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Soja

Quebra da safra de soja em 2024 terá sério impacto na economia


UOL - 19 abr 2024 - 09:28

O Brasil terá uma safra de soja 5,2% mais baixa neste ano, segundo estimativas. Como o grão é a principal commodity do agronegócio brasileiro, a quebra da safra deve ter impacto significativo na economia do país, afetando a renda dos trabalhadores, as receitas dos produtores e o PIB (Produto Interno Bruto).

Os agricultores brasileiros devem colher 146,5 milhões de toneladas de soja na safra de 2023/24. O boletim divulgado na quinta-feira (11) pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) mostrou mais um ajuste para baixo na sua projeção da produção nacional, indicando queda de 5,2% em relação à safra passada, que foi de 154,6 milhões de toneladas do grão.

O cenário traz preocupações para a economia no curto prazo. A soja é a principal commodity brasileira do agro, responsável por quase metade das 294,1 milhões de toneladas da safra de grãos, aponta a Conab. O Brasil também é o principal exportador mundial do grão. Com a queda observada na produção, o órgão espera o envio de 92,2 milhões de toneladas para fora ao final da safra.

Os prejuízos no campo são causados por condições climáticas adversas. A influência do fenômeno El Niño no segundo semestre teve como consequência a falta de chuva no Centro-Oeste e as tempestades na Região Sul que atingiram as regiões onde estão os maiores estados produtores da commodity.

Os produtores rurais também perceberão o impacto na renda. Por um lado, a área destinada para a plantação de soja cresceu para 45,2 milhões de hectares (+2,6%) na atual safra. Por outro lado, o tempo maior para o plantio das sementes, causado pelas mudanças climáticas, prejudicou a produtividade porque o ciclo produtivo da oleaginosa sofreu atrasos.

A quebra de safra será sentida no PIB deste ano. O sócio-diretor da consultoria Pátria Agronegócios, Matheus Pereira, diz que é difícil quantificar o quão dependente a economia brasileira é da produção de soja, mas avalia que uma série de setores depende direta e indiretamente da atividade.

O agronegócio foi responsável por 23,9% da geração de riquezas em 2023. O Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) calculou que o setor foi responsável por injetar R$ 2,58 trilhões no PIB, queda de 3% em relação ao ano anterior.

“A falta de dinheiro em circulação atrapalha a venda de máquinas, caminhonetes, ampliação de negócios e as contratações. A carga salarial do agronegócio é boa, bem acima da média nacional. Um operário dentro da atividade agrícola recebe de três a quatro salários mínimos. É todo um capital que deixa de circular”, avalia Matheus Pereira, diretor da Pátria Agronegócios.

“A quebra de safra vai trazer impactos na arrecadação de impostos. As exportações de soja vão ter menor volume e o preço vai cair também. Tudo isso influencia no PIB [...] E também deve impactar outras cadeias, como serviços e comércio. De repente, o produtor vai segurar a compra de máquinas e equipamentos, já que as margens estão apertadas”, prossegue Alfredo Guedes, gerente de agricultura do IBGE.

Os alimentos vão ficar mais caros?

O mercado de soja está aquecido no mundo em 2023/24. O Departamento de Agricultura dos EUA estima que a produção da oleaginosa será de 396,7 milhões de toneladas, aumento de 4,9% sobre a temporada passada. A Argentina, que na safra anterior foi fortemente castigada pela seca, deve dobrar a colheita neste ano, de 25 para 50 milhões de toneladas.

O aumento da safra global ajuda a segurar o preço dos alimentos no Brasil. O farelo da soja é utilizado na ração dos animais criados na pecuária, ou seja, poderia deixar as carnes vermelhas mais caras, além de contribuir com a escalada do óleo de cozinha. No Brasil, a saca de 60 kg da commodity é vendida hoje em média por cerca de R$ 120, segundo o Cepea. Em 2022, durante um período mais forte de oferta em queda, o preço subiu perto de R$ 200.

O Rio Grande do Sul evitou perdas maiores na safra brasileira. O gerente de agricultura do IBGE, Alfredo Guedes, afirma que os produtores do estado foram beneficiados pelas chuvas em 2023 após temporadas consecutivas de estiagem, enquanto outras culturas enfrentaram muitas dificuldades.

Os gaúchos devem reassumir em 2024 a segunda posição na produção nacional. O Mato Grosso ocupa o primeiro lugar, com previsão de 38 milhões de toneladas. O Rio Grande do Sul deve colher 21,7 milhões de toneladas e pode ultrapassar o Paraná, que cai para terceiro, com 18,4 milhões de toneladas. Os dados são do IBGE.

“Uma queda de 2% ou 5% não mexe com os preços no Brasil. O mundo está produzindo mais soja e isso que faz os preços caiam, em geral. Mas a perda de produção em um ambiente de menor preço é um fator de maior preocupação para a cabeça do produtor”, diz Lucilio Alves, pesquisador do Cepea para grãos

Socorro ao produtor

A quebra da safra de soja acendeu um alerta no governo federal. No final de março, o CMN (Conselho Monetário Nacional) aprovou a renegociação de dívidas de crédito para produtores de 16 estados afetados pelas condições climáticas. Em resumo, esse socorro abrange plantadores de soja, milho e criadores de gado bovino, que deverão formalizar o pedido até 31 de maio.

Quem produz soja também terá direito a uma linha de crédito em dólar. O Ministério da Agricultura confirmou ao UOL que o anúncio do lançamento será feito "nas próximas semanas" pelo ministro Carlos Fávaro, juntamente com equipes da pasta e do BNDES, instituição que oferecerá recursos aos produtores rurais.

Esse tipo de socorro é necessário neste momento de baixa produtividade. Alfredo Guedes descarta a ideia de o agronegócio receber muitos privilégios do setor público. "O agro é praticamente uma indústria a céu aberto que investe muito, e muitas vezes capital próprio. É importante apoiar porque tem muitos pequenos produtores que dependem dessa ajuda para trabalhar e vira e mexe são afetados."

Mas o setor deve respirar tranquilamente no próximo ano. O pesquisador da FGV Agro, Felippe Serigati, sintetiza: quem amargou prejuízos financeiros no Centro-Oeste não vai lembrar dessa safra com carinho. Já o produtor gaúcho vai celebrar a retomada dos negócios após anos negativos. Ele acredita que a colheita de soja tem tudo para ser melhor em 2025.

“O potencial da atividade no Brasil continua o mesmo. É normal. Vai ter ano bom, vai ter ano ruim. A gente não pode perder produtores por causa de condições climáticas. Se tiver que renegociar dívida, renegocia. Mas, para não apagar incêndio, é um programa de seguro rural bem fortalecido”, afirma o pesquisador da FGV Agro, Felippe Serigati.

Henrique Santiago – UOL