CEO da Scania aposta em biocombustíveis para descarbonização e vê oportunidade 'de ouro' para o agro
O setor de transportes representa uma parcela significativa das emissões de gases de efeito estufa no Brasil e agrava consideravelmente a crise climática, mas, ao mesmo tempo, é uma enorme oportunidade para um futuro mais verde. O verdadeiro inimigo? O óleo diesel e sua enorme pegada de carbono, destaca Christopher Podgorski, CEO da Scania no Brasil – uma das principais fabricantes de caminhões do mundo.
Atualmente, 90% dos veículos pesados são movidos a óleo diesel, fóssil ou mineral, e apenas 10% a biocombustíveis. "Agora, se você passar a produzir biometano ou biodiesel e substituir a fonte fóssil, o processo se torna renovável e natural. Esse é o grande pulo do gato, e tem uma adesão muito grande no agronegócio brasileiro, que, sem dúvida, é uma força que pode acelerar a descarbonização", disse em entrevista à Exame.
A curto prazo, um estudo encomendado pelo Pacto Global da ONU projeta, até 2040, um cenário de uso de 40% de biocombustíveis, 40% de eletrificados e 20% de hidrogênio no setor. Esta também é a aposta da Scania, que há mais de uma década vem tentando promover a transformação do ecossistema de transporte e logística com soluções mais sustentáveis.
Segundo Christopher, a indústria está embarcando no biometano e no biodiesel, e o primeiro já conta com cerca de 78 projetos em curso no Brasil. Enquanto o biodiesel é produzido a partir de óleos vegetais (como óleo de soja, palma e girassol) e vem da agricultura de oleaginosas, o biometano se origina da degradação de resíduos orgânicos.
"Isso significa que a natureza já o produz naturalmente. A tecnologia é transformar o resíduo ambiental em um ativo energético verde e limpo. Um caso clássico e lindo de circularidade, em que o lixo vira um ativo. Quem trabalha com o agronegócio já percebeu que isso é uma oportunidade de ouro", destacou. É o caso, por exemplo, do setor sucroenergético, que produz açúcar, etanol e energia a partir da cana-de-açúcar. Antes, não havia utilização para esse resíduo, que às vezes voltava para o campo apenas como matéria orgânica, como "um fertilizante medíocre", explicou Christopher.
Embora a companhia possua hoje apenas 1 mil dos seus 30 mil veículos pesados movidos a energia renovável com o uso desses biocombustíveis, Christopher destaca que é possível mudar essa realidade rapidamente e 'amanhã'. Isso depende apenas da demanda, que virá de quem contrata o serviço de transporte – visto que grandes indústrias precisam entregar seus produtos. Este seria o chamado 'Escopo 3' de emissões, que, segundo ele, "muita gente ainda não sabe como enfrentar" e que também está ligado ao custo dessa transição.
"Não será o transportador que adotará uma matriz energética onerosa por ser 'bonzinho' ou 'abraçador de árvores'. Ele tem margens pequenas e precisa estar atento aos seus custos. O óleo diesel tem 120 anos, e há um posto de combustível em cada esquina. É difícil competir. O preço é bastante competitivo", disse.
A longo prazo, a Scania também aposta na eletrificação dos veículos comerciais pesados, algo que acredita chegar com mais força na próxima década. Já o hidrogênio verde é visto como uma alternativa mais distante, sendo que essa energia renovável pode se tornar, antes de mais nada, uma alternativa para outras indústrias – como a siderúrgica. "No transporte, vamos apostar em soluções mais viáveis no momento e com menor custo. Não haverá uma única. Cada operação, em uma determinada região, com uma determinada topografia e infraestrutura, escolherá uma ou outra para descarbonizar", disse Christopher.
Uma das metas da empresa é reduzir a pegada de carbono em 20% de toda a frota já entregue nos últimos 40 anos. Para isso, será necessário utilizar inovações em engenharia, conectividade e geração de dados, visando melhorar a eficiência da produção. O foco, agora, é ajudar mais empresas a se descarbonizarem no Escopo 3.
Pensando nisso, a Scania lançou, durante um evento do Pacto Global da ONU em Nova York, um Hub de Biocombustíveis. O ecossistema reúne 70 empresas que podem responder questões sobre a transformação da indústria e prover soluções para as 1.900 empresas que fazem parte do Pacto.
"É um hub de conhecimento, inovação, fechamento de lacunas e respostas. Hoje, todos querem uma solução pronta, mas estamos construindo um novo mundo, e isto será feito em parceria. Sozinhos, não chegaremos a lugar nenhum. Posso fazer o melhor caminhão do mundo, que pode utilizar qualquer biocombustível ou eletricidade limpa. Mas faltam uma série de outras coisas, como infraestrutura", reiterou.
Segundo o executivo, em um primeiro momento, o foco será no setor de transporte e logística, mas depois será ampliado para todos que precisam entender e mitigar o impacto de seus produtos no meio ambiente após a entrega. "Por que não seguir esse caminho? Estou bastante entusiasmado", finalizou.
Sofia Schuck – Exame