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Emissões

Sete empresas de commodities agrícolas podem reduzir emissões de uma Noruega, diz Trase


Globo Rural - 04 nov 2025 - 11:06

Um seleto grupo de sete empresas do setor de commodities tem potencial para reduzir “uma Noruega” em emissões de gases de efeito estufa caso passe a originar suas matérias-primas de áreas sem desmatamento recente. De acordo com uma análise realizada pela plataforma Trase, as empresas JBS, Minerva (atual MBRF), Marfrig, Wilmar, Musim Mas, Royal Golen Eagle e Sinar Mas estiveram expostas, em 2022, a desmatamentos recentes que provocaram a emissão de 144,4 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente, próximo de toda a emissão feita pela Noruega no mesmo ano (155,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente).

Essas emissões ocorreram em áreas onde houve criação de gado no Brasil, produção de óleo de palma na Indonésia e corte de vegetação também na Indonésia em áreas que haviam sido desmatadas de 2019 em diante, e cuja produção provavelmente foi adquirida por essas empresas.

Segundo a Trase, essas empresas correram o risco de estarem expostas a essas emissões por causa dos volumes de matérias-primas que originaram de municípios onde houve desmatamentos nos cinco anos anteriores à compra.

Como não é possível assegurar a origem, em nível de talhão, de 100% da matéria-prima adquirida por cada empresa, a Trase — fundada em 2015 pelo Instituo Ambiental de Estocolmo e pela ONG Global Canopy — analisa a partir de dados públicos as compras feitas pelas empresas em cada município e rastreia a sequência do produto na cadeia até o primeiro país importador da commodity. O levantamento não avaliou as iniciativas das empresas para mitigar seus impactos. Algumas empresas questionaram a metodologia (leia mais abaixo).

Contexto

As emissões relacionadas ao desmatamento dentro da cadeia de fornecimento ao agronegócio é um tema sensível para as empresas brasileiras. No momento, o governo brasileiro está debruçado sobre o Plano Clima, que deverá atribuir a cada setor da economia a quantidade de emissões de carbono que deverão ser mitigadas por cada um. No setor privado do agronegócio, a primeira proposta do governo sofreu forte reação ao incluir as emissões ligadas ao desmatamento nas emissões do setor agropecuário.

As oscilações no desmatamento têm especial impacto nas emissões nacionais. Em 2024, a queda no desmate no país fez com que todas as emissões brasileiras recuassem 16%, como revelou mais cedo o Observatório do Clima.

Emissões do top 7 global

Das sete empresas mencionadas pela Trase, a mais exposta ao desmatamento recente é a Sinar Mas, um conglomerado da Indonésia que produz desde papel e celulose até óleo de palma. Segundo a plataforma, a companhia ficou exposta em 2022 a uma emissão de 35 milhões de toneladas de carbono apenas relacionadas à sua originação de madeira, e mais 13,1 milhões de toneladas de carbono relacionadas à produção de palma e sua originação.

A segunda companhia mais exposta a emissões relacionadas a desmatamentos recentes é o grupo Royal Golden Eagle, também da Indonésia, exposto a 22,1 milhões de toneladas de carbono de emissões oriundas do desmatamento relacionado à palma e a 15,8 milhões de toneladas de carbono de emissões oriundas de desmatamento relacionadas a madeira para papel e celulose.

Em terceiro lugar aparece a brasileira JBS, exposta a emissões de 16,9 milhões de toneladas de carbono relacionadas ao desmatamento de áreas para criação de gado. As também brasileiras Minerva e Marfrig (atual MBRF) aparecem em sexto e sétimo lugar, expostas a emissões de 9,8 milhões de toneladas de carbono e 8,3 milhões de toneladas de carbono, respectivamente.

Para a Trase, os dados revelam como o esforço de poucas companhias pode trazer resultados significativos. A plataforma ressalta que a maior parte dessas empresas já têm compromissos climáticos que as colocam na rota para a redução de seus impactos ambientais. “Esta análise mostra que um punhado de atores podem apresentar benefícios climáticos maiores do que países inteiros”, afirmou André Vasconcelos, líder de engajamento global da Trase, em nota. “É crucial que o setor privado avance em suas ações nesse esforço coletivo para mitigar as mudanças climáticas”, defendeu.

Das sete empresas mencionadas, cinco apresentaram planos de redução de emissões alinhados ao Roadmapdo Setor Agrícola na COP 26 de Glasgow. Além disso, as sete empresas já apresentaram compromissos para acabar com o desmatamento recente em suas cadeias de fornecimento, segundo levantamento realizado pela Trase junto ao último levantamento Forest 500, da Global Canopy.

Posição das empresas

Procurada, a JBS disse que “os dados da Trase apresentam falhas básicas e são enganosos”. A companhia afirmou que a plataforma “atribui responsabilidade de forma equivocada, ao contabilizar todos os eventos de desmatamento dentro dessa área como ligados à JBS — mesmo em fazendas sem qualquer relação comercial conosco”.

Ainda de acordo com a JBS, “a abordagem não leva em consideração o monitoramento socioambiental da JBS e sua política de compra responsável de matéria-prima, que prevê tolerância zero para desmatamento ilegal, trabalho escravo e outras violações socioambientais” (leia o posicionamento completo da JBS e outras empresas no fim da matéria).

