Algas: biblioteca viva
Se estivéssemos vendo um filme sobre ciência este seria o cenário ideal: tubos de ensaio com um líquido verde ocupando cada centímetro das paredes.
É uma biblioteca estranha, que guarda seres vivos. E por se tratar de uma colecção de algas, chama-se algoteca. É a maior do país e uma das maiores do mundo, resultado da colheita e análise feita durante 40 anos por Fátima Almeida Santos, bióloga da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC).
A seu lado, Lília Santos, que partilha com Fátima uma devoção por estas algas, juntou-se há alguns anos à investigação verde.
O potencial que descobriram nestes vegetais descreve-se em poucas mas muito claras palavras: "O que temos aqui é a base de partida para qualquer projecto biotecnológico ou industrial", garante Lília Santos. E por ‘qualquer projecto’ entenda-se aplicações que vão dos combustíveis à alimentação.
As algas podem ser, por exemplo, o biocombustível do futuro. "O que se está a pensar neste momento é que o biodiesel que possa ser produzido a partir das microalgas poderá ser mesmo uma alternativa aos combustíveis fósseis nos meios de transporte", talvez daqui a 20 anos, continua Lília Santos.
Números? Há algas com capacidades avassaladoras de reprodução. Algumas conseguem duplicar-se em 24 horas. Outras multiplicam-se por outros processos: "Uma célula pode dar origem a 100 ou 120 células, que, por sua vez, se vão reproduzir na mesma proporção", explica Fátima Almeida Santos. Para o caso da produção de biodiesel, falta encontrar a alga ideal, que produza muito óleo – que poderá ser usado como combustível – e que se reproduza depressa.
As investigadoras desenvolvem estudos nesse sentido com determinadas estirpes, para lhes perceber a evolução.
Mas há algo a distinguir: estas são microalgas, diferentes das algas marinhas. Vêm de rios, de lagos, de solos húmidos, mas também de cascas de árvores, de estátuas, de azulejos, de vitrais.
A algoteca foi, durante muito tempo, um tesouro escondido. Com um potencial destes, como é que as empresas não se interessaram logo pela colecção? «Logo que a algoteca passou a ter alguma visibilidade – não tinha, mesmo dentro da universidade – tivemos imensas solicitações. Sentia-me como se estivesse a dar explicações gratuitas», ri-se Lília Santos.
O problema tem sido a falta de consistência das abordagens empresariais, que provavelmente não arriscam investimentos a longo prazo.
A algoteca debate-se, agora, com problemas de alguma falta de financiamento, mais um dado incompreensível, pois estamos no lar da "matéria-prima do futuro", como a define Lília Santos.
Fonte: SOL