposta é de que seja estabelecido um limite máximo de emissões de GEE para o conjunto das entidades reguladas e, a partir desse limite, serão emitidas licenças ou cotas de emissão, que poderão ser negociadas no mercado de carbono brasileiro”, respondeu o MDIC.

Rafael Walendorff – Valor Econômico