A Minerva afirmou à reportagem em nota que “reconhece que a perenidade e sucesso de seu negócio depende da sustentabilidade dos ecossistemas que dão suporte à produção agropecuária”, e ressaltou que tem o compromisso de alcançar emissões líquidas de carbono até 2035.

A companhia disse que tem iniciativas para reduzir as emissões de sua cadeia de fornecimento, e citou o Programa Renove, que estimula os produtores rurais a adotarem uma agropecuária “de baixa emissão de carbono”, a análise de conformidade que realiza junto aos seus fornecedores diretos de gado e iniciativas de rastreabilidade e monitoramento de fornecedores indiretos (leia o posicionamento completo da Minerva e outras empresas no fim da matéria).

Já a MBRF (ex-Marfrig) afirmou que “considera metodologicamente incorreto afirmar que a empresa estaria exposta aos níveis de emissões sugeridos”. A empresa afirmou que suas metas de redução de emissões “estão sendo recalculadas para nova submissão em breve” por causa da nova metodologia de Florestas, Terra e Agricultura (FLAG, na sigla em inglês), da Science-Based Target iniciative (SBTi), que foi lançada em 2022 e atualizada em dezembro de 2023, e por causa da fusão da Mafrig com a BRF.

A empresa disse ainda que “vem reduzindo emissões por meio da integração produtiva, melhoria genética do rebanho e uso de aditivos”, e que “mantém monitoramento geoespacial e cruzamento de bases públicas, mitigando o risco de originação de animais em áreas desmatadas, sendo uma das poucas com metas de redução aprovadas pela SBTi” (leia o posicionamento completo da MBRF e outras empresas no fim da matéria).

Posicionamentos na íntegra

• JBS
Os dados da Trase apresentam falhas básicas e são enganosos. A abordagem não leva em consideração o monitoramento socioambiental da JBS e sua política de compra responsável de matéria-prima, que prevê tolerância zero para desmatamento ilegal, trabalho escravo e outras violações socioambientais. A Trase também atribui responsabilidade de forma equivocada, ao contabilizar todos os eventos de desmatamento dentro dessa área como ligados à JBS — mesmo em fazendas sem qualquer relação comercial conosco.

• Minerva
A Minerva Foods reconhece que a perenidade e sucesso de seu negócio depende da sustentabilidade dos ecossistemas que dão suporte à produção agropecuária. Em 2021, anunciou seu Compromisso com a Sustentabilidade, com uma série de ações estratégicas para combater as mudanças climáticas, se comprometendo alcançar emissões líquidas zero até 2035.

Um destas iniciativas é o Programa Renove, lançado em 2021, que tem como objetivo estimular a colaboração com parceiros e produtores rurais para promover uma agropecuária sustentável, rentável e de baixa emissão de carbono. O projeto contribui diretamente para a redução das emissões do Escopo 3 e representa um passo importante em nossa transição para uma economia de baixo carbono.

A companhia também possui um programa global de gestão de seus fornecedores por meio do qual realiza uma série de iniciativas, ações e atividades visando a conformidade e transparência de sua cadeia de abastecimento, estando pautado em 3 pilares chaves: fornecedores diretos, fornecedores indiretos e requalificação e reinserção de fornecedores.Toda propriedade fornecedora direta que comercializa gado com a Minerva Foods passa por uma análise de conformidade, em concordância com os critérios socioambientais, política de aquisição de matéria prima e a legislação vigente em cada país de sua operação. A consulta de conformidade do fornecedor e sua propriedade é realizada a cada nova comercialização e, em caso de identificação de alguma irregularidade frente aos critérios, o fornecedor é bloqueado no sistema, impedindo que novas comercializações ocorram até que a situação seja regularizada.

Na frente de fornecedores indiretos, a Companhia vem implementando diferentes iniciativas e práticas relacionadas à rastreabilidade e ao monitoramento socioambiental, como os protocolos, tecnologias e ferramentas, que buscam assegurar a conformidade em toda a cadeia produtiva da pecuária.

Destacamos que todas as nossas emissões de gases de efeito estufa são reportadas anualmente no Relatório de Sustentabilidade, que é elaborado de acordo com metodologias e padrões reconhecidos internacionalmente, bem como os relatórios de auditoria do nosso sistema de monitoramento e política de compra. Esses dados estão disponíveis publicamente em nosso site.

A Minerva Foods reafirma seu comprometimento com a transparência, com a melhoria contínua de seu desempenho ambiental e com a manutenção de um diálogo construtivo sobre esses temas tão relevantes.

• MBRF (ex-Marfrig)
A MBRF considera metodologicamente incorreto afirmar que a empresa estaria exposta aos níveis de emissões sugeridos. A companhia é a única do setor com compromisso de desmatamento e conversão zero em toda a cadeia, com data de corte em 2008, abrangendo fornecedores diretos e indiretos em todos os biomas. A empresa mantém monitoramento geoespacial e cruzamento de bases públicas, mitigando o risco de originação de animais em áreas desmatadas, sendo uma das poucas com metas de redução aprovadas pela SBTi. Com a metodologia FLAG e a formação da MBRF, as metas estão sendo recalculadas para nova submissão em breve. Paralelamente, a companhia vem reduzindo emissões por meio da integração produtiva, melhoria genética do rebanho e uso de aditivos.

Camila Souza Ramos – Globo Rural