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Política

Foz do Amazonas, obras em refinarias, 'estaleiros lotados': o que pensa Magda Chambriard?


O Globo - 16 mai 2024 - 10:15

A engenheira Magda Chambriard, indicada para ser a nova presidente da Petrobras após a demissão de Jean Paul Prates na noite de terça-feira, deve se reunir com o presidente Lula na próxima segunda ou terça-feira. Segundo fontes, a decisão de colocá-la no comando da estatal foi tomada por ele no fim de abril. Os dois devem conversar principalmente sobre os investimentos da estatal.

Ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), ela agora retorna à estatal onde foi funcionária de carreira por 22 anos depois de um intervalo em que atuou no mercado como consultora na área de energia e petróleo. Nos últimos anos, ela tem escrito artigos sobre o setor de óleo e gás e concedido entrevistas como especialistas do setor, o que dá pistas sobre o que ela pensa e como pretende atuar à frente da maior estatal brasileira.

Uma das propostas de Magda é acelerar obras e projetos envolvendo a ampliação de refino e a retomada de fertilizantes. Para isso, uma das ideias é renegociar contratos. "Ela tem conhecimento e conhece os gargalos", disse uma fonte próxima a ela.

Entre fontes próximas de Magda, já é dada como certa a troca em diretorias importantes da estatal: nas áreas de Exploração e Produção e de Engenharia. Também está no horizonte dela a ampliação dos investimentos, com a inclusão de mais encomendas de navios de cabotagem, barcos de apoio e plataformas no novo Plano de Negócios da estatal para os anos de 2025 a 2029.

Apesar de Magda defender as regras de conteúdo local (que obrigam petroleiras a contratar parte dos equipamentos no Brasil) e a ampliação da função social da Petrobras, o que agrada ao governo, ela não tem o perfil de "rainha da Inglaterra", na avaliação de uma fonte. No entanto, aceitou o cargo ciente de que "não terá carta branca na estatal".

Visões conhecidas

Desde 2020, Magda emite opiniões por meio de artigos no Brasil Energia, veículo especializado sobre energia. De lá para cá, a engenheira escreveu sobre diversos temas envolvendo o setor de petróleo e gás — desde o compromisso frustrado da Petrobras com o desenvolvimento sustentável até a defesa de licenciamento para exploração da Foz do Amazonas.

Veja a seguir o que ela pensa sobre alguns desses assuntos, temas críticos nas decisões a serem tomadas pela estatal nos próximos meses:

Ampliação de investimentos nos estados produtores de petróleo
Em artigo intitulado 'Petróleo gera riqueza para quem?', publicado em novembro de 2023, Magda defendeu que a estatal gere retorno social para o país — uma demanda frequentemente repetida por Lula e integrantes do governo e do PT —, com ampliação de investimentos no Rio de Janeiro e demais estados produtores de petróleo. Ela indica que vê um papel importante da estatal na promoção de investimentos que possam movimentar a economia do país.

Ela cita a expectativa frustrada da empresa em contribuir com o desenvolvimento sustentável do país, já que assumiu compromisso de gerar bem-estar social através da produção do petróleo, mas reduziu investimentos e não conseguiu combater a desigualdade.

"Acreditou-se que a produção dessa riqueza geraria mais bem-estar social, em sintonia com as expectativas de desenvolvimento sustentável (...) Passada mais de uma década, alguns governos e a pandemia do Covid-19, a produção do petróleo cresceu, (...) mas o Brasil, que em 2012 se orgulhava do seu pleno emprego, chegou a cerca de 29,4% da população abaixo da linha da pobreza e a 8,4% da população na pobreza extrema", escreveu.

Defesa de 'estaleiros lotados'
Magda ressaltou ainda que, apesar da maior parte dos recursos petrolíferos do pré-sal estarem localizados no Rio de Janeiro, o estado "considerado a capital brasileira do petróleo" amargou perda de quase 10% dos seus postos de trabalho com carteira assinada entre 2014 e julho de 2023.

