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Biodiesel

Petrobras almeja 5o lugar entre as grandes de energia


Valor Econômico - 13 ago 2008 - 05:28 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:07

Criada pelo Estado brasileiro sem possuir nenhuma reserva de petróleo ou instalação de refino — ao contrário de estatais do setor em outros países, nacionalizadas quando já detinham reservas descobertas por outras empresas —, a Petrobras, que completa 55 anos em outubro, conseguiu mesmo assim virar uma gigante de classe mundial. Almir Barbassa, diretor-financeiro da companhia, gosta de dizer que ela é “movida pelo desafio e nascida fora da pujança”.

A estatal recebeu ontem o prêmio de Empresa de Valor 2008, a campeã entre as campeãs setoriais do anuário “Valor 1000”. Campeã do setor petróleo e gás pelo desempenho financeiro em 2007, foi escolhida Empresa de Valor 2008 por qualidades que vão além dos dados de balanço. A Empresa de Valor deve ter boa governança corporativa, ser transparente com acionistas e público em geral, inovar e dar atenção aos compromissos sociais e ambientais. A escolha é feita pela direção do jornal e por especialistas que acompanham a aplicação dos critérios do anuário.

As dificuldades enfrentadas no passado, quando teve que percorrer um longo caminho rumo ao mar para aumentar sua produção de petróleo, são hoje motivo de orgulho da companhia petrolífera. O valor de mercado da Petrobras atingiu quase US$ 300 bilhões em maio (equivalente a R$ 457,4 milhões), quando a empresa ultrapassou a Microsoft em valor de mercado, ficando atrás apenas da ExxonMobil e da General Electric na lista das maiores empresas das Américas. Foi o ápice da valorização desde a divulgação do imenso potencial das descobertas na camada do pré-sal brasileiro.

Com a queda generalizada no mercado de ações, verificada a partir de junho, o valor de mercado da companhia baixou para R$ 332 milhões. Mas o lucro de R$ 8,8 bilhões alcançado apenas no segundo trimestre, divulgado esta semana, mostrou que a estatal brasileira já é a empresa de capital aberto mais lucrativa das Américas.

Nada mal para uma companhia que em 1999 precisou montar sofisticados “project finances” para bancar o desenvolvimento da produção de alguns campos gigantes, como Marlim e Albacora, na bacia de Campos. Na época, o petróleo no mercado internacional estava em US$ 11 e a disponibilidade de caixa não era a de hoje.

Protegida por monopólio estatal até 1997, a empresa soube tirar proveito do ambiente de mercado que passou a existir desde então para crescer muito mais e até para se manter virtualmente monopolista. O economista Adriano Pires define a presença da estatal como algo além do monopólio. “É um monopsônio. Ela é a única que produz petróleo, a única que produz gás e derivados, a única que importa, além de ser dona de todos os gasodutos”, resume Pires.

No ano passado a companhia cresceu 171% e, diante das novas descobertas, o horizonte é todo azul. Azul petróleo, resultado de uma estratégia que tem se mostrado acertada até agora, mas que é difícil de administrar: sob o braço pesado do Estado e seus objetivos estratégicos, agir como uma empresa orientada para o mercado.

No ranking mundial das petroleiras, a Petrobras ocupa hoje a 15a posição entre as maiores reservas provadas de petróleo do mundo, excluindo o gás e Líquido de Gás Natural (LGN). Segundo o ranking “BP Statistical Review of World Energy”, o Brasil (a Petrobras tem quase 100% das reservas encontradas no país) contabilizava 12,6 bilhões de barris de petróleo em reservas no ano passado. Já superou, por exemplo, o México, grande exportador, que registrava em 2007 reservas de 12,2 bilhões de barris de óleo, ocupando o lugar 12o.

Consideradas apenas as empresas com ações em bolsa — o que exclui as estatais da Arábia Saudita, Irã e Venezuela — a Petrobras ocupa a sexta posição entre as maiores reservas provadas, atrás apenas da Exxon, PetroChina, Lukoil (Rússia), BP e Shell. Sua produção também é crescente. Atualmente são 2,4 milhões de barris de petróleo e gás no Brasil e exterior, volume que deve aumentar para 3 milhões de barris dentro de dois anos, ainda sem contar as reservas do pólo de Tupi, na bacia de Santos, que não tiveram a comercialidade declarada. Ali, a estatal é sócia de quase uma dezena de empresas, mas controla, como operadora, cerca de 80% das reservas licitadas.

Com as descobertas no chamado pólo da bacia de Santos, onde estão os reservatórios de Tupi, Júpiter, Caramba, Bem-te-vi, Carioca, Parati, Guará e Iara, a Petrobras prepara-se para enfrentar seu maior desafio, que é transformarse na quinta maior empresa integrada de energia do mundo até 2020. Para isso ela planeja não só aumentar a produção de petróleo e gás como produzir mais biodiesel e aumentar quase dez vezes as exportações de álcool. Grande geradora de energia elétrica por meio de suas térmicas a gás, a Petrobras começou a estudar a produção de energia elétrica aproveitando o gás do campo de Tupi. Se essa alternativa for viável — dada a distância de 300 quilômetros — a energia poderá ser enviada para o continente através de sistemas de transmissão submarinos.

