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Paulo Anselmo Ziani Suarez

Sobre combustíveis não especificados


Paulo Suarez - 05 jul 2007 - 16:23 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:23

Desde o início do surgimento de veículos automotores no final do século XIX e, consequentemente, início do mercado de combustíveis líquidos derivados do petróleo, a humanidade tem se deparado com esporádicas crises de abastecimento desses insumos fósseis. Até a década de 1990 essas crises eram estritamente devidas a problemas conjunturais, como as diversas guerras que assolaram o mundo durante o Século XX, a criação da Organização dos Países Produtores de Petróleo, entre outros. A partir da década de 1990, principalmente após a ECO 92, apareceram no cenário mundial problemas estruturais relacionados ao uso de combustíveis fósseis: (i) iminência de problemas de abastecimento de petróleo no curto prazo; e (ii) crescente conscientização da população e dos lideres mundiais a respeito das mudanças climáticas devido ao aumento da concentração de carbono na atmosfera. Durante todas essas crises, cientistas do mundo inteiro apresentaram propostas para diminuir a dependência nos combustíveis fósseis, sendo os exemplos mais bem sucedidos o etanol e o biodiesel.

"Por ainda não estarem especificados pela ANP, todas estas propostas não podem ser usadas comercialmente, sob risco de sofrerem as penas previstas na Lei."


Para uso em motores do Ciclo Otto, por exemplo, o uso de álcool a 70ºGL foi estudado no Brasil ainda na década de 1920, na Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, hoje Instituto Nacional de Tecnologia. Já na década de 1970, o etanol voltou à pauta no Brasil. Após diversos estudos, foi introduzido na nossa matriz energética e regulamentado pelo governo como etanol anidro (teor acima de 99 %) e hidratado (teor de 92 %).

Já para uso em motores do Ciclo Diesel, a mistura de ésteres de ácidos graxos, conhecida hoje popularmente como biodiesel, começou a ser estudada na Europa ainda na década de 1930 e no Brasil a partir da década de 1970. Houve muitas propostas e testes em motores, como uso puro ou na forma de misturas com diferentes percentuais. Finalmente foi regulamentado pela ANP e introduzido na nossa matriz energética, iniciando o uso de misturas com 2 % apenas por razões de garantia de abastecimento, mas com a previsão de usar comercialmente misturas com 5 %.

No entanto, diversas outras propostas têm aparecido. A mais antiga é o uso de óleos ou gorduras diretamente nos motores, sendo o próprio Rudolph Diesel o primeiro a fazer essa proposta, em 1900. Outras propostas como o craqueamento surgiram em diversos países, sendo o exemplo de uso em larga escala a experiência chinesa durante a Segunda Guerra Mundial, quando foram produzidos combustíveis para substituir a gasolina e diesel a partir de óleo de tungue.

Atualmente, existem no Brasil diversas propostas de uso de combustíveis alternativos ainda não especificados. De fato, existem no país testes sendo realizados com misturas de álcool ou óleo vegetal com diesel, uso de óleos puros em motores modificados, craqueamento ou hidrocraqueamento de óleos e gorduras. No entanto, por ainda não estarem especificados pela ANP, todas estas propostas não podem ser usadas comercialmente, sob risco de sofrerem as penas previstas na Lei. 

No entanto, a ANP regulamenta o uso de combustíveis não especificados em frotas cativas por meio da Resolução ANP Nº 19, de 22 de junho de 2007, que substituiu a Portaria ANP nº 240, de 25 de agosto de 2003. Esta resolução permite o uso por um ano de combustíveis não especificados, em programas de estudo de desempenho de motores e controle de emissões com consumo de até 100 mil litros. Esse tipo de programa é fundamental para que se conheça o desempenho dos novos combustíveis em motores, conhecimento este fundamental para que ocorra a liberação para comercialização e uso. Espera-se que, a exemplo do biodiesel e do álcool, diversos combustíveis alternativos consigam, após programas de testes acompanhados pela Resolução ANP 19, sair da fase experimental e chegar ao mercado.

Paulo Anselmo Ziani Suarez é engenheiro químico, colunista BiodieselBR.com, com pós-doutorado pelo National Center for Agricultural Utilization Research dos Estados Unidos. Saiba mais sobre o autor.

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