Biodiesel: aumento na mistura deve estimular esmagamento de soja, avalia Conab
A expectativa de aumento na mistura de biodiesel no diesel fóssil a partir do segundo trimestre do ano deve estimular o processamento de soja pela indústria brasileira. A avaliação é da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que elevou a estimativa de consumo interno da oleaginosa na safra 2022/2023, de 50,68 milhões para 52,74 milhões de toneladas do grão.
Os números estão no relatório mensal de grãos de janeiro, divulgado na semana passada. Segundo a Conab, a estimativa foi elevada “em razão da continuidade do uso de biodiesel ao diesel em 10% (B10) nos três primeiros meses de 2023, mas com a expectativa que nos meses consecutivos a mistura passe para 15% (B15), antes estimada em 12%.”
No relatório, a Conab fez ajustes nas suas projeções de safra e no quadro de oferta e demanda. Em função de problemas climáticos em regiões produtoras, a produção do grão foi revisada de 153,48 milhões para 152,71 milhões de toneladas.
O ItaúBBA também coloca o possível aumento da mistura de biodiesel como ponto de atenção do mercado. Em relatório mensal, destaca que a mudança elevaria a demanda das indústrias para esmagamento de soja, com efeito sobre as exportações do grão.
“No Brasil, os players também devem ficar de olho em um possível aumento da mistura de biodiesel no diesel a partir de abril, o que poderia aumentar a necessidade de esmagamento e, consequentemente, impactar os prêmios nos portos”, diz o ItaúBBA.
Pelo menos por enquanto, o enfraquecimento dos prêmios tem ajudado a pressionar as cotações da soja. É o que avalia o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), mencionando também a movimentação do dólar e as estimativas de safra recorde do Brasil, apesar do clima.
O indicador do Cepea, com base no corredor de exportação de Paranaguá (PR) acumula baixa de 4,27% neste mês, até a segunda-feira (16/1), quando valia em R$ 176,56 a saca de 60 quilos. No dia 2 de janeiro, a referência foi cotada a R$ 183,56 a saca. Desde o dia 6, tem sido cotado abaixo de R$ 180.
“Sojicultores estão com as atenções voltadas às atividades de campo e não mostram interesse em negociar o remanescente da safra 2021/22”, avaliam os pesquisadores do Cepea, em nota divulgada na segunda-feira (16/1).
A colheita da safra nova está em andamento, com relatos de atrasos no trabalho de campo. Em Mato Grosso, maior produtor nacional, o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) reportou um avanço de 1,36 ponto percentual na semana encerrada na sexta-feira (13/1). De acordo com a instituição, as colheitadeiras percorreram 2,38% das lavouras do Estado. Na mesma época na safra passada, tinham passado por 4,16%.
Em todo o país, a consultoria Pátria AgroNegócios estimou na última sexta-feira (13/1) uma colheita de 0,85% da área, também com atraso em relação à temporada 2021/2022. Nesta mesma época no ciclo anterior, o trabalho de campo estava em 1,68% do total. A média histórica é de 1,27%.
Governo x Indústria
A mistura de biodiesel foi tema de discussão entre responsáveis pela área no então governo de Jair Bolsonaro e o setor produtivo. A previsão era passar para B14 (14%) em 2022. No entanto, o Ministério da Minas e Energia decidiu manter a mistura em 10%, sob o argumento de conter a alta dos combustíveis e evitar a pressão sobre a inflação.
No final do ano passado, em meio à retração dos preços dos combustíveis estimulada por medidas tributárias do governo federal, o Ministério de Minas e Energia novamente resolveu manter os 10% pelo menos até março deste ano, deixando a decisão para o novo governo. Houve reação negativa do setor e no então gabinete de transição do governo Lula, que chegou a dizer que veria meios de reverter a medida, o que não ocorreu.
Considerando a possibilidade de mistura maior, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) atualizou seus números de oferta e demanda. Reduziu a projeção para a safra de soja 2022/2023, de 153,5 milhões para 152,6 milhões de toneladas, e a previsão de exportações de soja em grão, de 93 milhões para 92 milhões de toneladas em 2023.
Em relação aos derivados, a Abiove manteve as projeções de produção em 40,2 milhões de toneladas de farelo e de 10,7 milhões de toneladas de óleo de soja. Ainda assim, os números são maiores que os de 2022, de 38,6 milhões de toneladas de farelo e 10,2 milhões de toneladas de óleo.
“A expectativa quanto ao processamento do grão segue em 52,5 milhões de toneladas, o maior já registrado em toda a série histórica. Vale mencionar que a Abiove considera a retomada da mistura de biodiesel, 15% (B15), a partir de março, conforme cronograma previsto na legislação”, diz a entidade, em nota.
Raphael Salomão – Globo Rural