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Considerações finais


BiodieselBR.com - 09 jun 2010 - 15:46 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:13

Quaisquer conclusões acerca do desenvolvimento de uma atividade econômica com apenas cinco anos de implantação têm de ser restritas a questões conjunturais, o que se aplica ao biodiesel no Brasil. Contudo, mesmo um breve diagnóstico das condições de demanda e oferta de biodiesel e das interfaces destas com as políticas públicas permite que se identifiquem alguns dos principais determinantes, desafios e oportunidades do setor, bem como uma série de fatores inibidores da sua efetividade enquanto objeto de política pública.

Parte desses desafios é de resolução no médio prazo, como é o caso do desenvolvimento de oleaginosas e da definição da cadeia dominante. Questões estruturais como a continuidade do domínio tecnológico de todas as fases de produção são de resolução no médio ou longo prazo, enquanto diretrizes de inclusão social, conforme propostas no PNA e PNPB são as de mais difícil alcance, no curto ou mesmo no médio prazo. Por outro lado, ganhos ambientais são limitados com a mistura B5, ocorrendo apenas na concentração de alguns GEE e com efeitos nas etapas de produção ainda por serem medidos. Este aspecto aponta para a necessidade de se definir metas socioambientais e de desenvolvimento mais ousadas para o biodiesel e não apenas compará-lo com o diesel altamente poluente que é vendido no país.


O biodiesel não tem ainda definidos os determinantes estruturais da cadeia, estando por se configurar as várias tendências nas etapas de produção e do próprio mercado. Nestes primeiros anos, caracteriza-se o domínio da indústria sobre a agricultura e na defesa do aumento do B2 até o B5. Para o longo prazo, sinalizam-se os rumos de uma commodity com a concentração da produção em poucas e grandes empresas. Portanto, os determinantes provisórios do biodiesel no país são três: i) a escala de produção (intensidade de capital); ii) a oferta de matéria-prima – o domínio da soja equivale à intensidade de capital, padrão de monocultura, larga escala e cadeia sólida –; e iii) a regulação e o crédito estatal – que comanda o tamanho do mercado e viabiliza-o financeiramente. No médio prazo, porém, outros aspectos, como o tecnológico, deverão ser determinantes.

Assim, os desafios citados na seção anterior são também referenciais para o ajuste das políticas no âmbito do PNPB.

É ainda necessário que se repensem as políticas de investimentos, de acesso à terra e formas de garantia da produção, bem como a regulação da distribuição, a armazenagem e infraestrutura. Para nenhum destes aspectos foi identificado obstáculo intransponível, uma vez que o Brasil tem o domínio técnico de todos para o padrão atual.

Da mesma forma que no caso do etanol, é necessário o desenvolvimento das etapas agrícola e industrial em paralelo. Isto irá facilitar, também, o alcance do mercado externo para o biodiesel e para a indústria nacional de equipamentos, projetos e sistemas industriais, como medidas de desenvolvimento do setor de forma estratégica. A pressão por políticas públicas, no médio prazo, é direcionada por estes componentes, bem como para a autorização de maiores cotas para o autoconsumo, para a estruturação da cadeia de distribuição no âmbito regional e por um aumento da mistura, até o B20, nas áreas metropolitanas.

Para que os objetivos ambientais e sociais das políticas de agroenergia não sejam apenas reflexos da economia do petróleo-biodiesel, e para que o biodiesel não seja fator ainda mais concentrador de renda e de poder, é necessário repensar os mecanismos e instrumentos de incentivo ao mercado, como o Selo Combustível Social. Uma alternativa para a inserção social deve considerar o desenvolvimento regional a partir de suas potencialidades, e não predominantemente a partir do desenvolvimento do setor industrial ligado ao biodiesel.

A infraestrutura para o setor de biodiesel não apresenta preocupações no curto prazo, principalmente considerando os aspectos aqui ressaltados, de transporte, armazenagem na forma atual e distribuição regional. Neste aspecto a dependência do sistema de derivados de petróleo tem ajudado. Porém, para uma perspectiva de mudança estrutural, na forma das sugestões anteriormente apresentadas, irá demandar nova concepção de infraestrutura. Ao se interconectar todas as etapas de produção, distribuição e consumo, uma situação de equilíbrio da cadeia produtiva e da infraestrutura deverá ocorrer por meio de planejamento e direcionamento de políticas que incluíam o ZEE do Biodiesel e APLs.

Para alcançar importantes diretrizes socioeconômicas atribuídas ao biodiesel, o desenvolvimento da cadeia produtiva deve ser estruturalmente induzido e direcionado, sendo muito pouco provável que o funcionamento do mercado alcance estas diretrizes. Tendo em vista a possível transitoriedade da atual geração dos biocombustíveis, é essencial que a etapa agrícola da cadeia – 80% do custo dos insumos do biodiesel – se desenvolva de modo a dar condições de readaptação de cultivos e arranjos produtivos no médio prazo. Isto pressupõe, inclusive, que a fonte de renda dos agricultores não seja proveniente somente do cultivo de matérias-primas para o biodiesel. Da mesma forma, os incentivos às indústrias devem apoiar o desenvolvimento e a comercialização para a concorrência e a competitividade das usinas nacionais, inclusive com vista à segunda geração de biocombustíveis.

A oportunidade de dar respostas coordenadas à maioria dos desafios aqui listados indica a necessidade de se desacelerar o aumento do biodiesel à mistura. Isto porque as alternativas de matérias-primas, a opção pelo desenvolvimento regional e não somente setorial, o desenvolvimento tecnológico e a inserção social são aspectos menos intensivos em capital e por isso desfavorecidos em relação aos atuais fatores determinantes do biodiesel.


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Fonte: Ipea - Série Eixos do Desenvolvimento Brasileiro - Biocombustíveis no Brasil: Etanol e Biodiesel
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