Os destaques do edital incompleto do 26º leilão de biodiesel

A ANP divulgou hoje pela manhã o edital do 26º leilão de biodiesel e, através dele, várias surpresas vieram a público.
A primeira está relacionada com o preço máximo. A partir deste leilão a divisão dos preços máximos não acontece por lote, mas por usina. Ou seja, o preço máximo depende da região onde a usina está localizada. E, neste aspecto, temos mais uma diferença. As unidades com e sem o Selo Combustível Social passam agora a ter preços diferentes. Assim, uma usina localizada no Nordeste com selo poderá ofertar biodiesel por R$ 2,8261, já aquelas que não possuem o benefício podem vender por no máximo R$ 2,6995, uma diferença de R$ 0,1266 por litro de biodiesel. O Nordeste é a região com a maior diferença, as demais giram em torno de três centavos.
Essa medida é uma sinalização clara de que o governo quer incentivar o selo social pagando mais para as usinas que investem na agricultura familiar. Contudo, na prática, a medida deverá ter efeito nulo, já que são esperados preços abaixo do estabelecido para as usinas sem selo. Veja abaixo a tabela com os preços para as usinas de cada região, com e sem selo:
Região | Preços Máximos | |
Com Selo | Sem Selo | |
Centro-Oeste | R$ 2,5379 | R$ 2,5014 |
Nordeste | R$ 2,8261 | R$ 2,6995 |
Norte | R$ 2,6941 | R$ 2,6576 |
Sudeste | R$ 2,6417 | R$ 2,6098 |
Sul | R$ 2,6143 | R$ 2,5871 |
Outra mudança é que, oficialmente, a limitação de venda de 80% da capacidade acabou. A partir de agora as usinas podem oferecer a totalidade da capacidade autorizada. Com isso o setor poderá saber qual é a oferta real de biodiesel disponível hoje no Brasil. Existe a suspeita que muitas usinas não conseguem produzir o volume que foram autorizadas. O principal motivo dessa desconfiança é o fato de nunca terem chegado perto de vender os 80% de sua capacidade nos leilões.
Com a oferta de todo o biodiesel que podem vender, as usinas bem conceituadas no setor podem acabar ficando com uma fatia ainda maior do que já vinham pegando, situação que pode diminuir ainda mais o interesse das distribuidoras pelo biodiesel das usinas de médio conceito.
Incompleto
Outra surpresa foi o fato de o edital divulgar apenas as regras para a parte do leilão que envolve as usinas. As distribuidoras, que ganharam papel de destaque nesse novo formato, vão ter que aguardar outro edital, desta vez estabelecido pela Petrobras.
O papel da ANP foi reduzido e esta precisará apenas analisar a documentação, receber e ordenar as propostas das usinas, enviar para a Petrobras e depois divulgar o resultado em seu site. Toda a disputa entre as distribuidoras se dará no ambiente virtual feito e controlado pela Petrobras. A agência nessa etapa apenas acompanhará o procedimento.
Uma semana?
E, nessa divisão de funções estabelecida pela ANP, os prazos são bastante diferentes e até curiosos. As usinas têm que enviar sua documentação até o dia 28/05 e a agência terá três dias para analisar os documentos e divulgar as usinas habilitadas em seu site. Aquelas que tiverem documentos faltantes poderão apresentá-los no dia 4 de junho, quando as propostas serão entregues. Neste dia as usinas farão suas ofertas e a ANP ordenará todas para apresentação ao público. Depois, a agência tem até o dia 12 de junho para enviar essas propostas para a Petrobras, que terá até o dia 14 de junho para enviar o resultado do leilão com as distribuidoras.
Analisando esses prazos, percebe-se que a ANP terá mais de uma semana para apenas organizar as ofertas das usinas de biodiesel e enviá-las a Petrobras. Já a estatal terá dois dias para comercializar todo o biodiesel para mais de 100 distribuidoras, organizar as ofertas e apresentar a ANP. O trabalho da ANP após o recebimento das propostas das usinas será apenas organizar 150 ofertas, no máximo. Não será preciso fazer qualquer análise posterior de documentação, mas porque a agência precisa de 7 dias para isso? Fico preocupado só de imaginar quanto tempo a ANP precisaria para organizar as etapas que a Petrobras está fazendo.
Essa diferença de tempo entre o prazo de entrega das propostas e a confirmação de venda do biodiesel é extremante prejudicial para o certame. Nesse novo modelo, as usinas oferecem um volume e um preço, sem saber se vão vender todo o volume, o que gera diversos problemas. Um rápido exemplo. Uma usina vai ofertar 50 milhões de litros no leilão por R$2,50. Esse valor foi escolhido com base no preço do óleo de soja daquele dia, mas como a usina não sabe quanto vai vender, ela não pode fazer nenhum tipo de travamento de preço do óleo. Ela só vai saber quanto vendeu dez dias depois e nesse meio tempo o preço da matéria-prima pode ter subido ou caído consideravelmente. Esse intervalo de dez dias fará com que o preço do biodiesel fique mais alto ou mais baixo do que o valor justo e gerará custos desnecessários para as usinas.
Outro problema é que as distribuidoras já saberão os volumes, preços e nomes das usinas que estão vendendo biodiesel. Abre-se assim uma janela de tempo grande para as distribuidoras pensarem de quem comprar, quanto pagar, perguntar para outra distribuidora se ela teve problema com determinada empresa e muitas outras coisas. Em um mercado fortemente concentrado na mão de poucas distribuidoras, dar esse tempo todo para elas pensarem pode não ser a melhor estratégia para garantir a competitividade.
Talvez a ANP devesse terceirizar também essa parte de agrupamento das propostas e envio para a Petrobras, para evitar problemas.
Miguel Angelo Vedana - BiodieselBR.com