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2007

Biocombustíveis - Da primeira a quarta geração


BiodieselBR.com - 10 mar 2008 - 16:12 - Última atualização em: 09 nov 2011 - 19:06

A confluência de desenvolvimentos em botânica e biotecnologia, em captura de carbono, técnicas de armazenamento e em métodos inovadores de bioconversão torna possível começar a imaginar uma “quarta geração” de biocombustíveis e sistemas de bioenergia. Os primeiros passos para tais combustíveis já estão sendo dados.

As grandes organizações de pesquisas acham que a longo prazo existe vasto potencial para produzir bioenergia sustentável. Os cientistas que trabalham para o Bioenergy Task 40 da IEA (Agência Internacional de Energia) colocam esse potencial em cerca de 1300 Exajoules até 2050 (atualmente o uso global de combustível fóssil é de aproximadamente 380Ej ao ano). Esta biomassa potencial está explicitamente baseada no cenário “sem desmatamento” e no fato de que toda necessidade de alimentos, fibras e ração de populações crescentes e animais deve ser suprida antes. Depois de levar estes requisitos em conta, os pesquisadores encontram vasto potencial especialmente na África (320Ej) e América Latina (220Ej). Em resumo, não existirá nenhuma escassez do recurso natural primário – biomassa – necessário para fazer a transição para um futuro pós-petróleo e com pouco carbono.

Estes cenários otimistas não levam em conta inovações potenciais em biotecnologia, como, por exemplo, um projeto de alto rendimento de colheitas de energia dedicadas. Mas os desenvolvimentos neste campo estão evoluindo muito rapidamente: plantas com elevada biomassa, árvores com maior capacidade de armazenamento de carbono, plantas para energia resistentes a seca, espécies de gramínea que superam o importante problema de terras ácidas e novas plantas com propriedades particulares conformadas a um processo específico de bioconversão (por exemplo árvores de baixa lignina e milho com enzimas embutidas para conversão rápida), são alguns dos estudos bem encaminhados.

A combinação de tais colheitas com técnicas de bioconversão avançadas que permitem a captura e armazenamento de gás carbônico torna possível produzir uma “quarta geração” de combustíveis e energia ultra-limpos e carbono-negativos.

Vamos examinar como as diferentes gerações se sucedem. Biocombustíveis de primeira geração são conhecidos por seus múltiplos problemas: quando feitos de grãos como milho ou canola, eles têm um impacto negativo nos preços de alimentos (não é o caso da cana-de-açúcar) e quando baseados numa colheita como óleo da palma eles ameaçam a biodiversidade; seu balanço de carbono é ruim porque eles não reduzem muito os principais gases do efeito estufa ou porque técnicas de agricultura convencional (que, por exemplo, liberam óxido nitroso) atrapalham a redução total (este, novamente não é o caso do etanol de cana-de-açúcar); seu balanço energético global também não é grande (alguns consideram que para o etanol de milho pode até ser negativo; para a cana-de-açúcar, o balanço permanece bom). Finalmente, estes biocombustíveis de primeira geração dependem de tecnologias de conversão relativamente ineficientes, como fermentação por variedades de levedura convencional ou de transesterificação por catalisadores de base alcalina.

2ª Geração

Combustíveis de segunda geração envolvem uma mudança na bioconversão e livram-se do aparente dilema combustível versus alimentos. Em vez de só usar açúcares facilmente extraíveis, amidos ou óleos como na geração anterior, a segunda geração permite o uso de todas as formas de biomassa lignocelulósica. Espécies da grama, árvores, resíduos agrícolas e industriais podem ser convertidos via dois principais caminhos: uma rota bioquímica ou uma termoquímica. A primeira conta com enzimas e/ou microorganismos dedicados que podem quebrar celulose e lignina para obter os açúcares contidos na biomassa. Este caminho produz “etanol celulósico”. Microorganismos semelhantes (modificados geneticamente) também podem transformar biomassa em combustíveis gasosos como biogás e biohidrogênio, por meio de um processo conhecido como digestão anaeróbica. As inovações em biologia sintética podem produzir organismos biológicos artificiais que realizam estas tarefas em uma maneira altamente eficiente.

