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A busca pela melhor rota na produção de biodiesel


Cenbio / USP - IEE - 15 jul 2011 - 06:07 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:17

Resultado da reação de transesterificação de qualquer triglicerídeo – tais como os óleos vegetais e as gorduras animais – com um álcool (metanol ou etanol), o biodiesel vem se apresentando como uma excelente alternativa para substituição  ao diesel comum: por apresentar as mesmas propriedades do combustível fóssil, não exige, em princípio, a adaptação de motores diesel para seu uso. Além de aumentar a segurança no suprimento de combustíveis para transporte, o biodiesel apresenta vantagens ambientais e econômicas com a redução do uso e importação de combustíveis derivados do petróleo, trazendo ainda perspectivas de ganhos sociais com a geração de empregos locais.

Apesar do avanço na introdução do biodiesel no Brasil, o país ainda carece de levantamentos mais aprofundados sobre as características ambientais, socioeconômicas e energéticas do combustível a partir das diversas matérias-primas para sua produção, bem como das rotas de transesterificação – reação química pela qual o biodiesel é produzido – usadas no processo.

Para contribuir com este quadro, o Centro Nacional de Referência em Biomassa (Cenbio) trabalha desde o início de 2011 no projeto BIOACV – Comparação da Avaliação do Ciclo de Vida de Biodiesel Produzido a partir de Óleo de Soja e Gordura Animal, Vias Metílica e Etílica. O objetivo do projeto é realizar uma análise comparativa por meio da Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) do biodiesel produzido a partir de quatro rotas diferentes: óleo de soja por via metílica e etílica, e gordura animal (sebo bovino) pelas mesmas vias, a fim de observar qual rota causaria menos impacto ao meio ambiente, considerando todas as etapas de produção do biocombustível.

O estudo do Cenbio é realizado em parceria com o Grupo de Prevenção de Poluição (GP2) e o Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), bem como o Laboratório de Combustíveis da Escola Politécnica de Pernambuco (Policom/UPE). Fausto Miguel Freire, professor da Universidade de Coimbra, em Portugal, também contribuirá com sua experiência para a consolidação e aplicação da metodologia de ACV na execução deste projeto.

Impactos por etapa
A Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) de um produto consiste em uma ferramenta que permite quantificar e analisar os impactos ambientais em todas as suas etapas de produção, uso e destinação de resíduos. "A ACV considera as entradas e saídas relacionadas à fronteira de um determinado sistema; por exemplo, podemos considerar uma unidade de estudo para o deslocamento de um caminhão por 100 km e utilizar a ACV para analisar todos os impactos relacionados à essa atividade, desde a produção do combustível até o uso em motores", comenta a bióloga Renata Grisoli, pesquisadora do Cenbio. "A ACV é importante para qualquer produto, porque permite avaliar e quantificar o desenvolvimento dos bens de consumo, ou seja, quanto a sua produção impacta o meio ambiente", explica o professor Gil Anderi, coordenador do GP2. "No caso do biodiesel, vale lembrar que o uso de qualquer combustível gera CO2; assim, a sociedade busca alternativas para avaliar o que é mais vantajoso para o meio ambiente." A metodologia da ACV consiste em quatro etapas: definição dos objetivos e escopo do estudo, avaliação do Inventário de Ciclo de Vida, avaliação dos impactos ambientais associados ao sistema, e a interpretação dos resultados obtidos. Ela permite realizar uma análise completa, proporcionando uma comparação entre diferentes sistemas de produção. Grisoli aponta que, embora a soja e o sebo bovino não sejam as únicas fontes disponíveis para a produção de biodiesel, elas são as mais amplamente utilizadas: "A soja, sozinha, representa cerca de 80% da produção de biodiesel no Brasil", afirma. Assim, antes de estender o levantamento para outras matérias-primas, é necessário montar um inventário que contemple a cadeia produtiva em todas suas etapas, criando um retrato da produção do combustível.

Etapas e obstáculos
Para a realização do projeto, o Cenbio e seus parceiros fizeram um levantamento das usinas que produzem biodiesel no Brasil, bem como de estudos feitos nessa área. Em termos de dados primários (levantados em campo), os estudos serão baseados na produção da usina de biodiesel da Fertibom, em Catanduva (SP), a primeira no país a produzir biodiesel por via etílica; o padrão industrial adotado no País é o da via metílica, já avançada em outros países por todo o mundo. Por sua vez, o GP2 trabalhará na modelagem da ACV aplicada, com base na realidade brasileira. Segundo Grisoli, um dos principais entraves na realização do projeto é a falta de dados primários. "Não temos como quantificar certos fatores na análise, e em alguns casos é preciso nos apoiarmos em dados indiretos", explica a pesquisadora. Anderi concorda, indicando que ainda falta conscientização dos setores interessados em relação à ferramenta no Brasil, sobretudo pela ausência de bancos de dados para estudos e pela ideia de que a realização de ACV é um procedimento custoso; apesar disso, o professor aponta que o interesse vem aparecendo à medida que sua repercussão cresce. "Nesse sentido, o BIOACV tem uma importância muito grande", diz Anderi. "O banco de dados que será formado por meio do levantamento feito nesse projeto vai permitir a geração de informações importantes para tomadores de decisão no País." Em maio de 2011, realizou-se a primeira reunião entre os parceiros do projeto, com o objetivo de definir estratégias para a realização do trabalho de campo. Nos próximos meses, terá início a coleta de dados para a elaboração do inventário.

GP2: Difundindo a ACV no Brasil

Criado em 1998, o Grupo de Prevenção à Poluição, ou GP2, trabalha desde sua formação com o objetivo de consolidar o uso da Avaliação do Ciclo de Vida no Brasil. O grupo, composto por professores, alunos e colaboradores, realiza atividades de ensino na área de especialização em Gestão Ambiental, e trabalha com projetos internos e externos à Universidade de São Paulo (USP).

A ACV ainda é uma ferramenta muito nova, carente da consolidação de uma metodologia de execução; também é altamente dependente de bancos de dados regionais. Por outro lado, a ACV vem ganhando importância nas relações comerciais internacionais, na medida em que países e organizações demonstram tendência cada vez maior na adoção desta técnica para a aceitação de produtos. "Hoje se fala muito em sustentabilidade, pegada de carbono; os indicadores de sustentabilidade ambiental para qualquer atividade só podem ser obtidos com a ACV", relata Anderi.

Neste quadro, o GP2 se dedica ao desenvolvimento de metodologia e na elaboração de inventários brasileiros como forma de contribuir para a competitividade de produtos agropecuários e industriais brasileiros no mercado internacional.

Fonte: Revista Brasileira de Bioenergia / Cenbio / USP - IEE