Olhando para o Futuro
O Programa Brasileiro de Biodiesel pode ser comparado ao ciclo de vida de uma pessoa. Quando foi lançado, em 2004, todos pensavam como uma criança, achando que tudo seria muito fácil, como um sonho infantil. Seria apenas plantar mamona e dendê, extrair o óleo, transesterificar e adicionar 2% ao diesel. Faziam-se cálculos de quantos empregos seriam gerados no semi-árido, quantos milhões de dólares o Brasil economizaria deixando de importar diesel e quantos reais entrariam no bolso de cada agricultor agroenergético.
Dois anos depois, o programa está começando a entrar nas crises típicas da adolescência, quando percebemos que o mundo não é tão simples quanto se pensava. Ao sair da infância e encarar o mundo real, percebeu-se que plantar milhões de hectares não é como plantar um canteiro; que uma indústria de biodiesel...
é mais complicada que uma bancada de laboratório; que para ter qualidade é preciso ter tecnologia; que é preciso ter regras claras para que os atores possam atuar; precisamos de uma estrutura adequada de controle de qualidade, crédito, logística, armazenamento, tributação e vários outros fatores.
Os primeiros passos tem sido cambaleantes, cheios de dúvidas e incertezas. Será que isso tudo vai dar certo ou vai passar como uma onda, um modismo como muitos outros que passaram no Brasil?
É verdade que estamos passando por uma fase difícil, mas como poderia ser diferente? Seria bom se tudo acontecesse como planejado, mas os inúmeros técnicos, políticos, agricultores e empresários que estão colaborando na construção deste projeto estão se esforçando para acertar o máximo que podem, mesmo assim o programa necessita continuamente de muitos ajustes.
Observando a evolução de outros grandes programas de biocombustíveis, seja no Brasil ou na Europa, percebemos que para atingir um estádio maduro, todos levaram no mínimo 10 anos. Basta relembrar que o PROALCOOL foi lançado em 1975, mas só na metade da década de 80 os brasileiros puderam comprar seus carros a álcool. Neste intervalo, houve muita discussão, mudanças de rumo, idas-e-vindas e inúmeros erros cometidos. Porém, somente agora, 30 anos depois, o etanol finalmente se tornou a estrela mundial dos combustíveis renováveis.
Nosso programa de biodiesel tem somente dois anos e é normal que esteja passando por essas indefinições. Difícil é no meio da crise conseguir enxergar adiante e imaginar o sucesso que teremos, mas é justamente isso que precisamos fazer. A experiência adquirida com o PROALCOOL pode ajudar a diminuir o tempo de maturação, mas talvez tenhamos que aguardar pelo menos até 2024 para vermos este projeto funcionando normalmente e o biodiesel abastecendo tanques no Brasil, ou quem sabe, no mundo.
Liv Soares Severino
Pesquisador da Embrapa Algodão
liv@cnpa.embrapa.br