A rota termoquímica converte a biomassa através de processos como gasificação e pirólise rápida. A gasificação permite a produção de biocombustíveis sintéticos muito limpos, que podem ser liquefeitos, este caminho é conhecido como “biomassa-para-líquidos” (BTL – biomass-to-liquids). O uso de energia continua intenso, mas a integração de processos promete um aumento de eficiência. Na pirólise rápida, a biomassa é rapidamente aquecida (450-600°C) na ausência de ar para render um tipo de óleo combustível pesado - bio-óleo ou óleo de pirólise - que pode ser refinado em vários combustíveis ou usado como tal. Alternativamente o bio-óleo e seu resíduo (carvão) podem ser tratados como uma matéria-prima para produção de combustível BTL.

Os biocombustíveis sintéticos e etanol celulósico têm um balanço de carbono excelente e podem reduzir emissões de gás carbônico em até 90% quando comparados aos combustíveis de petróleo. Além disso, eles são ultra-limpos e reduzem as emissões dos outros poluidores importantes (NOx, SOx).

O potencial dos combustíveis baseados em conversão bioquímicas e termoquímica de biomassa é grande. O World Energy Council estimou recentemente que estes combustíveis podem repor aproximadamente 40 por cento de todos os combustíveis de transporte baseados em petróleo, até 2050. O IEA Bioenergia Task 40 vê um potencial maior (até 260 Ej até 2050, o que resultaria numa reposição de todos os petro-combustíveis para transporte.)

3ª Geração

Considerando que a segunda geração intervém no passo de bioconversão, a terceira geração de biocombustíveis é baseada em avanços feitos na fonte - a produção de biomassa. Esta geração aproveita-se de novas colheitas de energia especialmente projetadas. Há progresso significante a ser feito neste respeito. Avanços recentes em biologia de planta, o aparecimento de técnicas de procriação rápida e extremamente eficiente (procriação molecular), os rápidos avanços no campo da genômica, e design clássico de colheitas transgênicas promete resultar em plantas com propriedades que as tornam mais apropriadas para a conversão em bioprodutos. Grandes iniciativas e organizações de pesquisas, como o Joint Genome Institute (JGI-DoE), devem contribuir. Alguns do principais cientistas de biotecnologia do mundo, inclusive Norman Bolaug, Craig Venter e Marc Van Montagu estão envolvidos.

Os exemplos recentes oferecem uma amostra do que nós podemos esperar no futuro próximo. Recentemente, árvores de eucalipto criadas com baixo conteúdo de lignina que permitem uma conversão mais fácil em etanol celulósico.

Plantações com teor de açúcar mais alto (sorgo doce) que prosperam em condições mais áridas foram desenvolvidas e estão sendo testadas com a produção de etanol em mente. Ainda quanto ao sorgo, cientistas na Estação de Experiência Agrícola da Universidade do Texas A&M (TAES) estão criando um sorgo resistente à seca que pode render entre 37 e 50 toneladas de biomassa seca por hectare (15 a 20 de toneladas por acre).

Em um caso especial, pesquisadores criaram uma colheita de milho que já contém as enzimas necessárias para converter sua biomassa em combustíveis. Este é um exemplo de colheitas de terceira geração radicais. Os cientistas contam com o campo emergente da biologia sintética para descobrir os princípios necessários para permitir o design de plantações. Quanto a isso, a personalidade mais conhecida no campo de biologia sintética e genômica, Craig Venter, foi parceiro do Asiatic Center for Genome Technology para seqüenciar o genoma da palma, que levará a uma colheita mais adequada à indústria de biocombustíveis. Norman Borlaug está seqüenciando a cassava, uma planta já usada para biocombustíveis eficientes de primeira geração, mas que pode ser melhorada, aumentando seu conteúdo de amido.

Finalmente, no que deve ser visto como uma inovação importante, cientistas tiveram sucesso ao superar o problema de terras ácidas projetando uma planta (sorgo) que pode crescer em tal ambiente. Metade das terras do mundo são ácidas, a maior parte nas regiões trópicas e sub-trópicas. Esta planta e outras semelhantes prometem tornar disponível uma grande parte do mundo considerada anteriormente problemática para a agricultura.

