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Paulo Anselmo Ziani Suarez

Os Biocombustíveis de Segunda Geração


Paulo Suarez - 30 out 2007 - 14:32 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:23

Como já discuti nesta coluna em diversas oportunidades, o uso de biocombustíveis como fonte energética tem entrado em pauta em diversas oportunidades ao longo dos últimos 100 anos. No entanto, foi somente a partir da década de 1970 que eles começaram a ser introduzidos na matriz energética de diversos países. Pode-se dizer que hoje o álcool e o biodiesel, conhecidos como biocombustíveis de primeira geração, são uma realidade e estão presentes em praticamente todos os importantes mercados de combustíveis líquidos.

No entanto, estes combustíveis são derivados de matérias-primas nobres: o álcool deriva de monossacarídeos (açúcares não polimerizados, principalmente a glicose) e o biodiesel de óleos e gorduras, ainda mais nobres e com custo de produção bem mais alto. Por esta razão, especialistas, políticos e a imprensa em geral têm sustentando um caloroso debate a respeito da capacidade do planeta de produzir biocombustíveis a partir dessas matérias-primas nobres sem afetar o abastecimento de alimentos. No caso do biodiesel, o problema é ainda mais grave, pois, como já colocado pelo nosso colunista Univaldo Vedana, “o desafio é encontrar a cana do biodiesel”. Ou seja, apesar de todas as opções já estudadas e propostas, ainda não foi encontrada uma fonte de óleo ou gordura com um bom balanço energético e economicamente viável, como é a cana para a produção de açúcar.
 

"Estes combustíveis [biodiesel e álcool] são derivados de matérias-primas nobres: o álcool deriva de monossacarídeos e o biodiesel de óleos e gorduras."


Por esta razão, existem diversos pesquisadores e empresas no mundo tentando desenvolver processos alternativos para obter biocombustíveis de forma mais eficiente energética e economicamente do que o biodiesel e mesmo do que o álcool. A idéia é utilizar biomassa de baixo valor agregado, como resíduos agro-industriais, sejam eles ricos em óleos e gorduras ou simplesmente em material celulósico. Dentre as alternativas, as mais promissoras estão baseadas nos hidrocarbonetos, que estão sendo chamados de Biocombustíveis de Segunda Geração. No Brasil, pouco tem se falado destes biocombustíveis, ficando a discussão basicamente restrita aos processos H-Bio e Craqueamento, sobre os quais já falei nesta coluna.

Fora do Brasil, no entanto, diversas outras opções tecnológicas estão sendo desenvolvidas, sendo a mais promissora o processo Fischer-Tropsh. Este processo, conhecido desde a década de 1920, consiste em transformar o chamado gás de síntese (mistura dos gases monóxido de carbono e hidrogênio) em hidrocarbonetos. No caso do aproveitamento de biomassa, faz-se inicialmente uma queima parcial, ou seja, na presença de baixa concentração de oxigênio, para produzir o gás de síntese, que é posteriormente transformado em hidrocarbonetos na faixa da gasolina e do diesel.
 

"Estive recentemente em Torku, Finlândia e fiquei surpreso ao encontrar praticamente a metade dos trabalhos voltados para o aproveitamento energético da biomassa."


Estive recentemente em Torku, Finlândia, participando do congresso de catálise Europeu (14º Europacat). Nesse evento, historicamente dominado por trabalhos voltados para transformação de petróleo em combustíveis e insumos petroquímicos, fiquei surpreso ao encontrar praticamente a metade dos trabalhos voltados para o aproveitamento energético da biomassa. Sobre biodiesel, uma meia dúzia de trabalhos estava sendo apresentada, incluindo o meu. Por outro lado, uma quantidade enorme de trabalhos dedicados ao estudo da produção de hidrocarbonetos, sendo alguns usando a rota do craqueamento e muitos a de Fischer-Tropsch.

Mas esse congresso não é um caso isolado: a quantidade de patentes e artigos científicos sobre a rota Fischer-Tropsch tem aumentado drasticamente nos últimos anos. Mais ainda, já existem diversas plantas piloto sendo implementadas em diversos países, principalmente na Europa.  Um importante apelo que esta rota tem é o fato do gás de síntese poder ser produzido a partir de inúmeros insumos. De fato, qualquer biomassa, independente da sua qualidade, ou até mesmo de matérias-primas fósseis, como o gás natural, produzem gás de síntese. O outro é a possibilidade de se obter hidrocarbonetos idênticos aos encontrados no petróleo, sendo o biocombustível muito semelhante aos fósseis.

Evidentemente, não existe ainda especificação para estes biocombustíveis no Brasil, o que impede que hidrocarbonetos produzidos pro Fischer-Tropsch sejam comercializados, conforme já discuti recentemente aqui na coluna. No entanto, acredito fortemente que em um futuro próximo estes combustíveis irão fazer parte da nossa matriz energética, principalmente levando em conta a pressão que grandes corporações mundiais que estão desenvolvendo essas tecnologias irão fazer. Por esta razão, acredito que deveremos imediatamente iniciar a desenvolver pesquisas nessa direção, sob pena de ficarmos completamente dependentes no futuro dessas tecnologias alternativas que possuem enorme potencial para se tornarem mais viáveis energética e economicamente que os nossos biocombustíveis de primeira geração.

Paulo Anselmo Ziani Suarez é engenheiro químico, colunista BiodieselBR.com, com pós-doutorado pelo National Center for Agricultural Utilization Research dos Estados Unidos.
E-mail: psuarez@unb.br 
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