EUA

Pela primeira vez em duas décadas, a China não comprou soja dos Estados Unidos por dois meses consecutivos e, mais importante, também não tem pedidos para a próxima temporada de pico.

Antes de o presidente Trump iniciar sua guerra comercial com a China durante seu primeiro mandato, o país comprava mais da metade de todas as exportações de soja dos EUA, com até 70% ocorrendo durante a temporada de pico entre outubro e janeiro.

Até janeiro deste ano, as exportações dos EUA ultrapassaram US$ 1 bilhão (R$ 5,34 bilhões na cotação atual) em 54 dos 62 meses de pico anteriores, sendo que sete dessas oito exceções ocorreram no primeiro mandato de Trump.

Com Trump de volta ao cargo, essa guerra comercial se intensificou no início deste ano, quando o presidente ameaçou impor tarifas de até 145 % e a China respondeu sugerindo que aumentaria suas tarifas retaliatórias sobre exportações dos Estados Unidos para 125%.

Felizmente para as duas maiores economias do mundo e para o terceiro maior parceiro comercial dos Estados Unidos, prevaleceu a moderação. Pelo menos temporariamente. Trump suspendeu duas vezes as tarifas que havia ameaçado impor neste ano, sendo que a segunda suspensão expira no início de novembro.

À frente desse prazo, em uma estratégia que se assemelha a uma tática de negociação, as exportações totais de soja para a China caíram a zero em junho e julho. Foi a primeira vez desde a primavera e o verão de 2004 que o total caiu a zero por dois meses seguidos, segundo minha análise dos dados mais recentes do Censo dos EUA.

Até julho, as exportações de soja dos EUA para a China caíram 51,29 %, o que equivale a US$ 2,6 bilhões ( R$ 13,9 bilhões). Para o mundo, essas exportações caíram ainda 23,26 %, enquanto as exportações gerais dos EUA aumentaram 4,51 %.

Não é apenas a soja. As exportações gerais dos EUA para a China caíram US$ 16,50 bilhões (R$ 88,1 bilhões), o que equivale a 20,61%. A queda em valor e percentual é maior do que a registrada em qualquer outro dos 25 principais parceiros comerciais dos EUA, que juntos representam pouco menos de 85 % de todas as exportações do país.

Além da queda acentuada nas exportações de soja para a China, as exportações de petróleo bruto altamente voláteis caíram US$ 4,22 bilhões (R$ 22,5 bilhões), 87,09 % em valor; as exportações de veículos de passageiros caíram US$ 1,66 bilhão (R$ 8,9 bilhões), equivalente a 51,24 %; e as exportações de gás natural liquefeito caíram US$ 1,08 bilhão (R$ 5,8 bilhões), 31,51 %, segundo os dados mais recentes do Censo dos EUA.

A China mirou todas essas quatro mercadorias, incluindo a soja, como retaliação na primeira guerra comercial e parece estar repetindo a estratégia. As tarifas dos EUA contra a China têm sido mais abrangentes.

O resultado até agora tem sido uma queda abrupta das importações dos EUA vindas da China, assim como do déficit dos EUA com a China, enquanto o déficit geral dos EUA continua aumentando. A China, que já foi o principal parceiro comercial dos EUA, agora ocupa a terceira posição.

A guerra comercial também se estende ao quebra-cabeça geopolítico global. A China está comprando menos petróleo dos EUA porque está adquirindo mais petróleo da Rússia, que sofre pesadas sanções dos Estados Unidos e do Ocidente por sua invasão da Ucrânia. Além disso, a China está comprando soja do Brasil e, em menor medida, da Argentina.

A China não fez nenhum pedido de soja dos EUA à medida que a temporada de pico se aproxima, e 95 % de suas necessidades iniciais já foram atendidas pelo Brasil, que, por estar no Hemisfério Sul, tem uma temporada de pico praticamente oposta.

Além disso, a Argentina eliminou temporariamente seu imposto sobre exportação de grãos e a China também adquiriu soja desse país. Os Estados Unidos, o Brasil e a Argentina são os três maiores produtores de soja do mundo.

Trump elevou a tarifa sobre o Brasil para 50 %, com várias exceções de mercadorias, presumivelmente em razão da condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro a 27 anos de prisão, e está preparando um pacote de resgate financeiro de US$ 20 milhões (R$ 106,8 milhões) para a Argentina e seu presidente Javier Millei. Tanto Bolsonaro quanto Millei são aliados de Trump.

Mas Trump e os produtores de soja dos EUA podem ficar irritados com os dois países sul-americanos. As compras do Brasil e da Argentina ocorrem justamente quando a temporada de pico dos EUA se aproxima. Até janeiro deste ano e desde 2009, as exportações de soja dos EUA para a China ultrapassaram US$ 1 bilhão (R$ 5,34 bilhões) em cada um dos quatro meses da temporada de pico – de outubro a janeiro – em 54 dos últimos 62 meses. Todas as exceções, exceto uma, ocorreram no primeiro mandato de Trump. A outra foi um total de US$ 991,92 milhões (R$ 5,30 bilhões) em dezembro de 2023.

A única vez em que as exportações dos EUA para a China caíram a zero nesses quatro meses de pico foi em novembro de 2018. O que resta saber, sem pedidos antecipados e com Brasil e Argentina destacando suas exportações, é se as exportações de soja dos EUA para a China voltarão a cair a zero durante a temporada de pico, justamente quando a última pausa na guerra comercial chegar ao fim. A China tradicionalmente responde por 50 % a 70 % das exportações de soja dos EUA nesses meses.

Ken Roberts – Forbes Agro

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