Isto é só um pequeno resumo do potencial das novas técnicas de procriação, engenharia e de seqüenciamento que estão cada vez mais sendo utilizadas em plantações. Note que nem todas são transgênicas. As técnicas de procriação molecular simplesmente tornam mais fácil selecionar colheitas robustas e permitir seu lançamento em uma questão de meses, ao invés de anos.

Estes desenvolvimentos estão sendo replicados no projeto de plantações para alimentos. Se ambos os setores (plantações de alimentos e combustíveis) continuarem a produzir inovações, cada vez menos terra será exigida para produzir alimentos e energia. Isto pode aumentar as estimativas iniciais do potencial de longo prazo da biomassa, porque estas projeções não levaram em conta os avanços em agronomia e biotecnologia.

O uso de tais colheitas de energia dedicadas faz um impacto no carbono e no balanço energético. Com rendimentos mais altos e mais fácil bioconversão, menos energia é necessária para plantar, colher e transformar uma dada quantia de biomassa.

4ª Geração

Um desenvolvimento particular em biologia da planta deve ser mencionado, porque ele nos leva diretamente à “quarta geração” de biocombustíveis. Duas equipes de cientistas anunciaram recentemente que eles obtiveram sucesso com árvores modificadas que armazenam significativamente mais gás carbônico que suas congêneres comuns. O feito foi alcançado com eucalipto.

Em sistemas de produção de quarta geração, as fontes de biomassa são vistas como eficientes máquinas captadoras de carbono que retiram CO2 da atmosfera e o armazenam em seus galhos, troncos e folhas. A biomassa rica em carbono é então convertida em combustível e gases por meio de técnicas de segunda geração. Crucialmente, antes, durante ou depois do processo de bioconversão, o dióxido de carbono é capturado, utilizando os assim chamados processos de pré-combustão, oxicombustível ou pós-combustão. O gás estufa é então geoseqüestrado - armazenado em campos de óleo e gás exauridos, em veios de carvão não-mineráveis ou em aqüíferos salinos, onde ele ficará bloqueado por centenas, possivelmente milhares de anos.

Os combustíveis e gases resultantes não são só renováveis, eles também são eficazmente carbono-negativo. Só a utilização de biomassa permite a produção de energia carbono-negativa. Todos as outras energias renováveis (eólica, solar, etc) são carbono-neutro na melhor das hipóteses, carbono-positivo na prática. Biocombustíveis de quarta geração, ao invés, retiram emissões históricas de CO2 da atmosfera. Eles são ferramentas para limpar nosso passado poluído.

De acordo com os cientistas que olham para este conceito de “bio-energia com armazenamento de carbono” (BECS) dentro do contexto de uma estratégia para conter a “mudança climática abrupta”, estes sistemas, se aplicados em escala global, podem nos levar a níveis pré-industriais de CO2 atmosférico. O conceito seria mais eficiente que técnicas limitadas a varrer CO2 da atmosfera sem atacar a fonte do problema: a combustão de combustíveis fósseis. BECS intervém na fonte e repõe combustíveis fósseis com biomassa renovável - os sistemas varrem CO2 da atmosfera e ao mesmo tempo entregam energia limpa. Como tal, eles são vistos como um dos únicos métodos de geo-engenharia de baixo risco que podem nos ajudar a lidar com a mudança climática sem diminuir as atividades de nossas sociedades.

O fato de que plantas de crescimento rápido e de alto rendimento estão sendo projetadas para seqüestrarem mais gás carbônico, torna a promessa dos biocombustíveis e bioenergia carbono-negativos até mais interessantes.

Concluindo, as tecnologias de biocombustíveis estão evoluindo rapidamente. Elas receberam alguma cobertura ruim da mídia porque a produção atual é dominada por técnicas ineficientes de primeira geração que mostram pressões em mercados de alimentos e apresentam problemas ambientais. Mas uma combinação de biologia, técnicas de captura de carbono e processos inovativos de bioconversão deve abrir uma era de combustíveis que não só serão abundantes, altamente eficientes e limpos, mas também a maior arma na luta contra a mudança climática. Biocombustíveis de quarta geração carbono-negativos são realmente máquinas que retiram CO2 da atmosfera. Eles limpam nosso passado sujo.

Fonte: Biopact
Tradução e adaptação: BiodieselBR.com