Produção de girassol deve aumentar 42% no Brasil na safra 2022/2023
Há seis anos, o agricultor Nilton Pinheiro, de Piracanjuba (GO), plantou girassol pela primeira vez. Foram 160 hectares na safrinha, depois de colher a soja, atraído pelo valor agregado de uma cultura que tem comprador certo no Estado. E a flor foi ganhando espaço. Neste ano chegou a 1.600 hectares na fazenda de Pinheiro, que planta 5.000 hectares de soja. Na segunda safra, ele também planta milho, mas, no girassol, ele se tornou o maior produtor do país, fornecendo a produção para a fabricação de óleo premium.
“Está valendo a pena. O preço da saca de girassol vem subindo: já foi 60% do pago pela soja, mas empatou neste ano e a empresa antecipa o pagamento da safra”, diz o produtor. A indústria que ele cita é a Caramuru Alimentos, que tem planta de óleo em Itumbiara e oferece aos agricultores contrato antecipado para compra de 100% da produção do grão.
Piracanjuba, onde fica a fazenda de Pinheiro, o município onde mais de produz girassol no Brasil. Goiás tem ainda outros dez entre os 15 maiores do ranking. O estado, nos últimos anos, superou Mato Grosso e assumiu a liderança da produção nacional. Na safra 2021/2022, das 41,1 mil toneladas colheidas, 21,8 mil saíram das lavouras goianas, de acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A área plantada no Estado atingiu cerca de 26 mil hectares, ou 30% a mais que na safra 2020/2021, com produtividade média de 14 sacas por hectare. Na safra 2022/2023, Conab projeta um novo plantio de 26 mil hectares. Mas, com ganho de produtividade, Goiás deve colher 37,4 mil toneladas
Nas projeções iniciais da Conab, a área plantada com girassol no Brasil deve aumentar 2,5% na temporada 2022/2023, e atingir 40,5 mil hectares. A produção deve totalizar 58,5 mil hectares, aumento de 42,3% em comparação com a temporada passada.
“O girassol é mais resistente ao estresse hídrico que o milho devido a sua raiz pivotante. É uma cultura que entrega um resultado satisfatório, com custo de produção menor do que o milho, menos risco e lucro semelhante”, diz Pinheiro. A produtividade da lavoura mecanizada dele, que usa os mesmos equipamentos da soja e milho, atinge 35 sacas por hectare para um custo de produção de cerca de 16 sacas por hectare.
Cristiano Lopes Arantes, agrônomo e produtor de grãos em Itumbiara (GO), também investe no girassol: plantou 250 hectares na safrinha colhida em julho. Além da menor necessidade de água, ele destaca que a cultura tem um ciclo mais curto. “Neste ano, as chuvas foram muito irregulares e uma das culturas que não deu prejuízo foi o girassol. A planta não exige muito adubo NPK e demanda menos custos com herbicidas e fungicidas por ser mais rústica.”
Arantes produziu 22 sacas por hectare na última safra ante a média de 34 sacas de anos anteriores. Sua rentabilidade ficou em 7 sacas por hectare. A produção também foi entregue na Caramuru. “Com o contrato antecipado, eu travo os custos e tenho a segurança para decidir quanto vou investir na lavoura.” Na próxima safrinha, ele planeja aumentar a área de girassol, reduzir o milho e manter a área de painço, grão destinado à alimentação de pássaros.
A agrônoma e agricultora Simone Dameto planta 50 hectares de girassol na safrinha há quatro anos, em terras arrendadas em Bela Vista de Goiás. “Eu e meu marido (Marcílio Torres Filho) decidimos investir na cultura pela sua flexibilidade na janela de plantio na nossa região. O atraso no cultivo da soja compromete os prazos do plantio ideal de safrinha de milho, trazendo o girassol como alternativa não só de melhor prazo, mas também de rotação de culturas.”
Ela conta que, por ser uma cultura dependente de polinização das abelhas, a diferença na biodiversidade local foi grande. Além disso, o girassol tem alta capacidade de descompactação do solo e reciclagem de nutrientes, o que trouxe melhores resultados para a soja, que ela planta no verão. Na lavoura, Simone também usa o mesmo maquinário da soja, só adaptando uma plataforma exclusiva para a colheita. Com uma produtividade média de 30 sacas por hectare, ela tem contrato de venda com a Caramuru.