A engenheira argumentou que o Estado do Rio tem mais de dez estaleiros ociosos, e cada um deles poderia alocar cerca de 2 mil trabalhadores. E fez até um apelo para que o atual governo lote estaleiros:

"A estatal não poderia ter a dimensão atual sem a mão forte de um governo que a fez crescer de tamanho abruptamente, ao capitalizá-la e capacitá-la para enfrentar o desfio do Pré-Sal. (...) Aguarda-se pelos estaleiros lotados, conforme promessa da empresa, veiculada por diversos veículos da mídia especializada, em agosto de 2023", escreveu ela.

Exploração da Foz do Amazonas
Após o Ibama negar o pedido da Petrobras para explorar petróleo na Foz do Amazonas em maio do ano passado, Magda destacou em artigo em no mês seguinte que o país precisa enfrentar o "desafio do licenciamento tempestivo", "sob pena de condenar o Brasil à estagnação" caso não o faça, já que elevaria o chamado Custo Brasil, conjunto de entraves no ambiente de negócios do país que onera as empresas.

"Não é crível que após 10 anos da oferta pública da Margem Equatorial e décadas de operação na Bacia de Campos, ainda haja impasses técnicos em processos de licenciamento", disse ela, no artigo “Bacia da Foz, licenciamento ou risco Brasil”.

Segundo a engenheira, o Ministério do Meio Ambiente não pode "usurpar" o poder de concessão da Presidência da República. Ela defende que o poder do presidente seja superior ao da pasta de Marina Silva.

"O MMA será, de fato, o verdadeiro poder concedente do país? A Presidência da República concorda com isso? (...) É nesse contexto que se advoga a intervenção do Presidente da República. É ele que tem mandato para estabelecer as prioridades nacionais, em nome do povo", escreveu.

Risco de sobrecarga tributária
Em outro artigo intitulado "Reforma fiscal e as independentes", Magda cita o risco de sobrecarga tributária às empresas petroleiras independentes (como é o caso de Prio, 3R Petroleum e Enauta, por exemplo) diante da reforma fiscal, em que está sendo discutido uma série de tributos.

"É irrazoável que o Estado, ao criar políticas que onerem o setor, não excetue casos em que a desoneração foi dada como essencial para a sobrevida de diversos ativos. (...) É importante que se verifique como evitar que tais projetos de lei não conflitem, ou não anulem, incentivos recém fornecidos a empresas Independentes, que são decisivos para a constituição de seus portfolios de projetos", disse.

Ampliação da atuação da estatal
Em entrevista ao GLOBO em janeiro de 2023, em reportagem sobre papel da Petrobras no novo governo, Magda defendeu uma atuação mais ampla da Petrobras, para além da produção de petróleo, liderando projetos em outras áreas para atrair investimentos de outras empresas.

“Há uma percepção de que a companhia estava sendo gerida para ser vendida. A empresa hoje não se enxerga no longo prazo. Não tem horizonte. E seu futuro passa por gás natural. Ela tem de ter o papel de maestro. Mas não deve fazer isso sozinha. Para ser atrativa, tem que buscar parcerias”.

Crítica à política de venda de ativos, como a BR Distribuidora
A nova presidente da Petrobras também foi crítica da política de venda de ativos adotada pela estatal no governo Bolsonaro.

Em entrevista ao GLOBO, em reportagem sobre a perda de protagonismo da estatal entre as petrolíferas mundiais em 2020, Magda disse que a Petrobras fica mais suscetível a crises “ao botar todos os ovos na mesma cesta” e apontou risco na estratégia de concentração na produção de petróleo no pré-sal.

A especialista admitiu que alguns negócios não fazem sentido, como operar gasodutos e campos terrestre, mas criticou a venda de ativos lucrativos como a BR Distribuidora e refinarias em mercados estratégicos para reduzir o endividamento.

“Antes a Petrobras buscava fazer tudo. Hoje, estamos no extremo oposto, com a empresa vendendo tudo”, disse. “Não é preciso desmantelar tudo para ser mais eficiente. E se essa estratégia não der certo?”, questionou.

Carolina Nalin e Bruno Rosa – O Globo