“A Petrobras vive o início de uma nova era de descobertas, novo refino, novo gás e novos biocombustíveis e esse cenário que vivemos amplia ainda mais as chances de alcançarmos o objetivo de ser a quinta maior empresa integrada de energia do mundo”, comemora o presidente da empresa, José Sergio Gabrielli.

Almir Barbassa, o diretor-financeiro da estatal, diz não saber qual o tamanho do investimento necessário para concretizar os projetos do pré-sal, mas afirma que isso não será problema. “Não tenho o número, mas estou confortável pela capacidade de geração de caixa que foi construída nos últimos anos, sem saber dessa grande descoberta. A Petrobras é uma das poucas no mundo que estão conseguindo aumentar produção e reservas. Portanto, temos uma capacidade importante de geração de caixa crescente no futuro. Além disso, não precisamos de dinheiro para o desenvolvimento do pré-sal no ano que vem ou em 2010. O grande investimento começa em 2012 e até lá teremos tempo para nos preparar e até esperar a melhora do mercado financeiro, que está horrível nesse momento.”

Mesmo sem os novos campos do pré-sal, a Petrobras poderia garantir a atual produção durante quase 15 anos ininterruptos. É uma situação confortável quando comparada com outras companhias internacionais, que enfrentam o declínio da produção de seus campos sem ter acesso a novas reservas, que estão em locais mais difíceis de procurar ou se encontram em regiões com alto risco político.

As descobertas do pré-sal significam, para a Petrobras, o mesmo que a bacia de Campos na década de 70, com uma diferença: o ritmo em que o óleo vai ser retirado. Se a companhia levou 20 anos para alcançar o desenvolvimento pleno da bacia de Campos, na bacia de Santos ela pretende ser mais rápida na próxima década.

Barbassa conta que já teve contato com 12 grandes empresas de crédito para exportação, que estão prontas para financiar os projetos da bacia de Santos. “Vamos comprar muita coisa fora”, adianta o diretor. “Estamos trabalhando sistemas próprios e mais flexíveis de financiamento para a empresa.” A idéia é substituir projetos amarrados item a item, ou projeto a projeto, fazendo os chamados “untied loans” (empréstimos não-vinculados), o que vai facilitar o ritmo de compras da companhia.

Os tentáculos da Petrobras se estendem por 19 países e quatro continentes. Ela opera na Africa, América, Europa e Ásia. A lista de países onde a empresa explora e produz petróleo e gás inclui Estados Unidos, México, Angola, Nigéria, Tanzânia, Moçambique, Senegal, Índia, Portugal, Irã, Paquistão, Líbia, Turquia, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela e Argentina. Também refina petróleo na Argentina, EUA e Japão. Na área de distribuição de combustíveis, tem presença no Uruguai, Paraguai, Colômbia, Argentina e Chile, onde pretende aumentar a participação com a aquisição, por US$ 400 milhões, dos ativos da Esso.

A Petrobras já controla, no Brasil e no exterior, outras 248 empresas, das quais 151 diretamente. Tem71.121 empregados contratados diretamente e 221.566 terceirizados. Ou seja, emprega quase uma cidade do porte de Vitória, capital do Espírito Santo (314 mil habitantes em 2007).

É no Brasil, contudo, que ela tem presença forte e estratégica. A Petrobras possui 11 refinarias no país, uma delas tendo a Repsol como sócia, e planeja construir outras quatro plantas, orçadas em US$ 43 bilhões. Com a recente aquisição de parte dos ativos da Ipiranga, a BR Distribuidora terá um naco de 38,3% do mercado brasileiro de combustíveis. No gás, ela é absolutamente dominante. É dona de uma malha de gasodutos de 23.142 quilômetros , incluindo o Gasbol, e tem outros 5 mil quilômetros em construção.

No rastro da entrada do gás natural na matriz energética brasileira, a companhia estendeu sua atuação para a geração de energia elétrica. Hoje, tem 16 termelétricas com capacidade de gerar 6.183 megawatts (MW) de energia. No plano estratégico para até 2020, a companhia estuda aumentar sua geração para 16.412 MW.

Toda essa trajetória de sucesso não tem livrado a empresa de críticas, por conta da interferência do governo na formação de preço e por ser tratada algumas vezes como “o melhor cartão de crédito do governo”, como a definiu certa vez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar da interferência, ela conseguiu tornar-se uma gigante. Detém tecnologia para explorar petróleo a 3 mil metros abaixo do nível do mar e prepara-se para o maior desafio entre todos os enfrentados até omomento: produzir petróleo no campo de Tupi, ao lado de onde foram descobertos ao todo oito reservatórios.

Cláudia Schüffner, do Rio de Janeiro