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MDA muda a história e altera dados da inclusão social


BiodieselBR.com - 05 set 2011 - 19:09 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:17

De maneira silenciosa o Ministério do Desenvolvimento Agrário alterou dados históricos referentes ao número de agricultores familiares beneficiados pelo Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB). A “correção” não chamaria atenção se não fosse por três grandes agravantes: a alteração foi significativa, foi realizada sem qualquer publicidade e ocorreu em dados que compunham justamente uma antiga crítica a atuação do MDA.


Até há pouco tempo, a informação oficial do ministério era que 63.595 famílias de agricultores haviam produzido matéria-prima para o PNPB no ano de 2006 – o próprio MDA encaminhou o dado à BiodieselBR por ocasião da elaboração do Anuário da Indústria do Biodiesel de 2004-2009. Agora, um arquivo PDF disponível no website do ministério intitulado Balanço do Selo Combustível Social revela que o número de famílias caiu para 40.595.

O ministério excluiu sumariamente 23 mil agricultores familiares das contas dos beneficiados pelo Selo Combustível Social em 2006, sem dar nenhum aviso ou deixar uma nota de rodapé. A impressão é que esse desaparecimento de agricultores era para passar despercebido do público. O motivo para isso já pode ter sido apontado.

O MDA nunca gostou muito de comentar sobre os números dos agricultores familiares envolvidos com o programa de biodiesel. Havia um certo constrangimento no fato da inclusão social do biodiesel ter andado de ré em 2007 e 2008. Em apresentações, o MDA não mostrava os números anteriores a 2008, pois estes exibiam uma enorme queda na participação de agricultores e os números de 2009 ainda eram menores que os de 2006. Foi só a partir de 2009, com a consolidação da presença da Petrobras Biocombustível, que os números da inclusão social do programa de biodiesel voltaram a crescer (mais informações sobre esse constrangimento no texto “Os dados que o MDA omitiu de você”).

MDA errando?
Questionada sobre essa situação, a assessoria de imprensa do MDA apresenta alguns motivos para tentar explicar a mudança. Um deles é que foram excluídas “famílias que participaram com sua DAP inválida ou expirada naqueles anos”. Ou seja, o ministério não verificou a DAP dos agricultores em 2006, e, ao que parece, veio fazer isso apenas em 2011.

Outro erro básico foi cometido, agora na forma como as cooperativas de agricultores familiares eram computadas. Antes, se uma cooperativa tinha 1000 famílias, todas elas entravam na estatística, mesmo que apenas um agricultor dessa cooperativa realmente produzisse oleaginosas para uma usina de biodiesel. A partir do novo sistema, apenas o agricultor que produziu para uma usina passou a contar nas estatísticas.

Outra explicação foi a adoção de uma nova metodologia estabelecendo que só pode estar incluído no PNPB famílias que se enquadram em todos os três critérios abaixo:
- foram contratadas pela usina dentro das regras da atual Instrução Normativa (IN)
- receberam assistência técnica dentro das regras da atual IN
- venderam sua produção para as usinas

O MDA dá a entender que aplicou as novas regras da instrução normativa retroativamente e qualquer família fora desses três critérios foi excluída dos números. Isso abre a possibilidade para novas revisões nos dados históricos quando sair uma nova IN.

O problema com os números de 2006, segundo o coordenador Marco Antonio Viana Leite, aconteceu porque, ao enviarem suas informações ao MDA, as usinas contabilizavam famílias que não se encaixavam nos três critérios. “Estavam sendo contabilizadas várias famílias que atenderam a apenas dois ou um dos três critérios descritos anteriormente, e, portanto, que não se caracterizariam como beneficiárias efetivas”, explica. No entanto o servidor do MDA não fala se, por conta dessa revisão, alguma usina acabou descumprindo o mínimo necessário de aquisição de matéria-prima para manter o selo social. Aliás, a participação de cada usina no programa social do governo é outro tema arisco para o MDA.

Coincidência
Uma coincidência interessante nessa “revisão” é o número de agricultores que deixaram de fazer parte do quadro de incluídos. Foram exatamente 23.000 famílias, nem uma família a mais e nem uma a menos. 

De acordo com o ministério, os erros só foram percebidos quando as ferramentas usadas para fazer o monitoramento dos resultados do selo foram aprimoradas. De 2005 a 2007, eram usados arquivos padronizados de Excel para fazer as contas. Em 2008, os arquivos foram substituídos por um banco de dados relativamente simples, até que, no ano passado, o acompanhamento começou a ser feito pelo atual sistema, que permite às cooperativas e usinas enviarem suas informações online para o ministério. 

O estranho é que as alterações ocorreram com intensidade apenas no ano de 2006, apesar dos anos de 2005 e 2007 também ter sido computados através de planilhas do Excel. Em 2005 a redução foi de 80 famílias, o equivalente a 0,5%, já em 2006 a redução foi de 36% e em 2007 nenhum agricultor foi excluído. Nas palavras do coordenador, os erros se concentraram em 2006 porque houve um aumento significativo no número de usinas detentoras do selo e os primeiros arranjos comerciais entre usinas detentoras do selo o cooperativas datam desse ano. Isso levou a um grau de inconformidade maior nos dados. 

Mas uma verificação feita por BiodieselBR indica que o aumento significativo não aconteceu em 2006, mas sim em em 2007. Em 2007 18 usinas receberam o Selo Combustível Social, enquanto em 2006 foram apenas seis.

Embora o MDA tenha tentado explicar o que aconteceu, a história ainda não está clara. Falta saber, por exemplo, como algo tão grande pode passar bem debaixo do nariz do MDA, quando foi que o ministério percebeu o erro, se houve alguma conseqüência para as usinas que inflaram indevidamente as estatísticas e se os servidores que não fizeram direito o serviço de verificação dos dados continuam fazendo o mesmo trabalho. Mas o mais curioso mesmo é que a alteração tenha sido feita praticamente na surdina e somente os dados de 2006 sofreram mudança significativa.

Viana Leite reconhece que não foi publicada nenhuma nota técnica sobre o assunto, “por entender que a correção metodológica faz parte de um processo de aperfeiçoamento na ferramenta de monitoria que é dinâmica”. Ou seja, pela explicação do servidor quando as novas regras do selo social entrarem em vigor, todos os números anteriores podem mudar novamente com a aplicação das regras de forma retroativa. Quem sabe ano que vem não venhamos a descobrir que 2010 incluiu apenas a metade dos agricultores que o MDA está divulgando hoje.

Julio Cesar Vedana e Fábio Rodrigues - BiodieselBR.com