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Especificação: Prateleira


Edição de Jun / Jul de 2011 - 04 ago 2011 - 14:25 - Última atualização em: 19 jan 2012 - 10:07

Prateleira

O transporte está longe de ser o único vilão para a qualidade do biodiesel brasileiro. O segundo ponto que precisa passar por uma revisão é o armazenamento nos postos de combustíveis. Hoje, há dois fatores que podem, mesmo depois da entrega pela distribuidora, causar dores de cabeça para o consumidor final. Por um lado, há postos fazendo armazenamento de maneira errada. Por outro, em algumas regiões o combustível costuma ficar tempo demais esperando pelos consumidores, o que causa a deterioração do material.

“No tanque do posto nem sempre existe o mesmo cuidado que há em uma distribuidora”, afirma Justino de Lullo. “E o posto armazena por mais tempo. Se o tanque fica sempre meio cheio, já é possível saber que vai juntar água na metade de baixo porque o tanque ‘sua’”, ensina. A falta de troca dos filtros, necessários para manter a qualidade do combustível, também é encontrada em muitas inspeções da ANP.

Porém, parte do problema pode estar na própria especificação da ANP, diz Eduardo Cavalcanti, do Instituto Nacional de Tecnologia (INT). “A usina está entregando dentro da especificação, mas no limite. Então, os problemas surgem no transporte e na armazenagem”, relata. Uma solução, aponta, seria uma especificação mais criteriosa, que poderia aumentar o tempo de prateleira do produto.

Ricardo Hashimoto conta que esse tipo de problema acaba criando uma situação inusitada: algumas vezes, o combustível foi produzido rigorosamente dentro das especificações determinadas no Brasil e “mesmo assim, quando chega para o consumidor, o material já traz algum tipo de deterioração”. Nesse caso, só o que poderia resolver o problema de maneira irreversível é uma mudança nas especificações, que teriam de prever um “tempo de prateleira” maior do que se imagina hoje.

Por enquanto, a ANP, que seria a responsável por uma revisão na especificação, não confirma se haverá mudanças. No entanto, diz estar atenta aos problemas e já menciona como possível uma “futura revisão” da legislação em vigor. “A Superintendência de Biocombustíveis e Qualidade de Produtos da ANP coordena um grupo de trabalho sobre garantia das especificações, o qual tem promovido junto aos agentes de mercado estudos sobre a estabilidade do biodiesel, inclusive por meio do acompanhamento do produto desde o produtor até o posto revendedor sob a forma de óleo diesel B”, diz a agência por meio de sua assessoria.

Os resultados dos estudos realizados pelo grupo de trabalho, bem como outras informações, servirão como base para futura revisão da norma que prevê a especificação, informou a ANP em resposta enviada à reportagem. No entanto, não há qualquer previsão de data para que isso ocorra. Na verdade, nem se sabe se, de fato, a revisão ocorrerá. Isso vai depender de como as coisas se encaminharão daqui para frente e dos resultados das primeiras medidas que já vêm sendo tomadas pela própria ANP.

Por enquanto, o grupo de estudo que a agência montou já apresentou um resultado inicial. Trata- -se de um manual de boas práticas para todos os envolvidos na produção, distribuição e comercialização do biodiesel. Finalizado ainda em 2010, o manual foi disponibilizado na internet e começou também a ser distribuído pelo país.

Quem acompanha o mercado, diz que os resultados já começam a ser sentidos. E uma maneira bastante precisa de se medir isso está nos próprios boletins da ANP que mostraram o problema. Nos primeiros três meses de 2011, as medições feitas pela agência registraram um índice ligeiramente inferior ao do ano passado. Enquanto em 2010, 3,6% das amostras foram reprovadas, neste ano o indicador está em 3,4%.

É uma diferença pequena, mas existe motivo para otimismo. Primeiro, porque mostra que a comunidade do biodiesel, quando bem orientada, adota boas práticas e responde ao apelo para que o produto tenha mais qualidade. Segundo, porque foi a primeira vez em quatro anos que o índice apresentou alguma melhoria. “Se não tivéssemos feito nada, do jeito que a coisa ia, seria possível imaginar que o índice em 2011 chegaria perto de 4,1%. Não foi o caso”, diz Hashimoto, da Fecombustíveis.

Sendo assim, os 3,4% não deixam de ser uma boa notícia. Mas ninguém discorda: ainda é preciso fazer muito mais.