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2007

Observações sobre o primeiro dia


Luiz Pereira Ramos - 04 nov 2007 - 17:56 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:23

O 8th Curso Prático sobre Processamento, Química e Produção de Biodiesel, promovido pela AOCS em Viena nos dias anteriores ao “International Biodiesel Congress”, teve início no dia de hoje com um total de 14 palestras, sendo que duas delas ainda estão por acontecer. Neste primeiro relato sobre as atividades do congresso, valho-me de algumas observações que considero importantes dentre as muitas que ouvi neste primeiro dia.

Não há dúvidas de que, a exemplo de outros eventos, a palavra de ordem acerca do tema biodiesel é qualidade, assegurada neste continente pela especificação EN 14214. Em seu pronunciamento, Dr. Werner Köerbitz (Austrian Biofuels Institute) enfatizou que o único benefício que a expansão desenfreada do biodiesel tem trazido para o setor é o de que a especificação está ficando cada vez mais rígida. Suas palavras foram seguidas pelo Dr. Steve Howell (Marc-IV Consulting e membro do conselho da ASTM), que salientou a evolução da especificação norte-americana, hoje pelo menos em sua sétima versão desde a sua criação (ASTM D 6751-7b). Preocupações realmente exacerbadas foram expostas durante estas apresentações, no sentido de convencer todos os participantes de que qualquer coisa que não atenda inteiramente estas especificações internacionais “não pode ser classificado como biodiesel”, pois pequenos desajustes já são capazes de promover grandes problemas, particularmente em motores de última geração.

Outra citação interessante do Dr. Werner Köerbitz revelou que, segundo a FAO, o planeta dispõe de 41,88 milhões de km2 de áreas agricultáveis, sendo que, destes, 15,06 milhões de km2 já se encontram ocupados, dos quais apenas 0,11 milhões de km2 estão de alguma forma associados à produção de biocombustíveis. Segundo este mesmo levantamento, este número deverá aumentar para 0,325 milhões de km2 em 2030 caso todos os marcos regulatórios até hoje propostos sejam atendidos, o que implica em dizer que a recente expansão da agricultura energética não deverá espalhar a fome no mundo, conforme o ceticismo de muitos de nossos colegas.

Luiz Pereira Ramos
 Luiz Pereira Ramos traz as
 novidades do Congresso
Internacional de Biodiesel,
direto de
Viena, Áustria

Paralelamente às atividades da tarde, foi realizada uma reunião entre os principais representantes de agências de normatização como a ASTM, a CEN/ISO, dentre outras instituições de grande importância no setor. O objetivo esteve relacionado às primeiras discussões sobre a elaboração de uma especificação internacional para o biodiesel, algo que será discutido ainda neste evento em fórum específico, com a presença de líderes de todo o mundo, inclusive do Brasil.

Outras apresentações, particularmente no período da tarde, foram orientadas à apresentação dos principais critérios de planejamento para a instalação de usinas de biodiesel. O custo da matéria-prima foi mais uma vez identificado como o principal fator para a definição do custo de produção do biodiesel, chegando a valores da ordem de 85 a 90% nas palavras dos representantes da Desmet-Ballestra.

A necessidade do estabelecimento de critérios rígidos de segurança foi enfatizada para unidades de produção baseadas em metanólise, ou seja, que dependem do metanol como agente de transesterificação, algo que precisa ser cuidadosamente monitorado para evitar os riscos de explosão e de contaminação do pessoal com vapores altamente tóxicos. Interessante observar a constatação de que vários provedores de tecnologia para a produção de biodiesel estão assoberbados com o número de solicitações recebidas nestes últimos meses e isto tem inclusive inflacionado o mercado em até 100%, já que sempre terão prioridade aqueles que estiverem preparados para pagar mais pelos serviços.

Nossa apresentação, sobre uso de aditivos para a melhoria das propriedades de fluxo do biodiesel e de suas misturas com o diesel de petróleo, foi recebida com muito interesse, já que o desempenho dos produtos que vimos desenvolvendo no Departamento de Química da UFPR é muito superior a vários aditivos análogos que se encontram disponíveis no mercado.

O primeiro dia de nossas atividades no evento está aproximando-se do fim e, de hoje, vale a pena tecer algumas considerações finais:

(a) há um movimento em direção à harmonização das especificações para biodiesel existentes em vários países, mas há pouca ou nenhuma motivação em compreender quaisquer motivos que levem a um comprometimento dos parâmetros de qualidade já definidos internacionalmente (EN 14214 e ASTM D 6751);

(b) da mesma forma, há um clamor por qualidade ao longo de toda a cadeia produtiva do biodiesel e atitudes que se distanciem desta realidade continuam a ser fortemente rejeitadas pela comunidade;

(c) vários problemas vêm sendo constantemente levantados sobre a precariedade de vários métodos oficiais de análise em prover resultados passíveis de repetibilidade e reprodutibilidade – neste sentido, um dos mais fortemente criticados é o método de determinação de glicerina total por cromatografia de fase gasosa, cujos resultados têm revelado alguma fragilidade em relação a mudanças na matéria-prima empregada para a produção de biodiesel;

(d) futuros investimentos na área devem ser baseados em análise extremamente cuidadosa de parâmetros associados à segurança e manutenção na disponibilidade de matéria-prima a custos suficientemente competitivos, ao grau de maturidade da tecnologia contratada para fazer uso desta matéria-prima (neste caso, plantas multi-funcionais são desejáveis embora agreguem custo ao processo), ao tamanho e flexibilidade do mercado absorvedor da produção pretendida, à destinação prevista para co-produtos como a glicerina e à escolha do local ideal para instalação da planta. Enfim, não nos parece que haja qualquer tendência na validação de plantas de pequeno porte, pelo menos enquanto não houver alguma quebra de paradigma no sentido de revolucionar o processo de produção e de otimizar as operações unitárias associadas à purificação do produto. Sobre estes desenvolvimentos de última geração, muito ainda deverá ser discutido ao longo dos próximos dias de realização deste evento.

Luiz Ramos
[email protected]