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Biodiesel

RN: Agricultores locais amargam fracasso no plantio de girassol


Tribuna do Norte - 21 set 2008 - 21:11 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:07

Quando foi lançado em fevereiro deste ano, o Programa Estadual de Agroenergia (PARN) tinha o intuito, segundo o governo estadual, de estabelecer um ciclo produtivo de biodiesel e garantir a sustentabilidade financeira dos agricultores familiares, assegurando-lhe o preço mínimo na hora da venda do produto, no caso a semente de girassol. Porém, a redenção econômica e social desses agricultores deve levar mais algum tempo, porque a previsão inicial de se produzir 13 mil quilos de girassol caiu por terra, literalmente: a produção da oleaginosa mal vai chegar a 2.500 quilos e o que poderia ser uma nova fonte de renda no campo, pode se tornar mais uma dor de cabeça para 1.216 agricultores do Rio Grande do Norte.

O planejamento inicial do governo previa ocupar uma mão-de-obra de mais de cinco mil agricultores familiares, somente com a cultura do girassol, sem contar o plantio de algodão, a outra cultura incluída no PARN, que geraria ocupação para mais de sete mil agricultores. Por diversas razões, não se conseguiu plantar os 17.500 hectares zoneados para a cultura do girassol, que só alcançou 32 municípios dos 69 escolhidos para a execução do programa.

Gerente estadual do PARN, Emmanuel Alves da Costa aponta como uma das razões para a quebra de safra do girassol, “o desconhecimento” dos agricultores norte-rio-grandenses em relação ao cultivo da oleaginosa, “por se tratar de uma cultura nova para eles”.

As colocações de Emmanuel da Costa se confirmam no campo, como no assentamento rural Espírito Santo, em Ceará-Mirim, município onde se distribuiu 220 quilos de sementes e se plantou girassol numa área de 35 hectares. Lá, a colheita esperada é de 7.490 quilos da oleaginosa.

Em Ceará-Mirim, o Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado (Emater-RN) chegou a fornecer sementes doadas pela Petrobrás para 11 agricultores. Mas até essa data, nenhum projeto foi elaborado e contratado, nem os agricultores receberam capacitação técnica.

O assentamento Espírito Santo está localizado à margem da BR-406, uns cinco quilômetros depois da saída de Ceará-Mirim para a região do Mato Grande. Francisca Rocha de Araújo, 52 anos, toma conta de um loteamento de um filho, que não pode mais trabalhar porque sofre de uma doença rara, um tipo de hipertrofia muscular que não tem cura e pode levá-lo à morte prematuramente. “Estamos muito perto da colheita e não chegou sacaria nenhuma”, disse ela, que plantou 18 hectares de girassol e apontou outra falha para o projeto:; “Não foi feita a correção do solo”.

Dona Francisca Araújo é uma das líderes do assentamento rural Espírito Santo e também é candidata a vereadora em Ceará-Mirim, mas teme pelo fracasso da cultura de girassol, porque a informação que ela diz é que aqui “não tem usina para processar o óleo”.

Na área de plantação de girassol de dona Francisca Araújo, pode se ver a olho nu que o cultivo do girassol se desenvolveu de forma diferenciada. Ela mostrou que em alguns pontos, onde tinha gado pastando e se criou um adubo natural com o esterco dos animais, a planta cresceu, chegando alguma flor ao tamanho de uma calota de automóvel. Na maior parte da área cultivada, de tão pequena, a flor nem chegou a ter a circunferência de um DVD.

Para o marido dela, Nazareno Elpídio de Araújo, 60 anos, o ideal era que continuasse criando as poucas cabeças de gado que tinha ou plantando cana-de-açúcar, a cultura típica da região do Vale do Ceará-Mirim, “porque tinha garantia de safra e de compra”. Em outra área do assentamento, ele diz que tem um plantio de cajueiro, onde diz ter uma melhor esperança de safra no fim do ano.

Nazareno de Araújo conta que está no assentamento Espírito Santo desde julho de 1998 e que lá a maioria dos assentados não tem como pagar os empréstimos obtidos junto a bancos oficiais. Com relação ao girassol, ele disse que gastou R$ 2.450,00, mas que até agora só tinha recebido as sementes. “Era para receber R$ 120,00 por hectare plantado, mas só recebi R$ 30,00 para a colheita”, reforçou ele.

Aposentadoria é o principal meio de sobrevivência
A aposentadoria rural ainda  é o principal  meio de sobrevivência dos agricultores, inclusive nos assentamentos de reforma agrária como o de Espirito Santo, em Ceará-Mirim. O agricultor Rui Barbosa, 55 anos, disse que ainda recebeu sementes de girassol, mas não chegou a plantar porque achou pouco a área destinada ao plantio: 1 hectare.

