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Miguel Angelo

Vantagens e desvantagens do limite de oferta no leilão


Miguel Angelo Vedana - BiodieselBR - 25 jan 2011 - 08:40 - Última atualização em: 07 mar 2012 - 18:44

A Brasil Ecodiesel levou uma proposta ao governo para reduzir a oferta de biodiesel nos leilões da ANP. A ideia da empresa é que o atual limite de 80% seja reduzido para 60%. A seguir apresento uma análise sobre o tema.

O setor de biodiesel está com uma capacidade instalada muito superior a demanda interna prevista. Atualmente a capacidade nominal de produção brasileira está em 5,3 bilhões de litros por ano e a demanda estimada para 2011 é de cerca de 2,5 bilhões de litros. Como está sobrando capacidade de produção, alguns ficarão sem produzir (ou muitos amargarão grande ociosidade).

Como vimos no leilão 19, as esmagadoras tem condição de vender biodiesel por um preço menor que as usinas não verticalizadas. Esse preço mais competitivo pode ser alcançado graças ao menor custo com a matéria-prima, ou por estarem queimando parte do lucro que teriam com a venda do óleo de soja, ou por terem um processo de produção mais econômico, ou ainda, por terem recursos suficientes para aguentar um trimestre de prejuízo. Ou seja, se a disputa continuar da forma como está, a indústria da soja prevelacerá.

Contudo o governo tem interesse na diversificação da matéria-prima do biodiesel. Isso ficou bem claro no discurso do ex-presidente Lula no lançamento do B5, quando ele disse:  “prestem atenção em uma coisa eu vou falar, que é muito séria... Nós não temos o direito de ficar dependentes da soja... será um ledo engano e nós iremos começar a perder...”

Hoje, em razão de toda a cadeia de incentivos da soja, é mais barato produzir biodiesel com essa matéria-prima que qualquer outra em um cenário de preços equivalentes. O problema está no fato de que um novo marco regulatório (que já está sendo estudado) com possíveis incentivos à matérias-primas alternativas à soja vai demorar pelo menos alguns trimestres para ficar pronto. Até lá, usinas que tem interesse em trabalhar com outras oleaginosas podem ficar obrigadas a sair do mercado por causa da disputa com as empresas que já eram do ramo da soja, ou como foram chamadas na carta da Ecodiesel, as “mega corporações”. A saída das empresas menores dificultaria essa diversificação intencionada pelo PNPB.

A proposta
Com o objetivo de que todas as usinas consigam sobreviver até a entrada em vigor de um novo marco regulatório, a Ecodiesel, através de seu Diretor Presidente José Carlos Aguilera, enviou ao governo a proposta de diminuição no limite máximo de venda nos leilões de biodiesel de 80% para 60%. Essa medida reduziria a oferta de biodiesel, bem como a concorrência entre as empresas, permitindo que usinas que não estejam verticalizadas consigam vender volumes maiores. 

O novo marco legal seria o prazo limite para a vigência dessa medida, pois espera-se que ele traga novos incentivos a matérias-primas alternativas à soja, que darão sutententação a investimentos de longos prazo na formação dessas novas cadeias produtivas.

Em valores nominais, a oferta de biodiesel trimestral seria reduzida de 1,07 bilhão de litros para 801 milhões. A demanda em 2011 por trimestre deve ser de cerca 625 milhões de litros. Ou seja, a oferta ainda seria 28% maior que a demanda, o que na teoria ainda manteria uma concorrência entre as usinas.

Os problemas da proposta
Apesar da proposta contribuir com o interesse governamental do biodiesel depender menos da soja, ela esbarra em uma série de problemas. Um deles é que o MME vem trabalhando para aumentar a concorrência nos leilões. Em 2009, quando os leilões eram presencias, a quantidade de propostas de cada usina foi reduzida de três para duas com o propósito de aumentar o deságio, que repetidademente ficava perto de 1%. Depois mudou para leilão eletrônico com o objetivo explícito de aumentar a concorrência, já que a medida anterior não tinha surtido o efeito desejado. Apesar de ser eletrônico, o 20º leilão chegou a ser constrangedor em termo de ofertas. Assim, não será fácil para o governo explicar a razão de limitar o volume das usinas para os leilões,  indo contra as duas medidas tomadas anteriormente. Além disso, haverá atrito com as usinas contrárias a proposta, já que é fácil identificar algumas empresas que serão totalmente contra a ideia.

Outro ponto que tem que ser levado em consideração é que o preço do biodiesel tende a ficar mais alto. Como as usinas terão que limitar suas vendas em 60% da capacidade, todos os custos fixos das unidades serão diluídos em um volume menor. A ANP poderia alternativamente, reduzir o preço máximo do biodiesel, mas aí seria criado um novo atrito com os produtores.

