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Produção e consumo

Biodiesel, o patinho feio está (quase) virando cisne


Globo Rural - 17 set 2012 - 10:05 - Última atualização em: 29 nov -1 - 20:53
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Já era para sermos a maior potência global em biodiesel, mas a alta carga tributária, infraestrutura logística deficiente, uma política pública conservadora, e a atuação em um mercado inédito, ainda atravancam o reinado do biodiesel brasileiro internacionalmente. A afirmação é unânime e repetitiva entre os líderes do setor de bioenergia quando se trata deste biocombustível, extraído do esmagamento de grãos oleaginosos (soja, canola, caroço de algodão, girassol) ou do aproveitamento do sebo bovino. Mas ainda assim, o clima de otimismo em relação ao sucesso do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), criado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2005, é próspero e incentiva a iniciativa privada a investir cada vez mais no segmento (e eles garantem ter algo em torno de R$ 30 bilhões para aplicarem até 2020, quando o mínimo necessário, seriam R$ 7,36 bilhões). A expectativa, agora, é que até dezembro de 2012, o Brasil assuma a liderança mundial do setor, ultrapassando a Alemanha*, que ainda está na frente no placar, com 200 milhões de litros a mais (em números exatos, o Brasil produz anualmente 2,4 bilhões de litros enquanto os alemães, 2,6 bilhões de litros). 

Não é loucura do mercado. Prova disso foi o que já aconteceu no setor desde 2005. “Saímos praticamente do zero naquele ano [736 litros de biodiesel] para uma produção de 1,5 bilhão de litros em 2008, e 2,4 bilhões em 2011. A iniciativa privada investiu fortemente no setor, tanto que a capacidade nacional do parque industrial é de 6 bilhões de litros de biodiesel por ano, mas estamos ociosos”, explicou o presidente da Associação dos Produtores de Biodiesel (Aprobio), Erasmo Carlos Battistela. Segundo o executivo, este valor é cinco vezes maior do que foi investido entre 2005 e 2010. “E isso vai acontecer quando o governo federal anunciar um novo marco regulatório para o setor”, emenda. 
 
O marco regulatório, que é a porcentagem de biodiesel que pode ser adicionado ao diesel fóssil, até agora, tem sido o maior obstáculo para os empresários, já que a outra grande luta do setor, a isenção tributária, foi resolvida no começo do ano quando a presidente Dilma Roussef desonerou o setor do Cide, Pis/Pasep, IPI e Cofins. “Com a capacidade produtiva que o Brasil tem, já teríamos condições de atender a demanda para adicionar 10% de biodiesel ao diesel imediatamente e, com os investimentos anunciados, esta capacidade saltaria para atender aos 20% em poucos anos”, diz Battistela. Em 2005, quando nasceu o PNPB, esta mistura era de 2%. Em 2010, passou a 5%, porcentagem que só seria aumentada em 2013, de acordo com o programa governamental. 

Battistela acredita que em pouco tempo o país assuma a liderança, desbancando a Alemanha, 200 milhões de litros à frente, e isto pode acontecer já no final deste ano, com a inclusão de novas usinas brasileiras no mercado. “Temos tudo para isso, bastando apenas resolver os problemas internos”, diz ele, sobre o governo.

Setor atraente
Mesmo com tantos entraves, as empresas investem cada vez mais no setor. Em agosto, a Cargill, maior empresa de agronegócios do mundo, anunciou sua entrada no segmento, com um investimento de R$ 130 milhões em uma usina em Mato Grosso do Sul, e capacidade para 700 mil litros diários do biocombustível.

Na usina da Cargill, assim como nas 70 outras instaladas no país, a matéria-prima mais utilizada para o biodiesel é a soja (82%), seguida do sebo bovino (14%), além da canola e da palma, que vêm ganhando espaço. “E por um bom tempo a soja vai dominar a indústria de biodiesel no Brasil”, diz o ex-ministro dos transportes, Odacir Klein, diretor executivo da União das Indústrias de Biodiesel (Ubrabio). Segundo ele, o uso da soja pode agregar valor à cadeia. “Com o esmagamento do grão e a extração do óleo, temos o farelo de soja, que podemos exportar com valor agregado”, diz.

Um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) aponta que, com o biodiesel, o Brasil poderá exportar em 2020, aproximadamente 28 milhões de toneladas de farelo de soja e obter uma receita de US$ 8,4 bilhões. “O aumento da produção de farelo, usado como ração, possibilita a oferta de mais proteínas animais, mais carnes em geral, que será a maior demanda”.

O chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agroenergia, José Manuel Cabral de Sousa Dias, diz que, além do parque industrial do país já ter condições plenas de atender a demanda de 10% imediatamente e de 20% até 2020, o setor não comprometerá o abastecimento interno nem as exportações do grão. "De acordo com a projeção do Ministério da Agricultura, em 2020 teremos 30 milhões de hectares plantados com soja. Para atender uma demanda de 10% por exemplo, o setor consumirá 35,4% da produção projetada, de 86,5 milhões de toneladas", diz ele. "Hoje, 14% da soja brasileira vira óleo para biodiesel".

As usinas de biodiesel se concentram nos Estados do Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás e São Paulo, onde há grande oferta de soja. As unidades instaladas nas regiões Norte e Nordeste estão perto da maior oferta de palma (óleo de dendê). “O que garante a continuidade dos investimentos são as premissas do PNPB”, diz Klein. Estas premissas são a garantia de compra do governo, através de leilões, e a possibilidade de obter o Selo Combustível Social (quando os fornecedores são pequenos agricultores inscritos no Programa Nacional de Agricultura Famliar , Pronaf). “Com o Selo Combustível Social, as usinas têm prioridades para vender o biodiesel ao governo”. No Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 110 mil famílias saíram da pobreza para se tornarem fornecedores agrícolas. Em 2012, estima-se que a compra da matéria-prima movimente R$ 1,2 bilhões. 

Viviane Taguchi

*Nota BiodieselBR: Embora a Alemanha tenha sido durante vários anos a maior produtora individual de biodiesel do mundo, no ano passado os Estados Unidos se tornaram os maiores fabricantes do mundo com mais 4 bilhões de litros produzidos. Argentina também encerrou o ano passado com uma produção estimada em 3 bilhões de litros o que a coloca a frente do Brasil e da Alemanha.