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Política

Combustível do Futuro é a nova frente da crise entre governo e Petrobras


Valor Econômico - 20 mar 2024 - 09:26

Após a crise em torno dos dividendos extraordinários da Petrobras, o projeto que estimula a produção de combustíveis mais ecológicos é o novo foco de desavença entre o Palácio do Planalto e o comando da estatal. Aprovado por ampla maioria na Câmara após um acordo com o governo, na semana passada, o PL do “Combustível do Futuro” chega ao Senado sob pressão da Petrobras por alterações no texto, especialmente no capítulo que trata do biodiesel.

Defendida pela bancada do agronegócio, a definição de metas para o percentual de biodiesel misturado ao óleo diesel não estava no projeto original do governo, mas foi incluída pelos deputados em um acordo que incluiu a Casa Civil e o Ministério de Minas e Energia. Pelo que ficou definido, o percentual mínimo passaria dos atuais 6% para 15% já em 2025, com alta gradativa de 1 ponto percentual por ano até 2030, quando atingiria 20%.

De acordo com o texto, a viabilidade das metas será avaliada pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). O colegiado vai fixar o percentual obrigatório de adição de biodiesel, que pode variar entre 13% e 25%, a depender das condições de mercado. Apesar de o programa ser visto pelo governo como o movimento mais concreto feito até agora em direção à transição energética, o chamado “mandato do biodiesel” encontra forte resistência da Petrobras.

Durante a tramitação na Câmara, a estatal chamou a atenção para o aumento de custos – e de preços – que virá junto com o aumento da mistura. Também argumentou que perderá mercado no diesel logo após ter anunciado investimentos importantes em refino. Um dos principais projetos é o segundo trem da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que promete processar até 130 mil barris de petróleo por dia e custar até R$ 8 bilhões.

A Petrobras também tentou, sem sucesso, incluir o diesel coprocessado no projeto de lei. Essa categoria do combustível, menos poluente, é processada na refinaria juntamente com óleos vegetais e diesel de origem fóssil. O comando da estatal queria que o percentual "verde" do coprocessado, em torno de 5%, fosse considerado para o cumprimento das metas do biodiesel, mas os deputados não aceitaram.

Também foram rechaçados na Câmara os apelos da companhia contra as metas para incorporação do biometano na venda de gás natural e pela aceitação de um modelo alternativo de querosene de aviação sustentável. Essas pautas terão uma segunda chance durante a tramitação no Senado.

Até o fim da semana passada, havia uma expectativa de que o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, seria o relator do Combustível do Futuro na Casa. Segundo o Valor apurou, ele já havia concordado em preservar os principais pontos do texto que veio da Câmara, em especial a questão do biodiesel e do biometano.

No entanto, uma articulação liderada pelo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, com apoio do Ministério da Fazenda, teria convencido o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) a indicar outro relator para o projeto. O escolhido, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), herdou a presidência da Frente Parlamentar da Energia Renovável, que era comandada por Prates enquanto senador.

A avaliação de executivos da Petrobras é de que Veneziano, que também é vice-presidente do Senado, terá mais disposição para ouvir os argumentos de todas as partes e "esticar o diálogo". A companhia entende que o governo teve que ceder aos interesses dos deputados para ganhar fôlego político para projetos mais prioritários na Câmara.

Nesta terça-feira, em evento do setor de petróleo nos Estados Unidos, Prates confirmou que a Petrobras vai defender um mandato para o diesel coprocessado no Senado e elogiou Veneziano. "Por isso é bom ter o bicameralismo, você tem que ter aquela calibragem", disse o presidente da estatal em entrevista ao portal "EPBR". Procurada, a Petrobras não havia se manifestado até o momento da publicação.

Na semana passada, a empresa teve uma desvalorização de mais de R$ 50 bilhões na B3 após o anúncio de que os dividendos extraordinários referentes ao quarto trimestre de 2023 não seriam distribuídos. A decisão, tomada pela maioria do conselho de administração, foi respaldada por um parecer técnico e, principalmente, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Murillo Camarotto e Caetano Tonet – Valor Econômico