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Política

Bolsonaro tem a 2ª maior alta nos combustíveis desde 2002


Poder 360 - 26 abr 2022 - 09:37

O governo Jair Bolsonaro (PL) tem o 2º maior aumento acumulado nos preços do diesel e da gasolina, nas refinarias, desde a abertura do mercado no Brasil. Em 2021, a alta foi de 64,7% para o óleo diesel S10 e 68,6% para a gasolina. O acumulado no ano só fica atrás dos mais de 100% de aumento registrados em 2002.

A diferença é que, naquele ano, a alta nas refinarias da Petrobras não foi repassada integralmente para o consumidor final. Segundo dados da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), o preço na bomba aumentou 57% para o diesel e 26% para a gasolina. Nas refinarias, a alta foi de 129% e 146,8%, nessa ordem.

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Iniciada pelo governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 1997, a abertura do mercado de petróleo foi concluída em 31 de dezembro de 2001. No ano seguinte, o Brasil deixou de adotar subsídios cruzados no refino e abriu o mercado interno, repassando os valores internacionais para os combustíveis.

Criada em 2001, a Cide-Combustíveis (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) serviu como um “imposto regulador”, contou Marcelo Simas, economista sênior da Petrobras de 1998 a 2019.

Segundo o especialista, a precificação do mercado interno era feita com base em uma média móvel dos preços praticados internacionalmente. A Cide era usada para amortizar as oscilações do mercado, sendo aumentada ou diminuída de acordo com o movimento dos preços no mercado interno e externo.

“A Petrobras fazia esse jogo juntamente com o Ministério da Fazenda para evitar que o preço dos derivados aumentasse tanto aqui”, afirmou.

Para o economista e cientista Ricardo Caldas, especialista da Fundação da Liberdade Econômica, o governo Lula foi pouco intervencionista nos preços das refinarias, na comparação com o governo de Dilma Rousseff.

“Mas não havia política de paridade ainda. Então, esses aumentos no mercado internacional eram pouco absorvidos pela Petrobras naquele momento. E não podemos esquecer que no governo Lula aumentou o poder de compra também. Então, comparativamente, o custo de encher o tanque não era tão elevado”, disse Caldas.

De acordo com o professor adjunto da Escola de Química da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Luís Eduardo Duque Dutra, durante o governo Lula até o início do governo Dilma, “os preços da Petrobras continuaram a ser administrados de uma forma que considerassem, de um lado, o impacto inflacionário e, do outro, a remuneração da empresa. Sem dúvida alguma, havia uma balança [entre os 2 fatores] a cada grande reajuste”.

Com a deterioração da economia nacional, depois de 2011, o governo Dilma resolveu baixar os combustíveis a canetada. Foi quando a Petrobras começou a segurar os reajustes, mantendo os preços entre 10% e 20% abaixo da referência internacional, segundo Marcelo Simas.

Essa política, implementada de 2011 a 2014, representou perdas bilionárias para a Petrobras. Em 2015, com a queda do barril de petróleo e a operação Lava Jato, a estatal chegou a registrar prejuízo de R$ 34,8 bilhões.

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Em outubro de 2016, a gestão de Pedro Parente, no governo Michel Temer, implementou o PPI (Preço de Paridade de Importação), que considera o preço do petróleo no mercado internacional e a cotação do dólar. Mas o alinhamento mais rigoroso aos preços do mercado externo veio mesmo 9 meses depois.

Em julho de 2017, a Petrobras anunciou que os reajustes nas refinarias passariam a ser até diários, se necessário. De fato, dados da Petrobras, obtidos pelo Poder360 com base na Lei de Acesso à Informação, mostram que em 2017 houve 128 alterações de preços nas refinarias. Para se ter uma ideia da mudança, no ano anterior tinham sido só três.

Segundo Ricardo Caldas, o objetivo do governo Temer era dar um recado aos investidores e ao mercado internacional no contexto pós-Lava Jato.