Mudança de regras
Essa alteração pode se mostrar ainda mais problemática no longo prazo. A mudança de uma regra tão importante pode afastar novos investidores internos ou externos, que verão o setor com regras voláteis. A proposta é benéfica no curto prazo para as usinas que projetam grande ociosidade, mas, em termos de investimento, não é boa para o PNPB e para o setor como um todo no longo prazo.

Inicialmente a proposta teve uma boa recepção entre as usinas, o que é um ponto positivo. Uma decisão da Casa Civil e do MME deve levar em consideração a opinião dessas usinas. Contudo algumas empresas não precisam se manifestar para sabermos que a posição é contrária, a ADM é o caso mais óbvio. Importante lembrar que o governo sempre pensou o setor de biodiesel no longo prazo.

Também é importante perceber que nem sempre a capacidade autorizada pela ANP é de fato o real volume que determinada usina pode produzir. Assim pode ser que muitas usinas de grande porte fiquem satisfeitas em vender 60%, pois o volume pode estar muito perto da sua real capacidade de produção.

Como o 21º leilão de biodiesel da ANP deve ser autorizado pelo MME ainda esta semana, haverá pouco tempo para a discussão sobre a mudança. Mas como 25 empresas receberam uma cópia da carta, é provável que o assunto vá ganhando corpo com o passar das semanas.

Fiel da balança
Além disso, dependendo do resultado do 21º leilão, essa proposta ganhará outro peso. Um deságio pequeno, com poucos lances, como ocorreu no 20º leilão, pode enterrar de vez qualquer interesse que o governo tenha em prosseguir com esse assunto. Por outro lado se o deságio for alto, acima do que manda a prudência, o governo pode achar que essa limitação é menos prejudicial para o setor que a situação atual.

Excelente iniciativa
Independente do caminho que essa proposta seguir, ela terá sido importante para o setor. Um mercado em franco amadurecimento como o de biodiesel precisa de novas ideias. E elas devem ser debatidas por todos aqueles que tem interesse no tema. O diretor da BSBios, Erasmo Battitella, já sugeriu a criação de um selo de Qualidade do Biodiesel, para que as reclamações das distribuidoras e postos não tivessem continuidade. Agora a Ecodiesel apresenta um nova ideia para resolver o problema do excesso de capacidade do setor. Estou certo que existem outras usinas com ideias que podem ajudar o setor, só é preciso que elas sejam apresentadas e debatidas.

Quem perde e quem ganha
Se esse percentual estivesse em vigor nos últimos dois leilões o resultado seria diferente. No leilão 20, das 41 vencedoras apenas 14 ocuparam volume acima de 60% de sua capacidade. No leilão 19 o número foi parecido, 15 dentre as 40 vencedoras.

Analisando as tabelas abaixo percebesse que no leilão 19 a medida apresentaria maiores resultados que no leilão 20. Naquele seriam transferidos quase 80 milhões de litros para outros produtores, enquanto no último seriam apenas 42 milhões. Essa análise mostra que quanto maior a concorrência, maior a utilidade da medida.  O problema acontece quando as usinas vão com pouco apetite no leilão. Se a falta de gula do 20º leilão (que foi o pregão com a menor concorrência, com poucas ofertas e leve deságio) se repetisse em outro com a oferta reduzida, o risco de ficar sem oferta de biodiesel é muito grande.

Vejam quais as usinas que teriam vendido menos:

19º leilão


Usina

Volume que perderia

Oleoplan

11.860,0

Granol GO

10.998,0

Granol RS

9.300,2

Bracol

9.047,6

BSBios

7.724,0

Fiagril

7.162,2

Caramuru SS

6.550,0

BSBios/Pbio

5.638,0

Cooperbio

4.340,0

Binatural

3.800,0

Spbio

752,4

Biotins

626,0

Grupal

520,0

B-100

480,0

Amazonbio

320,0

TOTAL

79.188,3

20º Leilão


Usina

Volume que perderia

ADM

16.630,0

B. Ecodiesel RS

5.060,0

Granol GO

4.898,0

BSBios

4.024,0

Petrobras MG

3.707,6

B. Ecodiesel TO

3.560,0

BSBios/Pbio

938,0

Agrosoja

880,0

Caibiense

600,0

Petrobras BA

415,3

Biocar

380,0

Innovatti

380,0

Amazonbio

270,0

Bio Petro

198,2

TOTAL

41.941,18



Miguel Angelo Vedana é diretor-executivo da BiodieselBR e faz parte do conselho editorial da revista BiodieselBR.