Itaú BBA diz que safra 2025/26 ainda é período de “ressaca”
O cenário de juros alto, taxações elevadas e alta nos preços dos fertilizantes, por conta da guerra entre Irã e Israel, deve manter o agronegócio atento e cauteloso, postura que este mercado vem adotando nos últimos dois anos. “A ressaca dos últimos dois anos não terminou. Não conseguimos ver melhora para o próximo ano em todos os elos na cadeia”, disse Cesar de Castro Alves, gerente da consultoria agro do banco.
Na manhã desta quarta (3), a equipe de analistas de mercado e economistas do Itaú BBA mostrou o que espera para o setor do agro no ciclo 2025/26. Pela terceira safra consecutiva, o banco destaca o impacto das turbulências econômicas e da geopolítica global na produção de grãos e proteínas. As expectativas mais otimistas devem ficar na conta dos biocombustíveis.
Ressaca, segundo Alves, se refere ao período que vem se arrastando desde 2022, com os valores de grãos recuando, especialmente após o pico de preços nos anos 2021 e 2022, em decorrência da guerra na Ucrânia logo na saída da pandemia de Covid-19, ao preço dos insumos agrícolas, às instabilidades climáticas e econômicas, e ao cenário geopolítico global. Para o ciclo que começou neste 1 de julho, com o lançamento do Plano Safra 2025/26, os analistas do Itaú BBA reduziram o grau de otimismo. A recomendação é atenção maior à gestão de custos e câmbio.
“O cenário global inflacionário, tarifário extremamente tenso do ponto de vista geopolítico bate diretamente no agro através dos custos de fertilizantes, especialmente os nitrogenados”, disse Alves. “As compras para a soja já estão parcialmente garantidas, mas o milho safrinha vai sofrer ainda mais”, disse Alves. Apesar do quadro, culturas perenes ainda devem apresentar boas margens históricas, e a produção de biocombustíveis foi destacada como respiro para os desafios do setor.
Biocombustíveis
Para a instituição, boas oportunidades podem surgir dos mandatos previstos na Lei do Combustível do Futuro, marco regulatório criado para modernizar a política de biocombustíveis e descarbonização da matriz de transportes. Segundo os analistas do Itaú BBA, a norma deve ampliar a demanda por biocombustíveis, especialmente aqueles produzidos a partir de soja, milho e cana-de-açúcar.
“O Brasil tem grande potencial como exportador de alimentos e como produtor de matéria-prima para produção de biocombustíveis. Essa lei nos garante uma demanda muito interessante, que vai pedir mais milho, soja e cana para o futuro”, disse Alves. O relatório prevê um recorde no esmagamento global na safra 2025/26 por conta do aumento da demanda de óleo de soja para a produção de combustível sustentável.
Soja
Que o Brasil deve superar os números da safra de soja do ciclo anterior não é surpresa. Mas a instituição também projeta um novo recorde para a safra global para o ciclo vigente. “Se o clima continuar favorável, o nosso potencial de produção é robusto, especialmente para a soja”, afirma Alves. O relatório aponta novo aumento de área no país, mas o ritmo de crescimento deve ser menor que o dos últimos anos.
Os especialistas reforçam, no entanto, que a dinâmica deste mercado será orientada pela política americana de biocombustíveis e pelos desdobramentos da guerra comercial com a China. “A safra norte-americana está excelente. Até aqui as lavouras estão se desenvolvendo bem. Se tudo se mantiver como está, teremos uma safra americana também muito positiva, ajudando a manter os preços como estão”, afirma Alves. “No caso da Argentina, as projeções apontam para uma redução de área de soja na e uma migração para o milho”, completa Francisco Carlos Queiroz, analista de agro do Itaú BBA.
Milho
A alta dos fertilizantes vai bater na porteira do produtor de milho, que será uma das commodities mais afetadas. “Se o cenário não melhorar, os produtores podem evitar reduzir um pouco a área ou nem crescer a área. A curto prazo, a safrinha vai ser espetacular, com uma demanda do setor de biocombustíveis”, afirma Alves.
Enquanto isso, os Estados Unidos devem apresentar um aumento da área plantada, o que levará o país a ter a maior safra de sua história. O especialista chama a atenção para a produção de milho na China. “Eles aumentaram sua produção e produtividade de milho. Teremos essa concorrência na hora de exportar”, disse. O estudo aponta que, apesar do recorde projetado para a safra mundial em 2025/26, o balanço global de oferta e demanda deve apresentar redução dos estoques finais pelo segundo ano consecutivo.
Algodão
A alta no preço dos fertilizantes vai afetar diretamente o algodão, uma cultura que exige uma elevada quantidade de insumos. “Cerca de 40% do custo do algodão é com fertilizante e isso deve impactar as margens”, afirma Queiroz.
O relatório projeta que a safra global 2025/26 deve apresentar queda na produção, diante da expectativa de menor oferta dos grandes produtores globais da pluma. “Índia, China e EUA reduziram as suas áreas. O Brasil é o único que deve apresentar crescimento na produção”, disse Queiroz. Restrições comerciais e incertezas políticas podem afetar a demanda da commodity.
Proteínas
A bovinocultura, deve atravessar um bom momento, impulsionado pela queda no custo da ração, aumento nos confinamentos e firme demanda internacional. A menor produção nos EUA e os preços elevados da carne norte-americana reforçam a competitividade brasileira no mercado externo. No entanto, Alves afirma que o Brasil deve sofrer uma redução de oferta em função do abate de animais mais jovens. “Observamos um volume grande de novilhas no abate. Essa demanda vai continuar existindo”, disse.
Ele ainda destacou que o reconhecimento do Brasil como país livre de febre aftosa sem vacinação, concedido em maio, não pode deixar o setor mais relaxado para as práticas de sanidade. “Apesar de ser algo positivo, a retirada da vacinação em bovinos aumenta a exposição do Brasil a riscos sanitários. A nossa pecuária não vacina. Precisamos manter o sinal de alerta”, afirma Alves.
Para aves e suínos, a perspectiva também é favorável, com custos de ração sob controle, preços relativamente elevados das carnes sustentando boas margens históricas e uma demanda global aquecida. O banco, no entanto, alerta para o cenário desafiador da retomada das exportações de carne de frango após a ocorrência de gripe aviária no Rio Grande do Sul.
Julia Maciel – Forbes Agro