Governo avalia mecanismo para obrigar Petrobras a vender ativos, incluindo refinarias
O governo avalia incluir no projeto de lei da privatização da Petrobras um mecanismo para obrigar a companhia a se desfazer de uma lista de ativos, incluindo refinarias, informaram à Folha integrantes do governo envolvidos nas discussões.
Na visão de defensores da medida o setor é hoje excessivamente concentrado nas mãos da empresa, o que dá a ela poder de mercado suficiente para influenciar os preços e manter margens de lucro elevadas — ponto que tem sido ressaltado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em suas críticas à companhia.
A aposta dessa ala do governo é que uma maior competição no mercado de óleo e gás pode ajudar a reduzir os preços de combustíveis no médio e longo prazo.
A Petrobras chegou a assinar em 2019 um acordo com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para vender 8 de suas 13 refinarias, mas a empresa até agora se desfez de apenas uma instalação —ritmo considerado indesejável e insuficiente por integrantes do governo.
A proposta em discussão daria ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) o poder de definir diretrizes para promoção da livre concorrência na indústria do petróleo e gás natural, o que incluiria a possibilidade de indicar os ativos a serem vendidos integralmente pela Petrobras.
O colegiado tem como membros efetivos dez ministros de Estado, entre eles os de Minas e Energia, da Economia, da Casa Civil e do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), além do secretário especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e do presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética).
O CNPE também poderia definir o prazo máximo para a conclusão das operações, bem como critérios a serem preenchidos pelos compradores para que haja ampliação efetiva da concorrência.
Em caso de descumprimento do calendário estipulado, a Petrobras estaria sujeita a penalidades. Uma das possibilidades é impor uma alienação compulsória dos ativos, a cargo da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), com auxílio de uma instituição financeira federal.
As receitas obtidas com a venda seriam revertidas à Petrobras, salvo algum custo para estruturar a operação.
A minuta do projeto de lei ainda está em discussão interna no MME e na Economia. O texto, portanto, ainda pode sofrer alterações até o momento de envio ao Congresso Nacional.
O MME tem visto no desgaste provocado pelos aumentos anunciados pela Petrobras uma oportunidade de criar um ambiente político favorável à privatização no Legislativo e, por isso, deseja celeridade nas tratativas internas para a conclusão da proposta.
O envio do projeto também poderia alimentar o discurso do governo de que está agindo para solucionar o problema dos combustíveis, considerado por integrantes da campanha de Bolsonaro um dos principais obstáculos à reeleição do presidente.
No entanto, há quem veja dificuldades de o Congresso conseguir avançar em um tema tão polêmico em ano eleitoral. O próprio presidente já admitiu publicamente que a privatização da companhia pode levar até quatro anos.
Além disso, o primeiro colocado nas pesquisas de intenção de voto para o Palácio do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é contra qualquer tentativa de privatizar a Petrobras.
Como mostrou a Folha, um dos modelos analisados para a operação é a conversão de ações preferenciais da companhia (priorizadas na distribuição de dividendos, mas sem direito a voto) em ações ordinárias (com direito a voto na assembleia de acionistas).
Apenas essa transação já seria suficiente para diluir a participação da União na empresa. Com isso, o controle da companhia passaria para as mãos da iniciativa privada.
Há preocupação, porém, em prever no texto uma espécie de antídoto contra a mera transformação de um monopólio público em privado. É nesse contexto que se encaixa o mecanismo que força a venda das refinarias.
Segundo um integrante do governo, a ideia é que a proposta de desinvestimentos seja apresentada aos acionistas minoritários da companhia como contrapartida à privatização —ou seja, o plano seria pactuado previamente.
O texto deve inclusive prever que a decisão do CNPE só terá aplicação caso seja ratificada pela assembleia de acionistas
Após o acordo assinado com o Cade, a Petrobras conseguiu vender apenas a Refinaria Landulpho Alves, na Bahia, agora sob comando da Acelen —empresa criada pelo fundo Mubadala, dos Emirados Árabes.
O ritmo lento dos desinvestimentos tem sido alvo de críticas dentro do governo, assim como a opção feita pela Petrobras de manter suas refinarias localizadas na região Sudeste, prejudicando a competição nessa área.
Já no setor, a avaliação é que a instabilidade em torno do comando da Petrobras e os ataques constantes à sua política de preços, proferidos inclusive por Bolsonaro, contribuem para diminuir o apetite de investidores por esses ativos.
Nesta segunda-feira (27), a Petrobras informou em comunicado que reiniciou os processos de venda da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, da Repar (Refinaria Presidente Getúlio Vargas), no Paraná, e da Refap (Refinaria Alberto Pasqualini), no Rio Grande do Sul.
"As principais etapas subsequentes dos processos de venda dessas três refinarias serão informadas oportunamente ao mercado", disse a companhia.
Idiana Tomazelli – Folha de S.Paulo