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Soja

Moratória da Soja tem fraude concorrencial? Para o Ministério Público, não


Valor Econômico - 22 ago 2025 - 11:34

O Ministério Público Federal (MPF) não enxerga até o momento indícios de fraude concorrencial envolvendo a Moratória da Soja, acordo privado entre grandes tradings exportadoras que impede a comercialização do grão produzido em área desmatada na Amazônia Legal desde 2008.

Na última segunda-feira (18), a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) concedeu uma medida preventiva para determinar o fim da “moratória". Desde então, o acordo está suspenso.

"A posição institucional do Ministério Público é de que até aqui não há elementos suficientes para que se diga que houve fraude concorrencial. E de outro lado, há elementos suficientes para dizer que [a moratória] é uma experiência bem significativa do ponto de vista do controle do desmatamento", disse ao Valor o procurador do MPF junto ao Cade, Ubiratan Cazetta.

O MPF ainda não deu nenhum parecer sobre o caso que tramita no órgão antitruste, o que pode ocorrer somente daqui a cerca de 10 dias. Mas vai analisar, no decorrer da investigação, a partir da manifestação de todas as partes no processo (produtores, indústria, etc), se surge algum elemento que acuse "problema concorrencial" nesse caso, explica Cazetta.

Tribunal

A medida preventiva será analisada, agora, pelo Tribunal do Cade, após o sorteio de um relator - não há prazo para que isso ocorra. O inquérito corria sob sigilo desde agosto do ano passado.

"Até aqui, nenhum indicativo de que isso [problema concorrencial] ocorra, mas nós vamos aguardar o desenrolar dessa investigação para identificar se houve ou não. E se houve, verificar se há algum remédio para ser adotado, mas sempre com esse olhar de que não há indicativos até este momento de que isso tenha ocorrido", acrescentou.

De acordo com o procurador, numa análise "exclusivamente ambiental", o MPF já entende que ao longo dos quase 20 anos de vigência a "moratória" se mostrou eficaz e produziu "efeitos ambientais benéficos". Segundo ele, durante esse período do acordo, o Ministério Público observou que houve um aumento da área plantada de soja na Amazônia Legal "sem impacto significativo" e com bons resultados do ponto de vista ambiental.

Mesmo antes de o Cade suspender a "moratória da soja", o MPF já havia se posicionado pela manutenção do acordo, por meio de ofício técnico. De acordo com o órgão, a moratória está alinhada com os preceitos firmados pela comunidade internacional, no âmbito do Acordo de Paris, por exemplo. E correspondem à demanda de importadores de que os produtos brasileiros e produzidos em outros países sejam provenientes de áreas não desmatadas.

"Por fim, pelo Acordo de Paris, compromisso internacional assumido pela República Federativa do Brasil, a União Federal se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia e a reflorestar 12 milhões de hectares de florestas, objetivo de alcance praticamente impossível caso se rompa com os avanços promovidos pela Moratória da Soja", diz posição da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão (Meio Ambiente e Patrimônio Cultural) do MPF.

Histórico

Em nota, como mostrou o Valor, a área técnica do Cade acusou 30 grandes empresas exportadoras de formação de cartel e duas associações representativas de indução à conduta uniforme – a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a Associação Nacional de Exportadores de Cereais (Anec).

A investigação teve início no órgão antitruste após uma representação da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, com apoio da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT). A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) também apresentou uma denúncia, em fevereiro deste ano. A área técnica do Cade assinalou que a preventiva é necessária para evitar lesão irreparável ou de difícil reparação.”

A moratória da soja encontra divergência até mesmo no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com visões opostas entre o Ministério da Agricultura, que já se manifestou contra o acordo, e avaliações internas das Pastas da Fazenda e do Meio Ambiente, que veem efeitos positivos da moratória e temem que o Cade o derrube. O próprio MMA, da ministra Marina Silva, disse em nota ver com "preocupação" a decisão do Cade.

Cristiano Zaia – Valor Econômico