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Sobre o aumento do teor de biodiesel


Edição de Ago / Set de 2011 - 15 ago 2011 - 12:42 - Última atualização em: 19 jan 2012 - 16:15

O marco regulatório que introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira estabelecia o ano de 2013 para se atingir a meta de substituir 5% do diesel de petróleo pelo biocombustível. A estruturação da cadeia produtiva foi extremamente rápida, o que possibilitou a antecipação dessa meta para 2010. Hoje, com uma capacidade instalada para atender o dobro do consumo nacional, percebe-se claramente uma pressão para se editar um novo marco regulatório, com um aumento imediato do teor de biocombustível no diesel.

Quem participa dos diversos fóruns de discussão sabe que os diferentes agentes do mercado de combustível divergem muito sobre o futuro das blendas diesel-biodiesel. Existem setores pressionando fortemente por um aumento no teor das blendas para 7%, 10% ou até mesmo 20%. De fato, vi inclusive uma campanha nesse sentido, com cartazes na avenida que dá acesso ao aeroporto de Brasília. No entanto, outros setores militam por uma diminuição ou mesmo a retirada do biodiesel do mercado, alegando inclusive problemas técnicos relacionados à qualidade do biodiesel e de suas blendas com diesel.

Tecnicamente falando, até agora eu não escutei nenhum argumento que justifique o não aumento do teor. De fato, todos os problemas apontados pelos diversos agentes do biodiesel, pelo menos daqueles que ouvi falar, teriam uma solução possível. Por exemplo, fala-se muito na formação de borras, mas, como já discuti aqui na coluna, existem diversos mecanismos que geram essas borras e cada um possui uma solução já conhecida. Aliás, uma rápida olhada nos trabalhos científicos apresentados nos congressos da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel ou nos diversos periódicos científicos que tratam do tema, evidencia que diversos cientistas já estudaram esses assuntos e que já existem inúmeras saídas.

Se não existem problemas técnicos insolúveis e se temos capacidade instalada para produção, o que impede que o governo, histórico entusiasta do programa de uso de biodiesel, aumente imediatamente o teor de biodiesel no diesel? A meu ver, o grande problema hoje é a viabilidade econômica do biodiesel. Para tentar explicar o meu raciocínio, vou esquecer que ainda existem questões relativas ao uso de biodiesel. Vou imaginar que todos os problemas técnicos levantados já foram solucionados, pois, como explicado anteriormente, todos eles têm respostas conhecidas. Faço essa simplificação por uma razão simples: todas essas soluções acarretam custos adicionais e encarecerão ainda mais o uso de biodiesel.

Conforme dados divulgados nos leilões de biodiesel, o valor médio pago às usinas entre janeiro de 2007 e junho de 2011 variou de R$ 1,862 para R$ 2,207, tendo o pico de R$ 2,388 em novembro de 2008. Nesse mesmo período, conforme levantei junto a alguns distribuidores, o preço pago pelo diesel nas refinarias variou de R$ 1,385 para R$ 1,374, tendo o pico de R$ 1,522 em fevereiro de 2009. Esses dados falam por si só: como o programa de uso de biodiesel não prevê subsídios, a adição de biodiesel ao diesel gera um aumento no preço final da mistura ou uma diminuição na margem de lucro das distribuidoras ou postos. Como a segunda hipótese é pouco provável, pois acredito que o que poderia ser absorvido pela cadeia já o foi, a conclusão óbvia é que um aumento do teor de biodiesel agora impactará diretamente o preço do diesel, principal motor da nossa economia. Em épocas de luta ardorosa do governo para conter um repique da inflação, acredito ser pouco provável que os técnicos do governo assumam o risco de tomar uma decisão que irá pressionar ainda mais o aumento dos preços de bens e serviços.

Paulo Suarez é professor do Instituto de Química da Universidade de Brasília (IQ-UnB) e foi vencedor do Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia em 2005.