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Preço baixo do biodiesel: a estratégia das usinas nos leilões


Daniel Goulart - 17 out 2017 - 11:44 - Última atualização em: 21 nov 2017 - 15:02

Por que determinada usina – ou grupo de usinas – decide baixar os preços pedidos por seu biodiesel muito abaixo dos de seus concorrentes? Esta é uma pergunta recorrente nos leilões de biodiesel. Argumentos do tipo “X está fazendo loucura” ou “Y está querendo quebrar os concorrentes” não são incomuns. O intuito deste artigo não é ratificar ou retificar essas teses, mas mostrar que estratégias desta natureza podem, de fato, estar baseadas pura e simplesmente em um racional econômico. De forma bastante simplista, pode-se dizer que a fórmula de precificação para qualquer produto e serviço considera três elementos básicos: Custos Fixos (CF), Custos Variáveis (CV) e Mark-up (Mup).

Matematicamente, isso nos daria uma fórmula também simples para o preço (P): P = (100%xCF) + (100%xCV) + Mup. Se você fosse uma empresa de alto luxo como, por exemplo, a Ferrari, eu arriscaria dizer que daria para incluir no seu preço o Mark-up que desejasse. Afinal, quem compra Ferrari não o faz porque é mais barato ou mais caro do que, por exemplo, um Porsche, mas porque vê nesta marca características únicas que, na sua visão, nenhuma outra pode oferecer. Diferentemente do comprador de carros superesportivos, o comprador de biodiesel está buscando o produto mais barato que ele puder conseguir em determinada localização geográfica em um momento em que todos os produtores também estão oferecendo seu produto.

Assumindo-se o argumento acima apresentado como verdadeiro e conhecendo-se a sistemática dos leilões, não parece ser apropriado alocar uma “margem de lucro desejada” – ou “Mark-up” – no preço do biodiesel. O raciocínio é bastante simples: se dois produtores localizados geograficamente na mesma praça tiverem preços diferentes, o comprador optará pela oferta mais barata sem maiores considerações. Neste sentido, parece ser mais adequado colocar o preço mais competitivo possível na esperança de surfar a onda dos ágios.

A pergunta que fica é: qual é o preço mais competitivo que um produtor de biodiesel pode oferecer no leilão?

Pela lógica acima apresentada, a estratégia de precificação mais agressiva possível desconsideraria a existência de Mark-up. Desta forma, o preço seria resultado da soma simples entre Custos Fixos e Custos Variáveis, ou seja, P = (100%xCF) + (100%xCV). Assim, o produtor de biodiesel estaria sendo extremamente competitivo na sua estratégia de precificação, correto? Ainda não...

O conceito de Custos Fixos e Custos Variáveis ganha especial importância a partir deste ponto. Se você concorda que a pior coisa que pode acontecer é não vender nada, ficar com a planta parada e arcar com os Custos Fixos durante os dois meses subsequentes, você tenderá a concordar que a fórmula P = (X%xCF) + (100%xCV), sendo X < 100%, faz sentido.

Em outras palavras, se em um leilão extremamente disputado você vender biodiesel a um preço que pague os Custos Variáveis e, por exemplo, metade dos Custos Fixos, você estará tendo um resultado melhor (neste caso, menos pior) do que se não conseguisse vender nada e tivesse que pagar 100% dos seus Custos Fixos. Neste exemplo, sua fórmula de precificação seria: P = (50%xCF) + CV. Prosseguindo com o raciocínio matemático simplista, se o Resultado da Empresa (R) resulta da subtração entre Preço e Custos Totais (CT), pode-se afirmar que:


R = P – CT -> CT = CF + CV -> R = P – CF – CV

Cenário 1: preço cobre 50% dos CF e 100% dos CV
R = P – 100%CF – 100%CV (se P = 50%CF + 100%CV, então:)
R = 50%CF + 100%CV – 100%CF – 100%CV
R = -50%CF

Cenário 2: empresa não vende biodiesel.
R = P – 100%CF – 100%CV (se P = 0 e CV = 0):
R = -100%CF

Para alguns leitores isto pode soar como uma sugestão de canibalização do setor. Porém, na verdade, isto explica o porquê de alguns gestores precificarem a níveis tão agressivos e, até hoje, estarem nas suas posições dentro de suas empresas. Estas empresas surfam no ágio que seus concorrentes proporcionam. Este ágio é dado, entre outros fatores, por aquelas companhias que precificam seu produto com base na margem que “desejariam ganhar”.

A pergunta que pode surgir em seguida é: e se todos, a partir de amanhã, adotarem esta estratégia de precificação com base nos Custos Fixos? Neste caso, as empresas precisarão focar ainda mais na gestão de custos (fixos e variáveis) no sentido de serem mais competitivas do que seus concorrentes.

Rever as estratégias de compra de metanol e de metilato de sódio, reavaliar a estratégia de aquisição de matérias-primas, melhorar os rendimentos industriais (neutralização, transesterificação, consumos específicos de insumos, entre outros), gerenciar na ponta do lápis o custo com pessoal, adotar estratégias visando a redução dos custos relacionados ao Selo Social e rever a forma de captação para capital de giro são alguns exemplos de frentes que podem ser atacadas visando ganho de competitividade.

Admitir que as empresas produtoras de biodiesel reduzem seus preços “para quebrar seus concorrentes” ou “porque estão fazendo loucura” é subestimar a competência dos gestores que assumem esse tipo de estratégia. É difícil de acreditar, por mais que se queira, que uma empresa aceite reiterados prejuízos visando criar dificuldades financeiras aos seus concorrentes.

Existe lógica econômica e de gestão por trás destes preços.

Daniel Goulart é sócio da Vedana & Goulart, consultoria especializada no mercado de biodiesel.