[CBBR 2020] Abrindo espaço para o diesel verde
O biodiesel está para deixar de ser a única alternativa renovável ao óleo diesel oficialmente reconhecida pelo mercado brasileiro. Ao longo deste ano, Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) esteve empenhada em definir a especificação do “diesel verde”. O termo abrange os produtos gerados por pelo menos quatro rotas tecnológicas capazes de converter biomassa renovável em hidrocarbonetos que são quimicamente indistinguíveis do diesel comum.
A questão foi a espinha dorsal do sexto painel da Conferência BiodieselBR 2020 chamado “Diesel Verde, Biodiesel e HBio: Semelhanças diferenças e mercados” que contrapôs as visões da Petrobras e da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio) sobre o assunto.
HBio
Embora tenha decidido sair do mercado de biocombustíveis há alguns anos e venha se desfazendo dos ativos da Petrobras Biocombustível (PBio), segundo o gerente geral de Marketing da Petrobras, Sandro Barreto, a petroleira nacional não desistiu de olhar as mudanças climáticas. Foi por isso que a empresa decidiu voltar a investir na tecnologia HBio que permite processar petróleo junto com óleos e gorduras de origem vegetal e/ou animal diretamente nas refinarias e produzir um tipo de diesel que já sai de fábrica com uma parcela renovável. “Olhando para o nosso hardware isso veio pelo coprocessamento”, explica Sandro acrescentando que há alguma confusão em torno da tecnologia.
Enquanto o HBio é um processo patenteado pela Petrobras, o produto que ele gera é chamado diesel RX. Sandro destaca que os biocombustíveis atuais são, tipicamente, produzidos de forma pura em plantas dedicadas e, posteriormente, misturados aos combustíveis de origem fóssil na proporção exigida. Já o HBio faz tudo numa etapa só. “É uma otimização de hardware onde uma refinaria, que tenha folga em seus equipamentos, consegue hidrotratar óleo vegetal em paralelo adicionando apenas um tanque para esse óleo”, diz acrescentando que, embora os testes mais recentes tenham produzido diesel com 5% de carga renovável, seria perfeitamente possível fabricar com percentuais bem maiores.
Para ele, não faz muita diferença em que elo da cadeia é feita a adição de material renovável ao combustível. “É o produto final que interessa a sociedade, o percentual de renováveis dentro do produto é que tem que ser o foco (...) e não se ele vai sair da refinaria já misturado ou se isso vai acontecer só na distribuidora”, destaca.
A tecnologia não é uma exclusividade brasileira. Segundo Sandro, 15% de todo o óleo vegetal hidrotratado (HVO) consumido na Europa é vem de rodas de coprocessamento. O aumento da demanda por produtos com uma intensidade de carbono menor vem elevando a uma folga nas unidades de refino de petróleo o que abre espaço justamente para estratégias de coprocessamento como uma forma de reduzir o nível de investimentos necessários. “A tendência de coprocessar petróleo com biomassa tende a crescer, as refinarias vão passar a ser flex”, resume
Drop-in
Uma diferença importante entre o diesel renovável – indiferente da rota tecnológica usada na sua produção – e o biodiesel é sua maior proximidade química em relação ao diesel de petróleo. Ao contrário do biodiesel, o diesel renovável é considerado um produto drop-in que pode ser usado em qualquer proporção – até puro – em motores diesel não modificados.
“O diesel renovável traz algumas vantagens em relação ao biodiesel (...) especialmente na solubilidade em água. A absorção de água é um problema para o biodiesel”, explica Sandro. “Contaminantes metálicos também podem ser um problema para os catalisadores (...) o que pode gerar alguma limitação do biodiesel”, complementa destacando que não são problemas insolúveis. “As usinas de biodiesel vêm trabalhando nesses pontos”, elogia.
A Petrobras vem defendendo que o diesel verde – e o HBio – sejam admitidos com parte da mistura obrigatória criada pelo Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB). “A posição da Petrobras tem sido de promover a competição entre os dois produtos. Tomando o cuidado de não trazer um problema para a indústria de biodiesel que já está instalada, a competição entre os dois produtos seria benéfica”, explica o gerente da petroleira.
De qualquer forma, a Petrobras não pensa em inundar o mercado com seu diesel RX. “A produção seria marginal porque dependeria das refinarias terem folga em suas unidades de hidrotratamento e hidrogênio disponível”, reconhece.
Coisas diferentes
Por seu lado, o consultor técnico da Ubrabio e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Donato Aranda, acha que há bons motivos para manter os dois produtos separados. Segundo ele, hoje o biodiesel é definido legalmente como um alquil éster um entendimento que é acompanhando em boa parte do mundo.
Embora o diesel verde ainda seja um produto minoritário com uma produção de 6,5 milhões de m³ no ano passado – enquanto o biodiesel teve 47 milhões de m³ – ele vem aumentando sua produção e participação no mercado. Embora seja possível fabricar diesel verde usando diferentes processos produtivos, a rota mais comum é o hidrotratamento de óleos e gorduras que remove oxigênio presente nos lipídios para transformá-los em hidrocarbonetos. “Hoje quase 100% do diesel verde é HVO”, resume.
No entanto, isso gera um impasse importante. A queixa incompleta de diesel é gera uma série de poluentes particularmente nocivos como monóxido de carbono e material particulado. “Isso é muito ruim, por isso [muitos países] adicionam combustível oxigenado (...) com objetivo de reduzir CO e particulados”, diz acrescentando que o biodiesel desempenha bem esse papel enquanto o diese verde não. “O diesel RX da Petrobras não tem oxigenados”, alerta Donato.
“Tem bastante espaço para todos os combustíveis menos poluentes e o Brasil é importador de diesel fóssil”, finaliza Donato.
Fábio Rodrigues – BiodieselBR.com {/viewonly}