UE apresenta proposta que limita uso de biocombustíveis de 1ª geração
A Comissão Europeia apresentou nessa terça-feira (17) a controversa proposta que pretende estabelecer limites para o consumo de biocombustíveis de 1ª geração – aqueles que são produzidos a partir de commodities agrícolas – pelo setor de transportes europeu. A existência dessa proposta havia sido reportada inicialmente pela agência de notícias Reuters na primeira quinzena de setembro.
Essa proposta vem sendo considerada um recuo em relação à Diretiva de Energias Renováveis (RED, na sigla em inglês) aprovada pela União Europeia (UE) em 2009. A diretiva estabelecia que, até 2020, 10% da energia consumida pelo setor de transportes nos países membros do bloco europeu deveria vir de fontes renováveis.
Para atingir a meta, os países do bloco vêm apostando principalmente na adição de biocombustíveis nos derivados de petróleo. Foi essa estratégia que tornou a Europa o maior mercado global para o biodiesel com um consumo de 12 milhões de toneladas – algo em torno dos 13,5 bilhões de litros – em 2011. A expectativa da indústria europeia de biodiesel era que o consumo em 2020 chegasse a 20 milhões de toneladas.
Obviamente a indústria de biocombustíveis não ficou nada satisfeita alegando que as limitações colocam em risco uma indústria que fatura € 17 bilhões por ano e gera milhares de empregos.
Preocupação ambiental
Os motivos desse passo atrás são as crescentes preocupações em relação à performance ambiental dos biocombustíveis. Em especial os da chamada 1ª geração. Segundo nota publicada a expansão global do mercado de biocombustíveis registrado nos últimos anos tornou claro que nem todos eles cumprem a promessa de reduzir as emissões de gases do efeito estufa (GEEs).
O problema central é a terra necessária para o plantio das matérias-primas usadas na fabricação dos biocombustíveis. Se forem usadas apenas área agrícolas consolidadas, então, o balanço de carbono dos biocombustíveis será favorável – com o CO2 liberado em sua queima sendo reabsorvido pelas lavouras. Contudo, a áreas de florestas preservadas tiverem que ser convertidas em terras agrícolas, a supressão da vegetação original levará a uma liberação tão massiva de GEEs que se encontravam fixados na forma de biomassa que dificilmente poderão ser compensados.
“Estudos científicos recentes mostraram que, tendo em conta as alterações indiretas do uso do solo – por exemplo, quando a produção de biocombustíveis empurra a produção de alimentos ou forragens para terrenos não agrícolas, como florestas –, alguns biocombustíveis podem na verdade contribuir tanto para as emissões de gases com efeito de estufa como os combustíveis fósseis que substituem”, diz a nota oficial emitida pela Comissão Europeia.
Por esse motivo Bruxelas decidiu modificar as regras atuais. Entre as mudanças em estudo está a exigência que os biocombustíveis redução as emissões de gás carbônico em relação às fontes fósseis que substituem em, no mínimo, 60% para novas usinas. Pela atual legislação a redução deve ser de 35% subindo para 50% a partir de 2017. A ideia por trás do aumento desse limite é desincentivar investimentos em tecnologias consideradas pouco eficientes do ponto de vista ambiental.
Os fabricantes obtiveram sucesso parcial ao barrar que esse limite incluísse o polêmico fator ILUC (sigla em inglês para Mudança Indireta no Uso da Terra). Dessa forma os fabricantes não precisarão incluir em seus balanços de carbono as emissões provocadas por outras atividades agrícolas que as culturas energéticas venham a deslocar. Se tivesse sido adotado, o fator ILUC praticamente inviabilizaria o biodiesel feito a partir de diversas matérias-primas como a soja e o óleo de palma.
Contudo, a pressão dos fabricantes não foi o suficiente para evitar a limite de 5% na adição dos biocombustíveis atuais nos combustíveis fósseis. A medida é considerada a de maior impacto por deixar a indústria europeia praticamente estagnada. Atualmente a mistura nos países do bloco gira em torno dos 4,7%.
Por outro lado, a Comissão Europeia pretende criar incentivos ao desenvolvimento comercial dos biocombustíveis de 2ª geração – baseados matérias-primas não comerciais ou em tecnologias capazes de converter biomassa que hoje são considerados resíduos agrícolas. Em tese, esses novos produtos teriam performance ambiental mais favorável.
Alimentos
Os possíveis impactos dos biocombustíveis nos preços das commodities alimentares foram levados em conta na formulação dessa nova proposição.
Embora esses impactos – e seu peso – ainda estejam recobertos de incertezas, recentemente o relator das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, Olivier De Schtter, pediu publicamente que a EU abandonasse os biocombustíveis. “A UE não apenas deveria revisar seus objetivos de incorporação de biocombustíveis para baixo, como também deveria ter a coragem política de abandoná-los”, afirmou à agência internacional de notícias France Press.
"Não estamos, obviamente, excluindo os biocombustíveis de primeira geração, mas enviamos um sinal claro: no futuro, qualquer aumento na utilização de biocombustíveis deve basear-se em biocombustíveis avançados. Qualquer outra opção será insustentável", afirmou a comissária europeia para as Alterações Climáticas, Connie Hedegaard.
A nova legislação ainda precisa passar pelo Parlamento Europeu antes de passar a valer. A expectativa é que a nova proposta não deve entrar em vigor antes de 2014.
Fábio Rodrigues – BiodieselBR.com
Com informações: Agência Lusa, France Press, Euobserver.com, Reuters