Com alta do dólar, defasagem no preço da gasolina e do diesel já chega a quase 10%
A forte alta do dólar nos últimos dias — a moeda americana se valorizou 3% frente ao real só este mês, acumulando alta de 12% no ano — ampliou a defasagem do preço da gasolina no Brasil. O valor praticado nas refinarias brasileiras está 9% menor do que no exterior, mostra acompanhamento diário feito pela Abicom, associação que reúne os importadores de combustíveis.
Também no diesel a defasagem de preço é de 9%. Em ambos os casos, a disparidade dos preços brasileiros em relação aos custos no exterior é a maior desde meados de abril.
A Abicom levanta os preços nos principais pólos de produção da Petrobras e também na Acelen, dona da refinaria baiana de Mataripe, que foi privatizada, para fazer uma média do valor nacional. No caso da Acelen, a defasagem atual é menor: 5% na gasolina e 6% no diesel.
Na quarta-feira passada, a Acelen aumentou os preços do diesel e da gasolina. Na Petrobras, o último reajuste foi em 2023.
Em alguns polos da Petrobras, a defasagem é ainda maior. Em Araucária, por exemplo, a diferença entre o preço praticado na refinaria da estatal e o valor do exterior é de 12%.
Reajuste agora é 'muito pouco provável'
Para o analista Flávio Conde, da Levante Investimentos, especializada na orientação de investidores, o atual nível de defasagem nos preços de combustíveis é suportável para a Petrobras. A pressão por aumentos é mais crítica quando a defasagem passar do nível de 20% ou 25% para baixo, nas contas de Conde.
"É muito pouco provável que aconteça qualquer tipo de reajuste, principalmente de diesel ou gasolina", afirmou o analista.
Segundo Conde, o caixa da Petrobras suporta o nível atual de defasagem porque o cálculo feito pela Abicom considera os custos de importação. Há uma margem, favorável à petroleira estatal, entre seu custo de produção no país e o custo de importação, disse o analista.
Além disso, mesmo quando importa, a Petrobras tem conseguido comprar diesel a preços abaixo da referência internacional calculada pela Abicom, especialmente de fornecedores da Rússia, completou Conde.
Alívio no médio prazo
Outro motivo para a cautela da nova gestão comandada por Magda Chambriard em relação a possíveis reajustes é um cenário de médio prazo menos adverso do que o atual. Para Conde, a tendência é de ligeiro alívio nas cotações do barril de petróleo, mais para US$ 75, ante o nível atual, acima de US$ 80.
Uma queda nas cotações do petróleo poderia mitigar a pressão por reajustes por parte das altas sucessivas do dólar, mas, ainda assim, Conde acha improvável que a taxa de câmbio siga subindo sem parar. Na visão do analista, o estresse nas cotações do dólar é um “aviso importante para o governo”, de que os investidores esperam mais clareza sobre o desequilíbrio das contas públicas – e, como reação, o Planalto tenderia a tomar medidas.
Acordo bilionário
Se a alta do dólar poderia colocar a pressão por reajustes de combustíveis no radar de analistas e investidores da Petrobras, as avaliações sobre o acordo bilionário que a estatal firmará com a Receita Federal para encerrar disputas em processos administrativos e ações judiciais sobre a cobrança de tributos seguiram sendo avaliadas positivamente.
A Petrobras anunciou no fim da tarde de segunda-feira que seu Conselho de Administração aprovou o acordo. A petroleira pagará R$ 19,8 bilhões, em parcelas, para encerrar disputas que envolviam a cobrança somada de R$ 44,8 bilhões.
Em relatório, analistas do banco BTG Pactual escreveram que o acordo "elimina definitivamente um peso fiscal para a tese de investimento (nas ações da companhia) sem sacrificar o pagamento de dividendos nos próximos 12 meses”.
Os pagamentos associados ao acordo tirarão R$ 11,87 bilhões do lucro líquido da Petrobras no segundo trimestre, como informou a própria empresa. Por isso, analistas e investidores vinham ressaltando que isso poderia atrapalhar o pagamento de dividendos, umas das formas pelas quais as companhias abertas distribuem o lucro entre acionistas.
Mesmo assim, o relatório do BTG Pactual conclui que “não há razão para acreditar que a nossa projeção de dividendos para os próximos 12 meses mudará significativamente; pelo contrário, o impacto será mínimo”. Isso porque uma parte dos R$ 19,8 bilhões ficará na conta de sócios da Petrobras em campos de petróleo e gás e outra porção poderá ser usada como crédito para quitar outros tributos.
Também em relatório, o banco de investimento americano Goldman Sachs destacou que o acordo tem o ponto positivo de tirar um peso negativo sobre a Petrobras e o lado negativo de trazer riscos de reduzir o pagamento de dividendos no curto prazo – e, assim como o BTG Pactual, manteve a recomendação de compra das ações da petroleira.
Vinicius Neder – O Globo