Descarbonização de veículo pesado requer conjunto de soluções
Os segmentos de transporte comercial de carga e de passageiros atuam para encontrar as rotas de descarbonização mais adequadas para cada um de seus modais. “Não há apenas uma tecnologia. Existem diferentes soluções possíveis”, diz Carlos Líbera, especialista em transportes pesados da consultoria Bain. Para equalizar custo e desempenho, esses caminhos podem levar à eletrificação ou uso de biocombustíveis, HVO, biogás, biometano, metanol e hidrogênio verde, dependendo do tipo de veículo.
O setor de transportes, incluindo automóveis, responde por 15% das emissões globais de CO2, de acordo com dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC). Desses, 10 pontos percentuais vêm do transporte terrestre. No Brasil, dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG) apontam que, em 2022, os transportes emitiram 216,9 milhões de toneladas de CO2 equivalente, menos de 10% das 2,3 bilhões de toneladas de CO2 lançadas na atmosfera pelo país ao longo do ano.
O professor Marcio D’Agosto, do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que o uso de motores elétricos se presta melhor para o transporte de entregas “last mile” (última milha, ou a entrega final das mercadorias) em grandes centros urbanos. “Ele funciona como gerador e realimenta as baterias. Quanto mais ‘anda e para’ houver, melhor para recarregá-las”, explica. Normalmente, acrescenta, nesse tipo de entrega se roda cerca de 100 km/dia, uma distância possível para os limites atuais de autonomia das baterias. E o recarregamento total pode ser feito à noite.
Para os grandes caminhões, há necessidade de baterias maiores e mais potentes para percorrer grandes distâncias e transportar cargas pesadas e de uma grande infraestrutura de carregamento. Marcel Martin, diretor-geral no Conselho Internacional sobre Transporte Limpo (ICCT), afirma que o grande desafio dos pesados é a recarga. “O carregador tem que ser muito mais tecnológico, para prover mais energia em um tempo de recarga mais otimizado”, diz. Ônibus de longa distância têm os mesmos desafios dos caminhões, mas os elétricos são viáveis no transporte urbano de passageiros.
Segundo Martin, outras opções são biogás, biometano, biodiesel e HVO, o óleo vegetal hidrotratado. Este, além de reduzir as emissões, é “drop in”, ou seja, não requer alterações nos motores - justamente o tipo de solução mais almejado pela aviação e navegação, segmentos que têm mais dificuldades para substituir os combustíveis atuais, por precisarem de grandes quantidades de energia. “O que se imagina é que vão absorver combustíveis renováveis, permitindo que aviões e navios continuem usando as mesmas turbinas e os mesmos motores”, diz D’Agosto.
A Bunker One, comercializadora de bunker, o combustível marítimo, e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) se uniram para testar a viabilidade do uso de biodiesel em embarcações. O produto era composto por 50% de resíduos animais (sebo suíno ou gordura de porco) e 50% de óleo de cozinha usado. A embarcação, um rebocador, foi abastecida com uma mistura que adicionou 7% de biodiesel ao bunker. O resultado mostrou que o motor funcionou normalmente e o consumo foi o mesmo. E houve redução de 2% nas emissões.
“No processo de transição energética, precisamos, primeiramente, buscar as soluções mais acessíveis e mais fáceis. E a adição do biodiesel é uma delas. Não há perda de eficiência”, diz Flavio Ribeiro, CEO da Bunker One. Amanda Gondim, professora de química do petróleo da UFRN, explica que, quanto maior for a adição de biodiesel, maior será a redução das emissões. Além do “drop in”, o setor de navegação também testa o uso de hidrogênio verde.
No transporte aéreo, o combustível de aviação sustentável (SAF) pode ser gerado a partir do HVO, que pode ser utilizado para fazer diesel verde e querosene verde. A KLM informa em seu site que cada voo de Amsterdã é abastecido com uma mistura de combustível que tem 1% de SAF. O objetivo é chegar a 10% até 2030. Segundo a empresa, o SAF é de três a quatro vezes mais caro que o querosene de aviação, por não estar disponível em grande escala.
Cláudio Marques – Valor Econômico