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Soja

Custo para fazer pasto degradado virar soja passa de R$ 480 bilhões


Globo Rural - 10 jun 2025 - 09:29

A conversão de todas as pastagens degradadas existentes no Brasil com aptidão para a agricultura demandará um investimento de R$ 482,6 bilhões caso sejam todas transformadas em lavouras de soja, de acordo com um estudo feito pelo Itaú BBA.

O montante equivale a um Plano Safra inteiro, que financia toda a produção agropecuária do Brasil em um ano. Embora a perspectiva não seja de empenhar esses recursos em apenas um ano, o cálculo dá a dimensão do desafio para aumentar a produção agrícola sem derrubar vegetação nativa.

“Seria uma enorme oportunidade para o agro capitalizar em cima de uma demanda [por grãos] que vai crescer, produzindo com sustentabilidade e evitando uma emissão colossal de carbono, usando o próprio território”, afirmou Cesar de Castro Alves, gerente de consultoria agro do Itaú BBA.

O cálculo considerou levantamento da Embrapa segundo o qualhá 28 milhões de hectares de pastos com degradação intermediária a severa no país, mas com potencial para serem transformados em cultivos agrícolas.

A conclusão baseou-se na experiência do Itaú BBA no Programa Reverte, de financiamento para conversão de pastagens no Cerrado, que o banco opera em conjunto com a Syngenta e a organização The Nature Conservancy (TNC).

Segundo o banco, para a conversão de pastos com degradação intermediária, o custo médio tem sido de R$ 16.904 o hectare, enquanto para a conversão de pastos com degradação severa, o custo fica em R$ 17.784 o hectare.

A diferença deve-se à necessidade de aplicação de cal e adubação em pastos mais degradados, além de essas áreas exigirem mais manejo do solo. Se todos os produtores já tivessem as máquinas e os equipamentos — como pá, motoniveladora, subsolador, escarificador e grade —, o custo cairia a R$ 188,7 bilhões.

Os custos bilionários conseguem se pagar com o tempo, mas não no curto prazo. O motivo é que, nas primeiras safras, a fertilidade do solo ainda é prejudicada, e os índices de produtividade no início tendem a ser menores.

No exercício do Itaú BBA, a produtividade agrícola da soja e do milho tendem a alcançar seu potencial após cinco safras. A taxa interna de retorno (TIR) média estimada de projetos de conversão de pastos é de 8% em dez anos.

O estudo parte da premissa de que todo produtor implantaria a lavoura de grãos logo ao fazer o primeiro manejo de solo, mas nem sempre este é o caso. “Muitas vezes o produtor prefere começar [converter] um ano antes, plantar braquiária nesse período para fazer palhada e só no ano seguinte planta soja”, observa Alves. Segundo Francisco Queiroz, analista da consultoria agro do banco, geralmente o produtor que produz em terra própria prefere trabalhar desta forma, enquanto quem arrenda terra de outros preferem converter o pasto em maio para, em setembro, já plantar soja, ainda que no começo ela tenha uma produtividade menor, para garantir fluxo de caixa.

Ainda que os retornos demorem, o produtor pode ter um ganho patrimonial que não aparece imediatamente: a valorização da terra. Nos cálculos do banco, se todos os 28 milhões de hectares de pastos degradados no Brasil fossem convertidos para soja, as fazendas teriam uma valorização quase trilionária, de R$ 904 bilhões. Na média nacional, terras com lavoura valem 2,4 vezes o preço de terras de pastagem.

O avanço dos grãos sobre esses 28 milhões de hectares evitaria a devastação dessa área de mata nativa — o que, no cálculo do Itaú BBA, pouparia a emissão de 3,5 bilhões de toneladas de carbono.

A conversão dessas áreas também teria também um impacto relevante na oferta de grãos. O banco estima que o Brasil pode ganhar 104,7 milhões de toneladas a mais de produção de soja — o que equivale a duas produções de Mato Grosso. No caso do milho, que seria plantado na safrinha, a produção adicional chegaria a 52,8 milhões de toneladas.

O Itaú BBA trabalhou com a premissa de que todas as pastagens degradadas seriam transformadas em lavouras de grãos, mas o próprio banco observa que a conversão de pastos pode se dar também para outros tipos de cultivos.

Para Julia Mangueira, diretora de conservação para o Cerrado da TNC, é importante que haja diversificação na produção implantada sobre os pastos degradados, como em pecuária intensiva, sistemas de integração, recuperação de vegetação nativa e outros cultivos. “A diversificação melhora a infiltração de água nos solos e aumenta a resiliência às mudanças climáticas.” Para isso, os instrumentos financeiros precisam estar adaptados a outros perfis financeiros, diz.

Os produtores hoje já convertem pastos para agricultura, a uma taxa média de 1,5 milhão de hectares transformados todo ano, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab). Sem incentivos, esse ritmo levaria o Brasil a converter todos os seus pastos degradados daqui 18 anos.

Para acelerar essa transformação, o governo vem implementando um programa de conversão de pastagens, rebatizado de Caminho Verde Brasil, que está em fase de estruturação de financiamento.

Para Alves, o maior desafio para efetivar a conversão dos pastos hoje é o custo financeiro, dado o alto nível da Selic. No leilão do Ecoinvest que está em andamento para apoiar o programa Caminho Verde Brasil, o governo estima que as taxas ficarão na casa de um dígito.

Outro desafio é a necessidade de monitoramento das áreas, para garantir que não voltem a se degradar. Além disso, Alves ressalta que é preciso garantir assistência aos produtores, já que muitas vezes os pastos degradados estão na mão de pecuaristas, que não têm o mesmo conhecimento dos agricultores sobre lavouras.

Camila Souza Ramos – Globo Rural