“Temer quis recuperar a imagem internacional da Petrobras, com uma governança mais técnica e menos política. Ele assumiu no contexto de que a Petrobras foi usada. Chegou com a missão de recuperar a imagem da empresa e claro, com os acionistas. Então, ele assume o compromisso de manter a paridade internacional”, disse Caldas.

A vice-liderança da alta acumulada de 2021, no governo Bolsonaro, foi consequência direta de um fator atípico: a pandemia mundial do coronavírus.

De 2020 para 2021, o preço médio do barril Brent – negociado na Bolsa de Londres e usado como referência para a precificação da Petrobras – praticamente dobrou. Paralelamente, o real manteve a forte desvalorização em relação ao dólar, na proporção de 1 para 5.

“Um real mais forte, claro, acaba tendo um impacto menor da moeda. Quanto mais forte o real estiver, menor será o custo da importação. Claro que a taxa de câmbio mais tranquila no governo Lula ajudou”, afirmou Caldas.

Com o real desvalorizado e o barril em ascensão, os repasses chegam a aproximadamente 24% para a gasolina e 35% para o diesel em 2022, ano eleitoral.

Os aumentos no governo Bolsonaro levaram à troca de 2 presidentes da Petrobras. Indicado pelo ministro Paulo Guedes (Economia), Roberto Castello Branco foi demitido em abril de 2021 depois de desgaste com o governo por causa dos reajustes frequentes da estatal. Foi substituído pelo general Joaquim Silva e Luna, que manteve os repasses, seguindo o PPI. No comando da estatal há menos de 1 mês, o ex-secretário do Ministério de Minas e Energia, José Mauro Coelho, já disse que vai manter a política de paridade.

Para William Nozaki, coordenador técnico do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), o histórico dos reajustes feitos pela Petrobras mostra o que ele chamou de dinâmica pendular na sua política de preços.

“Entre 2011 e 2014 [no governo Dilma], a Petrobras praticou uma política de preços com excessiva contenção nos repasses, o que impactou negativamente as contas da empresa, trazendo efeitos colaterais a médio prazo, mostrando que a política de congelamento de preços é inadequada”, disse Nozaki.

Agora, afirma o especialista, há um desequilíbrio desse “pêndulo” para o lado oposto.

“A livre flutuação criou um ambiente em que a Petrobras consegue cumprir a missão de aumentar os lucros e dividendos, mas ela está internalizando um viés de alta nos preços dos combustíveis, que é responsável por parte importante da inflação hoje. Isso mostra que a opção contrária ao congelamento também é inadequada”, disse Nozaki.

Para Ricardo Caldas, não há nada de errado em seguir os preços internacionais, uma vez que o petróleo é uma commodity. Mas ele avalia que, independentemente do resultado das eleições deste ano, o Congresso Nacional e o governo devem rever o PPI.

“Estamos em um momento de transição. Há a ideia de criação de um fundo de estabilização dos preços dos combustíveis. A gente tem, na verdade, uma convergência de agenda entre os 2 pré-candidatos. Há tanto parlamentares do governo quanto da oposição propondo a mesma coisa, com o mesmo objetivo, que é acabar com o PPI. Então, a política de PPI sozinha não tem futuro”, disse Caldas.

Marcelo Simas classifica os países em 3 tipos: “petronações” como as que formam a Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados), emergentes e desenvolvidos. Os primeiros são grandes produtores de petróleo e subsidiam os derivados. São regimes autocráticos ou ditaduras, que controlam os preços artificialmente para garantir coesão social. Os emergentes, importadores líquidos de combustíveis, adotam algum tipo de suavização dos preços. Já os países desenvolvidos, com moedas fortes, repassam a volatilidade com mais frequência.

“Qual é o dilema do Brasil? O Brasil é um exportador de petróleo e importador de derivados. É um país emergente e que precifica os derivados como se fosse um país desenvolvido”, afirmou.

Laís Carregosa e Rafaella Barros – Poder 360