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Cinética: A luta não deve ser pelo B10


BiodieselBR.com - 24 jun 2010 - 08:45 - Última atualização em: 19 dez 2011 - 16:57
B10?

Por Miguel Angelo Vedana

Com o fim da programação legal de aumento de mistura de biodiesel no diesel, a Ubrabio vem defendendo o incremento da mistura para o B10 sempre que possível. Não há dúvidas de que um novo marco regulatório para o setor é importante, mas o B10 não pode ser a principal bandeira da cadeia produtiva.

O setor de biodiesel é um setor de energia e, como tal, deve ser sempre planejado no longo prazo. Além de se preocupar com o lucro no ano corrente, é preciso pensar em como será o mercado de biodiesel daqui a dez anos. Hoje o biodiesel é o substituto renovável do diesel mais barato que existe. Contudo, esse título pode não se sustentar por muito tempo, pois novas alternativas estão sendo preparadas. Entre as algas, os biocombustíveis de segunda e terceira geração e todas as outras promessas, o diesel renovável feito de cana parece ser a mais promissora no curto prazo, contando com enormes áreas para o seu desenvolvimento no Brasil.

Hoje o uso desse diesel renovável não é aprovado, mas já está previsto no novo marco regulatório para o setor, que deve sair em breve. Em parceria com indústrias de álcool e montadoras, a Amyris está desenvolvendo este diesel no Brasil e, se a empresa estiver correta em seus cálculos, ela poderá produzir esse combustível com preço final próximo ao do diesel. Assim, quais motivos impediriam o governo de alterar a lei para fazer leilões de compra não apenas de biodiesel, mas também de diesel renovável para suprir a obrigatoriedade de mistura de combustíveis renováveis no diesel?

Pensando nos desafios vindouros, é preciso encontrar meios que possibilitem a competição do biodiesel com esses novos combustíveis. E a melhor estratégia para atingir esse objetivo é tornar o biodiesel mais competitivo frente ao diesel. Mas isso não pode ocorrer de forma a tirar a lucratividade das usinas. É preciso reduzir o preço do biodiesel mantendo um nível de rentabilidade capaz de proporcionar crescimento e novos investimentos para a indústria.

Apesar do B10 trazer essa rentabilidade, ele não garante que o biodiesel se torne competitivo; pelo contrário. Para que este biocombustível faça frente ao diesel, é preciso utilizar outras matérias-primas mais baratas que a soja. Como o Brasil não produz nada que possa ser usado em escala no lugar da soja, é preciso incentivar. E aqui entram a Ubrabio e todas as usinas de biodiesel. É preciso pressionar o governo, os políticos e as demais pessoas envolvidas para que seja feito um plano de incentivo a oleaginosas alternativas, a exemplo do recém-lançado programa do dendê. Mostrar para essas pessoas o enorme potencial brasileiro de expansão da agricultura energética. Somos um dos poucos países do mundo que pode aumentar a produção de grãos sem desmatar. Existem milhões de hectares que são utilizados apenas na safra de verão porque não há incentivo para o plantio na safra de inverno.

Ao invés de financiar estudos para dizer que o biodiesel polui menos, deve-se investir em estudos que mostrem a quantidade de terras subutilizadas no Brasil e o que é possível plantar nelas. Contratar especialistas para calcular o tamanho do benefício econômico e social que o país teria utilizando essas terras. Com esses dados, pressionar o governo para fazer sua parte, dando isenção total de impostos para o biodiesel produzido com essas matérias-primas alternativas, abrindo linhas de crédito e criando programas de divulgação desses cultivos. O retorno do governo não seria em impostos diretos, mas em desenvolvimento e crescimento do país.

O governo não pode esperar que as usinas mudem da soja para outra oleaginosa sem nenhum incentivo fiscal facilmente calculável.

Esmagadoras x biodiesel

As maiores usinas, hoje, são empresas do ramo da soja, e o biodiesel é para elas apenas um destino diferente para um produto que já existia. Elas têm um interesse próximo do zero em encontrar alternativas à soja. É preciso, então, criar novas formas de incentivo para quem produz biodiesel com uma matéria-prima diferente. Só vislumbrando a possibilidade de ganhar mais dinheiro é que o empresário vai investir em alternativas.

Da mesma forma, a Ubrabio não pode pensar que o B10 será implantado porque é mais saudável para a população, porque é verde, emite menos CO2 ou qualquer outro argumento ecologicamente correto. Quem decide dentro do governo sabe muito bem quanto custa produzir biodiesel, qual o preço do óleo de soja e qual é o lucro das usinas. Não adianta sair escrevendo que o Brasil tem capacidade real instalada para produzir até o B10, quando a capacidade real de produção é de no máximo B8 e seria temerário utilizar quase toda a capacidade instalada. Muito menos dizer que a inclusão da agricultura familiar está funcionando como deveria. Esses argumentos podem servir para convencer quem não entende de biodiesel, mas não se sustentam em uma discussão séria.

Exemplo do etanol

Encontrar formas de reduzir o preço do biodiesel precisa ser a principal bandeira de qualquer um que esteja envolvido com este setor. A luta por misturas maiores deve ser uma batalha de menor importância. Imaginem como seria triste se as usinas sucroalcooleiras estivessem hoje brigando pelo aumento da mistura de etanol na gasolina. Eles superaram essa fase porque conseguiram fazer com que o preço do etanol ficasse menor que o preço da gasolina, e com isso não precisam pedir por mais 1% de mistura, pois conseguem vender seu combustível puro.

Ficando mais barato, o biodiesel terá todo o mercado de diesel a seu dispor. Não apenas o mercado nacional, mas do mundo todo. Para isso devemos concentrar esforços, lutando por incentivos consideráveis a outras matérias-primas que não a soja. O B10 será uma consequência.

Miguel Angelo Vedana é Diretor-Executivo da BiodieselBR e faz parte do Conselho Editorial desta revista