G20 gastou US$ 1,4 tri com apoio a combustíveis fósseis em 2022
A crise dos preços da energia de 2022 alavancou o apoio financeiro de governos das maiores economias do mundo aos combustíveis fósseis, mostra um estudo publicado esta semana por um grupo de organizações internacionais, entre elas o brasileiro Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
De acordo com o levantamento, os governos do G20 foram rápidos em amortecer os efeitos do pico dos preços dos combustíveis fósseis e reforçar o fornecimento de energia, com US$ 1,4 trilhão.
Foram US$ 1 trilhão em subsídios, US$ 322 bilhões em investimentos de empresas estatais e mais US$ 50 bilhões em empréstimos de instituições financeiras públicas.
No relatório Fanning the Flames: G20 fornece apoio financeiro recorde para combustíveis fósseis (.pdf), os pesquisadores mostram que o valor equivale a mais do que o dobro do investimento feito antes da pandemia de covid-19 e da crise energética de 2019 – indo na contramão das necessidades climáticas.
No Brasil, os subsídios fósseis alcançaram R$ 118,2 bilhões em 2021, próximo ao registrado no ano anterior, e a previsão para 2022 é de um valor ainda maior, reflexo da decisão do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro de zerar as cobranças de PIS/Cofins sobre os combustíveis para tentar reduzir preços em meio à corrida eleitoral.
Criado em 1999, o G20 é composto por 19 países (Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, França, Alemanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão, Coreia do Sul, México, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos) e a União Europeia.
“Este apoio perpetua a dependência mundial dos combustíveis fósseis, abrindo caminho para ainda mais crises energéticas devido à volatilidade do mercado e aos riscos de segurança geopolítica”, dizem os autores.
Na visão do grupo, a insistência nessas fontes como solução energética limita severamente as possibilidades de alcançar os objetivos climáticos do Acordo de Paris, por dois motivos: aumento de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e prejuízos à competitividade em termos de custos da energia limpa.
“Será necessário manter preços dos combustíveis fósseis que reflitam o custo que eles impõem à sociedade para reduzir sua utilização”, defendem.
Imposto sobre o carbono
Uma das recomendações é que os governos do G20 parem de direcionar os recursos públicos para petróleo, gás e carvão – com metas até 2025 (para os ricos) e 2030 (emergentes) – e, em vez disso, forneçam apoio sustentável à proteção social e expansão da energia limpa.
Um exemplo positivo vem da Índia. O país do sul da Ásia conseguiu reduzir em 76% os subsídios fósseis desde 2014, ao mesmo tempo em que passou a investir em renováveis.
Pelos cálculos do relatório, além de ganhar US$ 1,4 trilhão com a retirada dos benefícios fiscais dos fósseis, os países do G20 poderiam arrecadar mais US$ 1 trilhão com um imposto sobre o carbono, cobrando entre US$ 25 a US$ 50 para cada tonelada de CO2 emitida na atmosfera.
COP28 e transição justa
Faltando três meses e uma semana para a COP28, as 20 maiores economias do mundo ainda não conseguiram chegar a um consenso sobre a participação de combustíveis fósseis na matriz ou o papel de cada uma delas na transição justa.
No final de julho, os ministros de Energia do G20 encerraram um encontro em Goa, na Índia, dando indícios de quão difícil será chegar à cúpula climática da ONU, em novembro, com um acordo forte o suficiente para cortar emissões e limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C até o final do século.
A expectativa era que o encontro de julho estabelecesse algumas bases para a COP28 sediada em Dubai, nos Emirados Árabes, e presidida por um CEO do petróleo.
Mas as divergências persistem, especialmente, quando o assunto é assumir os custos de descarbonizar a economia – e enquanto isso o mundo vai ficando 1,2°C mais quente.
Esta semana, os holofotes estão voltados para a cúpula do Brics, grupo composto por cinco membros do G20 – o Brasil assume a presidência do bloco ainda neste ano. Em pauta: a transição, a industrialização de economias do Sul e o financiamento prometido pelos países ricos.
“É muito difícil combater a mudança do clima enquanto tantos países em desenvolvimento ainda lidam com a fome, a pobreza e outras violências. O princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, mantém sua atualidade”, discursou o presidente Lula (PT) em Joanesburgo, nesta quarta (23/8).
A maior cidade da África do Sul sedia o primeiro encontro presencial dos Brics desde a pandemia de covid-19.
Lula tem repetido em seus discursos que os grandes responsáveis pelas emissões de carbono e, consequentemente, a crise climática, são as nações industrializadas, que historicamente fizeram dos países africanos e sulamericanos suas colônias extrativistas.
“Eles têm uma dívida histórica com o planeta Terra e com a humanidade. Precisamos valorizar o Acordo de Paris e a Convenção do Clima, em vez de terceirizar as responsabilidades climáticas para o Sul Global”, defendeu o presidente brasileiro.
Nayara Machado – epbr