Como sobrevive da aposentadoria de um salário mínimo (R$ 415,00), seu Barbosa disse que espera ganhar alguma coisa este ano com o plantio de cajueiro. “Tenho mil pés e a promessa é boa”, otimiza ele, que no ano passado chegou a colher 60 sacas de castanha, em torno de 300 quilos, e que foi vendida a R$ 1,00 o quilo.

Um dos líderes do assentamento Espírito Santo, Manoel da Rocha Sobrinho, não estava em casa na tarde de quarta-feira, dia 17, segundo a sua família, porque tinha ido a Ceará-Mirim “dar entrada na aposentadoria”.

Na casa de seu Manoel Sobrinho estava a mulher e um casal de filhos: Alysson da Rocha Sobrinho disse que antes de plantar girassol, cuja semente ele disse que “chegou atrasado (sic)”, o pai plantava feijão, milho e roça de mandioca. Como era a primeira vez que a família plantava girassol, Alysson disse não saber se ia dar certo a colheita das três mil covas que foram plantadas.

Ao contrário do plantio do assentamento Espírito Santo, o agricultor Antônio Pedro de Lima Júnior cultivou a semente de girassol em uma área cedida pelo seu patrão na fazenda Girassol, no município de Jandaíra, região do Mato Grande. “Tem futuro, se bem tratado é melhor do que milho e feijão”, disse ele, esperançoso por dias melhores.

Antônio Lima disse que iria plantar 12 hectares de girassol, mas como “não houve a limpa” do terreno a tempo, ele só plantou oito hectares. Se tudo for feito  como manda o figurino, ele acredita que “dá para tirar uns 700 quilos de girassol por hectare”.

Cessionário da área da Fazenda Girassol, o juiz aposentado José Carneiro dos Santos Filho, disse que a terra por lá é muito boa e acha que o governo devia estender o programa de agro-energia também para fazendeiros: “O Brasil precisa de biodiesel”.

Programa apresentou problemas
O Programa Estadual de Agro-energia (PARN) é fruto de uma parceria entre a Petrobras, que assegurou a doação das sementes,  e o governo Rio Grande do Norte que disponibilizou  R$ 10 milhões para assegurar a assistência técnica, através da Emater e Emparn, além de garantir o preço mínimo de R$ 1,30 para o algodão e de R$ 0,81 para o girassol. Pelo programa, os agricultores familiares também poderiam dispor de financiamento através do Pronaf para a realização do custeio de suas culturas, que é operacionalizado pelos bancos do Brasil e do Nordeste, bastando que os produtores procurem os escritórios da Emater.

O gerente do PARN, Emmanoel Alves da Costa, disse que “com relação aos gargalos na sua implantação”, deveu-se a alguns fatores, como adversidade climática, desconhecimento da cultura do girassol por parte dos agricultores, além da falta de insumos requeridos pela cultura.

Costa também citou a inexistência no mercado estadual de máquinas e implementos agrícolas “para viabilizar as operações demandadas”, bem como a inadimplência dos agricultores familiares junto aos agentes financeiros e ainda o atraso no lançamento do programa.

No entanto, Costa disse que o programa apresentou “alguns aspectos favoráveis”, como a assistência técnica gratuita prestada pela Emater, a doação de sementes por parte da Petrobras e a garantia de compra da produção, com preço de referência compatível com os custos de produção das culturas de algodão e girassol, que tem um ciclo de germinação de 120 dias entre o plantio e a colheita.

Afora isso tudo, ele acredita que “a boa adaptação”, da cultura das oleaginosas ao solo e clima norte-rio-grandense é alvissareira para o futuro do PARN, já que a média de chuva anual de 500 milímetros na maior parte das regiões do Estado também é favorável a esse tipo de cultura.

O biodiesel é uma denominação genérica para combustíveis derivados de oleaginosas, tais como: mamona, dendê, babaçu, soja, gordura animal etc. A adição e/ou substituição de biodiesel ao diesel de origem fóssil é uma boa alternativa de combustível para o transporte e geração de energia elétrica. Países como a Alemanha, França e Itália já possuem programas bem desenvolvidos para a produção e uso do biodiesel.

No Rio Grande do Norte a Petrobras implantou duas usinas experimentais de biodiesel no pólo petroquímico de Guamaré, com investimentos de 20 milhões.

As duas unidades estão sendo ampliadas para produzirem 20,4 milhões de litros/ano, tendo como insumos a mamona (agricultura familiar) e soja (agronegócio).

Valdir Julião