Área menor que a demanda
Segundo o pesquisador da Embrapa Rondônia Vicente Godinho, que trabalha com cultivo experimental de girassol, as áreas da cultura no país são muito pequenas em relação à demanda. Ele conta que o início do cultivo foi na região Sul, sempre como opção de segunda safra. Passou depois para o Centro-Oeste. Em outros países, o girassol é plantado como safra principal em áreas de restrição hídrica. Ucrânia e Rússia, os países em guerra no leste europeu, são os maiores produtores.
Godinho afirma que, em Mato Grosso, o girassol era cultivado na região de Campo Novo do Parecis, onde produtores criaram uma indústria para oferecer incentivo. O aumento de liquidez do milho, no entanto, devido à exportação, ao uso para fabricação de ração e etanol, além da troca por fertilizantes, derrubou a produção. Além disso, a região se tornou pólo de algodão.
“Hoje, a indústria criada pelos agricultores esmaga algodão, soja e milho e resta por lá praticamente uma só lavoura de girassol que pertence ao principal produtor do grão para alimentação de pássaros do país”, diz Godinho.
A logística e preço do frete são outros impeditivos para um investimento maior no girassol. “Por ser um grão muito leve, de densidade baixa, o frete é muito caro. Chega a três vezes o preço do frete da soja”, estima Godinho.
Renato Amabile, melhorista de girassol e cevada da Embrapa Cerrados, ressalta que o girassol não é, necessariamente resistente à seca. Apenas exige menos água de que outras culturas, como soja e milho. Segundo ele, em função do preço e do consumo interno baixo, nunca houve real incentivo para o plantio. Goiás só lidera a produção por causa da demanda da Caramuru. “Devido ao frete caro, a produção é concentrada nas áreas em que a indústria tem pontos de recebimento.”
Amabile diz que a Embrapa desenvolveu várias cultivares, com destaque para a BRS 323. Mas a maioria usada no Brasil vem da Argentina, terceiro maior produtor mundial. “A BRS 323 foi lançada em 2013, tem alta precocidade e alta produtividade. É o único híbrido com resistência à nematóide, produz entre 90 e 100 dias após o plantio, com um rendimento comercial de 42,5 sacas por hectare. Ela custa 30% mais barato que o material importado, mas nunca teve o aproveitamento adequado.”
O óleo de girassol é considerado um produto premium quando comparado a outros óleos vegetais, pelo seu baixo teor de gordura saturada e sua riqueza em vitamina E. Além de óleo e de alimento para pássaro, o grão é usado em confeitarias para fabricação de pães, bolos e biscoitos e também tem mercado no setor de flores para ornamentação.
Indústria tem que importar
Túlio Ribeiro Silva, coordenador de negócios da Caramuru, diz que a planta de processamento da empresa fundada em 2001, em Itumbiara, a 204 km da capital, Goiânia, tem capacidade para processar 125 mil toneladas de girassol por ano, mas recebe apenas 40 mil toneladas de Goiás, do Triângulo Mineiro e do Vale do Araguaia (MT). Atualmente, na falta do girassol, a indústria usa sua capacidade para processar soja transgênica. “Tentamos importar girassol, mas a conta não fecha.”
Segundo ele, a cultura entrega produtividade, mitigação de risco e rentabilidade, mas ainda enfrenta resistência de produtores tradicionais. A Caramuru tem contrato de compra antecipado com 230 agricultores, com garantia de preço, e, há dois anos, passou a oferecer também assistência técnica para elevar a produtividade. O melhor manejo trouxe um rendimento de campo 60% maior. A partir da próxima safra, o plano é oferecer também as sementes ao produtor.
Célio Garcia, diretor de originação e armazéns gerais da Caramuru, explica que o preço pago ao produtor é definido por uma cesta de fatores, que inclui o valor do óleo de soja na Bolsa de Chicago, os prêmios pagos, a cotação do dólar e a logística. Na última safra, os produtores receberam de R$ 150 a R$ 190 por saca.
A Caramuru comercializa seu óleo de girassol com a marca Sinhá. Tudo fica no mercado interno. O Brasil importa 85 mil das 100 mil toneladas de óleo que consome, especialmente da Argentina, que plantou na última safra 1,6 milhão de hectares e deve aumentar para 2,5 ou 3 milhões no próximo ano.
O girassol representa atualmente apenas 2% do negócio da empresa, que tem unidades em seis Estados e faturou R$ 7,8 bilhões no ano passado. Fundada em 1964, dedica-se à armazenagem, logística e industrialização de grãos (soja, milho, girassol e canola) para a extração e o refino de óleos, além de produzir biodiesel, etanol e lecitina de soja e exportar soja em grãos, farelo, óleo, lecitina e proteína concentrada de soja (SPC).
Eliane Silva – Globo Rural