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O que muda com a liberação do plantio de pinhão-manso no Brasil?


Renato Roscoe - 07 fev 2008 - 12:17 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:23

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), através da Instrução Normativa No. 4, de 14 de janeiro de 2008, autorizou a inscrição no Registro Nacional de Cultivares da espécie Jatropha curcas L. (pinhão manso), o que abre caminho para a sua exploração comercial no Brasil. O que muda com essa nova medida do MAPA?

O pinhão manso é uma oleaginosa nativa provavelmente da América Central, mas que já se espalhou por em quintais e cercas vivas de quase todo o Brasil, desde o início da colonização. Com um óleo de excelente qualidade para produção de biodiesel, a planta tem sido celebrada como uma das melhores opções de matéria prima para esse biocombustível. O óleo não é comestível, o que permite o desenvolvimento de uma cadeia produtiva independente da de alimentos. A planta é perene e adapta-se a condições climáticas comuns a grande parte do Brasil.

Embora tenha havido um primeiro esforço de pesquisa no final dos anos 70 e início dos 80, com destaque aos dados gerados pela Epamig, a pesquisa sobre a cultura é ainda recente no Brasil. Por esse motivo, não houve tempo hábil para que variedades fossem selecionadas e registradas junto ao MAPA. Na realidade, até a publicação da referida Instrução Normativa, o pinhão manso nem existia oficialmente como planta cultivada no Brasil. Portanto, a mudança ocorrida em 14 de janeiro foi bastante significativa e marca o início de uma nova fase da exploração racional dessa oleaginosa.
 

"Até a publicação da Instrução Normativa, o pinhão manso nem existia oficialmente como planta cultivada no Brasil."


Mas uma pergunta é fundamental nesse ponto. O que levou o MAPA a liberar a espécie antes de haver pesquisas suficientes para o registro de cultivares? Essa decisão na realidade partiu, provavelmente, de uma junção de fatores. Primeiro a existência de um grande interesse do setor produtivo pela espécie, o que está levando à rápida difusão do pinhão manso por várias partes do País. Esse interesse tem levado à proliferação de materiais sem nenhum acompanhamento quanto a sua qualidade. Segundo, um volume razoável de informações sobre a espécie em várias partes do mundo e, em particular, os resultados da Epamig nas décadas passadas e as novas informações geradas a partir de 2004, não somente na instituição de pesquisa mineira, mas também em unidades da Embrapa e diversas empresas privadas. Essas informações, embora não tenham permitido ainda a geração de cultivares melhoradas, têm atestado o elevado potencial do pinhão manso como oleaginosa para o bioidesel.  E, terceiro, o tempo para que o sistema oficial de pesquisa gerasse as informações necessárias para o estabelecimento de um sistema de produção, zoneamento agrícola e registro de cultivares melhoradas, seria incompatível com a imediata necessidade de fontes alternativas de óleo para atender ao Programa Brasileiro de Produção e Uso de Biodiesel. Os dados mencionados levariam uma década para serem gerados.

Bem, o que muda então? Muda muito, pois antes da Instrução Normativa não se podia plantar pinhão manso no Brasil, mesmo que o produtor assumisse todo o risco. Agora, o MAPA autoriza o plantio, desde que quem o fizer assuma os riscos. Além disso, passa a ser legal a produção e comercialização de sementes, sendo necessária a inscrição das empresas no Renasem (Registro Nacional de Sementes e Mudas), havendo controle e fiscalização das áreas de produção de sementes, do processamento e toda a estrutura de comercialização. Com isso ganha o produtor de sementes que pode ter sua atividade legalizada e, principalmente, o agricultor que passa a ter garantias mínimas de qualidade de sua semente ou muda de pinhão manso.

Como sempre ocorre, vamos ter que reparar e melhorar o avião em pleno vôo. O material de pinhão manso que está sendo plantado é ainda um material selvagem, sem nenhum esforço de melhoramento sistemático. Isso implica dizer que há grande heterogeneidade, o que abre boas oportunidades de ganhos significativos com o melhoramento, logo nas primeiras gerações. Como as características do material selvagem têm sido consideradas viáveis para exploração comercial, certamente haverá uma expansão da área plantada antes da seleção sistemática de materiais, assim como teremos que gerar informações complementares e elaborar o sistema de produção em pleno vôo.

Evidentemente que investir em uma cultura, sem que se tenham todas as informações técnicas atestadas pelos órgãos oficiais, envolve risco. Entretanto, diante do cenário de grande necessidade de fontes alternativas de óleo para biodiesel, das boas perspectivas do pinhão manso e de disponibilidade de investidores dispostos a pagar para ver, o MAPA parece ter tomado a decisão acertada. 

Renato Roscoe é PhD em Ciências Ambientais pela Universidade de Wageningen - Holanda, consultor em Agroenergia e sócio da Rural BioEnergia