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Luiz Pereira Ramos

A Qualidade da Matéria-Prima para a Produção de Biodiesel - Parte 1


Luiz Pereira Ramos - 20 ago 2006 - 22:12 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:22

O Brasil, por ser detentor de uma grande extensão territorial, apresenta uma ampla diversidade de matérias-primas para a produção de biodiesel, como a soja, o girassol, a mamona, o milho, o pinhão-manso, o caroço de algodão, a canola, o babaçu, o buriti, o dendê, a macaúba, o amendoim, dentre outras. Óleos de descarte, gorduras animais e óleos usados para cocção de alimentos também são utilizados como matérias-primas alternativas. No entanto, é importante ressaltar que as propriedades químicas e físicas da matéria-prima estão diretamente associadas à tecnologia e ao rendimento do processo de conversão e, por conseguinte, à qualidade do produto final para fins combustíveis.

De uma forma geral, pode-se afirmar que ésteres alquílicos de ácidos graxos podem ser produzidos a partir de qualquer tipo de matéria-prima oleaginosa, mas nem toda matéria-prima pode (ou deve) ser utilizada para a produção de um biodiesel que atenda às especificações internacionais. Isso porque algumas delas apresentam propriedades não ideais que são transferidas para o biocombustível e que o tornam inadequado para uso direto (B100) em motores do ciclo Diesel. Uma propriedade indesejada é a baixa estabilidade à oxidação, que torna o armazenamento do biodiesel mais complexo e compromete o seu uso direto em motores. Por outro lado, viscosidades muito altas são tecnicamente indesejáveis; por exemplo, o óleo de mamona é muito viscoso (~239 mm2/s) e, por conseqüência, produz ésteres de viscosidade (~14 mm2/s) superior aos limites estabelecidos pela especificação do motor.

Dentre as matérias-primas citadas acima, é também importante ressaltar que muitas ainda dependem de uma avaliação mais detalhada sobre as suas respectivas cadeias produtivas que, em muitos casos, ainda se encontra nos primórdios de seu desenvolvimento. Assim, seria coerente reconhecer que a viabilidade de uma matéria-prima depende de sua competitividade, tanto técnica quanto econômica e sócio-ambiental, passando inclusive por importantes aspectos agronômicos como:
(a)   o teor de óleo vegetal e a complexidade exigida no processo de extração;
(b)   a produtividade por unidade de área;
(c)   o equilíbrio agronômico;
(d)   a atenção a diferentes sistemas produtivos;
(e)   o ciclo de vida da planta (sazonalidade);
(f)    sua adaptação territorial; e
(g)   o impacto sócio-ambiental de seu desenvolvimento.

Avaliações como estas têm sido consideradas fundamentais para a compilação da análise do ciclo de vida do biodiesel, fato hoje considerado importante para um país que pretende explorar o potencial energético de seus recursos naturais (biomassa) de forma comprovadamente sustentável. Naturalmente, uma vez comprovada a viabilidade de uma determinada matéria-prima (particularmente as mais exóticas), ainda restará a necessidade da implantação de projetos de ampliação de escala, incluindo a realização de testes de longa duração em motores de tecnologia atual e a condução de estudos agronômicos mais aprofundados que venham a garantir sua disponibilidade nos momentos de maior demanda.

  A importância da seleção da matéria-prima pode ser inicialmente avaliada pelo seu  impacto sobre o custo da produção industrial de biodiesel via transesterificação  (ou alcoólise) em meio alcalino. De acordo com avaliações do National Biodiesel Board (www.biodiesel.org), baseadas na produção norte-americana de ésteres metílicos de óleos ou gorduras, a matéria-prima corresponde a 69,9% do custo de produção, cabendo 8,8% à administração e vendas (incluindo marketing), 6,3% ao custo de capital, 5,1% ao álcool para transesterificação, 3,4% ao custo de pessoal, 1,6% ao catalisador alcalino, 4,0% à manutenção, seguro e despesas incidentais e 1,0% ao capital de giro. Portanto, ao mesmo tempo em que revelam grande maturidade tecnológica, estes dados reputam importância estratégica à escolha da matéria-prima, o que depende grandemente do respeito aos arranjos produtivos locais. Em última análise, isto significa que a escolha da matéria-prima não pode ser atrelada a uma decisão meramente política.

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Luiz Pereira Ramos, é colunista do site BiodieselBR.com, Bacharel e Licenciado em Química (1982) e Mestre em Bioquímica pela Universidade Federal do Paraná (1986), obteve o grau de Ph.D. sob a supervisão do Prof. Dr. J. N. Saddler na Universidade de Ottawa, Canadá, em 1992. Saiba mais sobre o autor.

E-mail: lramos@quimica.ufpr.br

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